Durante a meia hora que durou a conferência de imprensa da Polícia Judiciária relativa à detenção de João Rendeiro, o diretor nacional da PJ, Luís Neves, detalhou os pormenores da investigação e da captura do ex-banqueiro. Uma das ideias fortes foi a da capacidade financeira de Rendeiro para tentar fugir às autoridades e a de que este estaria a tentar "ganhar estatuto na África do Sul para evitar a detenção".
João Rendeiro foi detido esta manhã pela Polícia Judiciária, na África do Sul. O ex-presidente do BPP fugiu de Portugal em setembro para não cumprir as penas aplicadas pelos crimes de burla e falsificação.
A PJ explicou ainda que a escolha da África do Sul se deveu, em primeiro lugar, a um contato pessoal que Rendeiro aí detinha. "Permitiu que o recebesse e o escondesse durante os primeiros tempos".
Em seguida, Neves explicou que Rendeiro tentou "através de um mecanismo legal ao investimento, que existe na África do Sul, evitar a detenção".
O diretor nacional da PJ afastou a ideia da existência de cúmplices e afirmou que conseguiram perceber que "esta fuga foi preparada por ele durante vários meses ".
Vida de luxo
Durante estes quase dois meses que viveu na África do Sul, Rendeiro saltou de resort em resort de luxo na zona mais rica de Joanesburgo, mais precisamente na zona financeira da cidade de Sandton. Tinha ali uma vida de luxo e utilizou vários hotéis como refúgio movimentando-se sempre para dificultar o trabalho das autoridades.
Luís Neves afirmou que há mais de um mês, ou seja, muito antes da mulher do foragido. Maria de Jesus, o ter dito, as autoridades já sabiam que ele estava na África do Sul.
Rendeiro ficou também a saber que a Polícia já tinha essa informação. Daí a necessidade de precaver a fuga daquele país para outro da região.
Neves explica como isso foi acautelado: "Tivemos apoios internos e externos que nos ajudaram a compreender. Tínhamos montada uma teia de contatos para que se houvesse movimentos para fora, para um desses países, pudéssemos agilizar diretamente", revelou.
O diretor nacional da PJ disse que ele próprio estabeleceu contatos com vários colegas de países limítrofes. A ideia era a de "ficarmos com contatos, para se fosse necessário falarmos por telefone, videoconferência, ou enviar para o local os nossos profissionais".
A rede estava montada "para que se alguma coisa acontecesse", Rendeiro não pudesse escapar. E não escapou, porque a detenção não foi feita em Joanesburgo, onde Rendeiro tinha residência habitual. "A detenção foi feita muito longe de Joanesburgo e Pretória", denunciou.
Alguns meios de comunicação social dizem que a captura ocorreu na cidade de Durban, num resort de luxo.
Luís Neves detalhou ainda que o ex-presidente do BPP, quando foi detido pelas autoridades da África do Sul, "não tinha disfarce", mas que se movimentava com "muitos cuidados". "Não circulava livremente", garantiu o chefe da Judiciária.
Teia montada
Os contatos com todas estas polícias dos países que circundam a África do Sul tiveram palco na 89ª Assembleia-Geral da Interpol, em que a PJ partilhou com as suas congéneres informações sobre a personalidade, o "modus vivendis" e caraterísticas de Rendeiro.
Em relação à esposa de Rendeiro, o responsável da Judiciária não se quis alongar por existerem processos a decorrer, mas diz ser "normal que as pessoas possam falar umas com
outras até pela relação familiar, conjugal
".
No decurso da investigação, foi possível apurar que Rendeiro saiu do Reino Unido a 14 de setembro e deu entrada na África do Sul quatro dias depois, a 18 do mesmo mês. A PJ disse ainda saber o percurso que o ex-presidente do BPP fez de um ponto ao outro. No entanto, essa informação só foi possível obter algum tempo depois, porque, caso contrário, garante o diretor nacional, a PJ teria meios para intervir e detê-lo.
Neves detalhou ainda que na semana de 20 a 24 de novembro, "reunimos com os nossos parceiros e com os mais altos dirigentes policiais da África do Sul, onde explicamos quão graves e importantes tinham sido os crimes cometidos por esta pessoa ".
O líder da PJ desfez-se em elogios à cooperação das autoridades locais, que nas palavras de Luís Neves, colocaram neste caso os seus melhores recursos. A coordenação com a Interpol também foi fulcral.
A Polícia teve a trabalhar, neste caso, três unidades: unidade nacional de combate à corrupção, a unidade de investigação criminal e a unidade que faz ligação à Interpol.
O fugitivo foi aí descrito como alguém com uma grande capacidade económica e, consequentemente, de fuga.
Segredo: a alma da detenção
Luís Neves congratulou-se ainda por, desta vez, ter-se conseguido manter a informação da investigação num grupo restrito. O sigilo, concluiu, foi fundamental para a operação.
O diretor da PJ defendeu ainda que "não houve um deslize" da parte de Rendeiro. Luís Neves garante que o ex-banqueiro que tentou de todas as formas enganar as autoridades, e deu o exemplo da entrevista que deu a CNN Portugal, no dia de lançamento daquele canal, em que usou "todos os meios tecnológicos mais avançados e que custam uma exorbitância ".
Esta entrevista foi concedida "de forma encriptada". O uso de tecnologia de ponta, é mais um exemplo, na opinião de Luís Neves, de que João Rendeiro "jamais em tempo algum se iria entregar à Justiça".
No final, Luís Neves deixou uma palavra para os portugueses "e para as vítimas que muitas delas ficaram em dificuldade".