O primeiro-ministro, Luís Montenegro, promete “combater” o tráfico de droga e a criminalidade violenta e económica. Na primeira mensagem de Natal ao país, o chefe do Governo refere Portugal como “um dos países mais seguros do mundo”, mas salienta a necessidade de “salvaguardar esse ativo” para “não o perdermos”.
Numa mensagem vídeo divulgada na noite desta quarta-feira, o primeiro-ministro não faz qualquer referência à recente e polémica intervenção das forças de segurança no bairro do Martim Moniz, em Lisboa, mas faz questão de garantir que o combate aos diversos tipos de criminalidade são para continuar e inclui a criminalidade económica no lote.
Frequentemente acusado pelos partidos de esquerda de apropriar-se da agenda da extrema-direita e de colar o tema da segurança à imigração, Montenegro faz questão de, nesta mensagem de Natal ao país, não falar de ambas de seguida.
À cautela, e entre as duas áreas, o primeiro-ministro fala de habitação, área onde promete o “maior investimento” desde os anos 90 do século passado e “incentivar” a construção para a venda e arrendamento de casas a “valores moderados”.
Sobre imigração, o primeiro-ministro, de resto, não se perde em muitas palavras e diz o que já tem dito, ou seja, que o Governo vai “promover uma imigração regulada, para acolher com dignidade e humanismo aqueles que escolherem viver e trabalhar” no país.
Uma “palavra especial” às vítimas de violência doméstica
Depois de ver-se envolvido numa polémica e de ser criticado por diversos partidos políticos ao declarar que “não há aumento real” de casos de violência doméstica, o primeiro-ministro dedica as primeiras palavras da mensagem de Natal às vítimas deste tipo de crime.
“Aos que são vítimas de violência, em particular às muitas mulheres e crianças que vivem ou viveram o terror desumano do ataque à sua dignidade”, Luís Montenegro dedica “uma palavra especial”.
A mesma “palavra especial” que estende aos que “se sentem ou se encontram mais sozinhos e desprotegidos” e aos que “estão doentes, aos que estão desempregados, aos que vivem em situação de pobreza e a todos os que estão privados da sua condição de liberdade plena”.
Neste lote, não há, contudo, uma “palavra especial” e específica para as pessoas em situação de sem-abrigo, para as quais o Governo aprovou recentemente uma nova estratégia nacional e o Presidente da República tem, insistentemente, pedido intervenção “urgente”.
Registo ainda para a saudação do primeiro-ministro aos que na noite de Natal “estão a trabalhar”, desde as forças de segurança, instituições sociais, bombeiros, comunicação social e o “reconhecimento” do Governo aos soldados das forças nacionais destacadas no estrangeiro.
O “ano de viragem” e “sem truques” nas pensões
Nesta mensagem de Natal, o primeiro-ministro regista que, após o resultado das eleições legislativas de março, 2024 foi um “ano de viragem e de mudança”, com “novas prioridades e novas opções”, evitando críticas ao Governo do PS. “Não viemos para olhar ou criticar o passado. Viemos para cuidar do presente e construir o futuro”, diz Montenegro.
O primeiro-ministro faz o balanço do trabalho feito nos últimos meses, garante que está a “resolver questões mais urgentes” ao mesmo tempo que implementa “transformações estratégicas e estruturais” elencando à cabeça a redução dos impostos sobre o trabalho e sobre as pensões.
Sobre a aprovação da proposta de Orçamento do Estado (OE), nem uma palavra sobre as condições em que o diploma foi viabilizado pelo PS, depois de uma novela que durou desde o verão até ao anúncio do líder socialista, Pedro Nuno Santos, em outubro, de que a bancada socialista iria abster-se.
“Aprovámos mesmo o primeiro orçamento de que há memória que não aumenta um único imposto”, limita-se a dizer Montenegro, na única vez em que fala especificamente do diploma do Governo, congratulando-se pelas medidas fiscais “impactantes” para os jovens, nunca referindo, por exemplo, o IRS Jovem, cuja versão final tem o dedo do PS.
Neste “ano de viragem”, o primeiro-ministro regista ainda que o Governo acordou na concertação social o aumento do Salário Mínimo Nacional, “estimulando em simultâneo” o aumento do salário médio, ao mesmo tempo que “acertou” com os sindicatos a valorização geral dos salários dos trabalhadores do Estado.
