“Não é possível controlar incêndios extremos”. Esta é uma opinião consensual, entre os investigadores de vários países que se reuniram esta quinta-feira na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), em Vila Real, para um debate sobre os incêndios extremos, os seus factores e casos de estudo recentes.
A iniciativa no âmbito do Firext, que visa “prevenir e preparar a sociedade para eventos extremos de fogo”, desafia a “ver a floresta e não somente as árvores”, serviu para fazer um ponto da situação do projecto que arrancou em 2016, antes dos grandes incêndios que devastaram Portugal, em 2017, e vitimaram mais de uma centena de pessoas.
Perante a impossibilidade de controlar incêndios extremos, os especialistas destacam a “necessidade de organizar o território para que não ocorram” e, caso, ainda assim, se verifiquem, defendem que a sociedade deve estar "devidamente preparada para enfrentar o incêndio e evitar a ocorrência de vítimas”, explica a coordenadora do projecto, Fantina Tedim.
A investigadora da Universidade do Porto entende que "não se pode querer fazer tudo ao mesmo tempo”, mas que é importante “perceber que o território nacional tem uma grande diversidade” e que “é necessário que toda a política tem de ser adaptada às realidades dos territórios locais”.
Depois, é fundamental “dar um maior papel às populações, colocar as populações no centro da questão porque elas têm conhecimento, têm recursos que podem auxiliar no sentido de evitar as tragédias”, defende a investigadora, concluindo que “os incêndios extremos podem ocorrer, mas isso não significa que esses incêndios se transformem em tragédias”.
Espaço florestal menos contínuo, com menos combustível e com vegetação menos inflamável
Paulo Fernandes, investigador da UTAD que integrou a comissão técnica independente aos fogos de Pedrogão e de Outubro, considera que “a única forma de evitar” grandes tragédias “é criar condições para que os incêndios não ganhem essa envergadura”, desde logo “evitar as ignições” e, depois, dar “uma resposta inicial o mais rápida e eficiente possível”.
“Para estes fogos não há combate que valha, meios que valham. Portanto, se não for naqueles minutos iniciais, naquela meia hora inicial, tudo o que se possa fazer depois é simplesmente para defender pessoas e estruturas”, enfatiza.
O especialista Paulo Fernandes, investigador da UTAD, defende que “é preciso que o espaço florestal seja menos contínuo, que tenha menos quantidade de combustível e tenha uma composição de vegetação menos inflamável”, justificando que “depois de estarem em movimento, estes fogos entram facilmente em povoações. Por exemplo, chegaram ao centro de Mira, de Oliveira de Frades e de Oliveira do Hospital, porque aproveitam qualquer vegetação que exista”.
Segundo Mário Pereira, investigador do Departamento de Física da UTAD, os “eventos extremos estão a ocorrer com maior frequência e com dimensões cada vez maiores, também”.
“Há estas duas tendências crescentes, quer do número de incêndios, quer também dos seus impactos e consequências”, diz, explicando que resultam de uma “combinação complexa de um conjunto de factores”.
“É uma combinação de clima e de vegetação, dos combustíveis para o fogo e, depois, a forma como as populações estão organizadas. Tudo isto, traduz-se num cenário que pode ser bastante complicado, nomeadamente para o futuro, neste contexto em que estamos a viver de alterações climáticas”, conclui.
Os investigadores falaram com os jornalistas à margem da conferência “Incêndios extremos: factores e casos de estudo recentes” no âmbito do projecto Firextr.
A ideia chave do projecto, que envolve oito instituições de Portugal, da Austrália, Canadá, França, Itália e EUA e deverá estar concluído até 2019, assenta no conceito 'fire smart territories' (território inteligente ao fogo), através de uma abordagem social-ecológica em todas as etapas da gestão dos incêndios, principalmente as de prevenção e preparação.