Portugal irá receber, nos próximos anos, perto de três vezes mais dinheiro da UE do que tem sido habitual. Ora um estudo da Coimbra Business School, que analisou 31 regiões de 16 países da UE, mostra como gastar o dinheiro dos fundos de coesão em projetos válidos tem sido difícil no nosso país. Em particular, as pequenas e médias empresas (PME) portuguesas são pouco eficientes na aplicação dos fundos estruturais da UE.
Por outro lado, a qualidade da administração pública nacional está longe de ser alta, pelo que daí não virá grande ajuda na execução do dinheiro europeu. Dinheiro que vem em condições muito favoráveis, a maior parte dele a fundo perdido. E mesmo aquele que seja encaminhado para Portugal sob a forma de empréstimos terá taxas de juro baixas. Dinheiro fácil, em suma.
Daí a tentação, que já era manifesta em anos anteriores, de aproveitar o dinheiro de Bruxelas sobretudo porque ele “está ali”, à disposição, sem grandes preocupações com a qualidade dos investimentos que ele irá financiar. Uma tentação para os eventuais investidores privados, que não terão muito a perder se o projeto falhar, e sobretudo uma tentação para a administração pública, que não quer ficar mal vista por não aproveitar a “bazuca” europeia. A função pública quer “cumprir”, não deixando dinheiro por aproveitar.
Como se resolve isto, de que pouco se fala? Talvez o Governo crie uma unidade específica, dotada de um número substancial de pessoas altamente qualificadas em investimento empresarial. Mas até agora não existem indícios de que se vá por aí.
A história recente não é encorajadora, nomeadamente quanto à capacidade da própria Comissão Europeia impor compromissos assumidos pelos beneficiários dos fundos.
Como Duarte Marques escreve no “Expresso”, a esmagadora maioria de indicadores de resultados, medidas de transparência e de valorização do mérito na utilização de fundos europeus introduzidos com o PT2020 não funcionaram, pois “foram quase todos metidos na gaveta”. Acrescenta D. Marques que “a própria Comissão Europeia acaba por ser conivente com estas violações dos eixos pré-determinados e acordados, quando se apercebe que a ‘execução’ está muito atrasada. É o que se está a passar com o PT2020”. (...) “Quanto mais chegamos perto do final do Programa, 2021, mais flexibilidade revela a Comissão e maior desplante tem o Governo português nas alterações propostas. A Comissão Europeia torna-se mais flexível porque entende que uma fraca ‘execução’ dos fundos é má para a imagem do projeto europeu e acaba por permitir que os governos façam todo o tipo de ‘engenharia’ para ‘gastar’ o dinheiro disponível”.
O problema da corrupção vem complicar ainda mais a situação. Os portugueses estão cada vez mais atentos e chocados com a corrupção económica e financeira. Como conseguir evitar a corrupção na execução dos fundos europeus? Receio que seja através de mais entraves burocráticos.
Esta chuva de dinheiro lança um desafio ao sector empresarial privado. Já referi as limitações das PME, que não são específicas do nosso país. Precisamos que, do lado das empresas privadas, surja uma boa surpresa, como foi há anos a inesperada capacidade exportadora que muitas delas revelaram.