Num remoque ao PS e ao Governo de António Costa, o primeiro-ministro realça ainda: “Também atualizámos sem truques todas as pensões”.
Sobre a área da Saúde, Montenegro pouco avança, saúda os que nesta época de Natal estão “a trabalhar nos hospitais” e garante que o Governo vai “continuar a reforçar” os serviços, sem aprofundar exatamente em quê.
O primeiro-ministro evita, assim, elaborar muito sobre uma área e uma ministra a braços com sucessivas polémicas, desde a crise das urgências à recente ameaça de desobediência civil dos profissionais de saúde, na sequência do diploma aprovado pelo Parlamento e que limita o acesso de migrantes ao Serviço Nacional de Saúde (SNS).
Portugal como “referencial de estabilidade”
Ao mesmo tempo que faz o balanço do que o Governo executou no curto período de oito meses em que está em funções, Montenegro dá um sinal para o exterior e sobretudo para o circuito de Bruxelas, garantindo o mantra das contas certas.
“Esta nova política de baixar os impostos e valorizar os salários e as pensões é realizada com rigor e equilíbrio orçamental”, garante o primeiro-ministro, que salienta ainda que este “é um elemento de política económica e social”.
Com um ano de 2025 que é incerto, na Europa e nos Estados Unidos e a que se somam duas guerras – na Ucrânia e no Médio Oriente – Montenegro puxa por Portugal como um “país de oportunidades”.
“Num mundo em convulsão, com guerras militares e comerciais a gerar incerteza e imprevisibilidade, numa Europa apreensiva com a estagnação da Alemanha e o défice e o endividamento da França, Portugal é um referencial de estabilidade e um país de oportunidades”, descreve o primeiro-ministro.
Para ser esse país de “oportunidades” é preciso “criar mais riqueza”, resume Montenegro. “Portugal tem tudo para criar mais riqueza” e “só criando mais riqueza” será possível “juntar” no país os pais e os avós com os filhos e netos, acrescenta o primeiro-ministro
É neste mantra da criação de riqueza e de crescimento económico que o primeiro-ministro baseia a política económica e social do Governo. “Só criando mais riqueza conseguiremos continuar a salvar o Estado Social, cumprindo a essência da democracia e da justiça, que é a igualdade de oportunidades”, diz Montenegro.
Assim, na desventura dos motores económicos da Europa, Alemanha e França, Montenegro vê a “oportunidade”. “Portugal está em movimento”, diz o primeiro-ministro que quer “continuar a reforçar os serviços de saúde e a garantir uma escola pública de qualidade, desde a creche até à universidade, sem esquecer o ensino profissional e tecnológico”.
O primeiro-ministro quer ainda um país com “mais mobilidade verde, melhores transportes públicos, numa economia amiga e parceira da sustentabilidade ambiental”.
Sá Carneiro, Soares e pedidos de espírito de “solidariedade e tolerância”
Num ano fértil em polémicas ideológicas, como a da comemoração dos 49 anos do 25 de novembro, no Parlamento, que dividiu os partidos, o primeiro-ministro tenta diluir as divisões sociais e políticas, dizendo acreditar na “solidariedade e tolerância” dos portugueses.
Recorrendo a símbolos, efemérides e personagens marcantes da literatura e da História do país, o primeiro-ministro termina a mensagem de Natal com uma tentativa de evitar o deslaçar da sociedade e da política.
Montenegro evoca os 500 anos do nascimento de Luís de Camões e da morte de Vasco da Gama, “símbolos maiores” da história e da cultura do país, “do nosso universalismo” e evoca os 50 anos do 25 de abril e os 90 e 100 anos de nascimento de “dois artífices” da democracia, respetivamente Francisco Sá Carneiro e Mário Soares.
O primeiro-ministro pega em tudo isto para avisar: “Estamos todos convocados a aplicar no futuro a inspiração que nos transmitem essas efemérides”, garantindo que o Governo “acredita” na “capacidade de superação” e no “espírito de solidariedade e tolerância” dos portugueses.
A mensagem termina mesmo com um pedido de união do país. “Trabalhamos juntos para não deixar ninguém para trás”, sentencia o primeiro-ministro, referindo que é “com este sentido de união” que deseja a todos “um Santo Natal e um próspero ano de 2025”.