Quando se dá por adquirido que a atual geração de jovens – a mais preparada intelectualmente em toda a história humana – será mais pobre do que o são/foram os seus pais, como se se tratasse de uma evidência criticamente incompreensível e materialmente intransponível, o Vaticano continua a preparar-se para receber jovens de todo o mundo e as várias Igrejas participantes vão tentando compreender que juventudes têm em mãos.
Fazem-no sabendo que o Papa Francisco persiste na incómoda ideia de que não há futuro sem jovens e que, se eventualmente imersos numa cultura idolátrica e daninha, essa cultura não foi inventada pelos mais novos mas «oferecida» por gerações anteriores que não estão dispostas a abrir-lhes passo nem a pagar o seu conhecimento e o seu trabalho. De resto, tal como acontece entre nós – orquestrado num complexo e sádico mecanismo de subserviência económica e cultural – são os cidadãos contribuintes dos países mais pobres que pagam essa formação, logo depois recolhida, pelos países ricos, nas suas indústrias e centros de investigação.
A vizinha Espanha também se ocupou de estudar a situação eclesial e social dos seus jovens, tendo apresentado os resultados em dezembro último, recolhidos junto de mais de 5.000 jovens crentes católicos. Os traços mais relevantes podem resumir-se deste modo: os jovens apreciam e desejam ser escutados, sem julgamentos, e não apenas na Igreja; vivem a sua realidade como um grande desafio, sobretudo por sentirem que não têm garantias mas assinalam como positivo, nos tempos de hoje, o apelo da Igreja quanto à participação social, a promoção da justiça, o cuidado com a ecologia, a procura de paz e a solidariedade para com os pobres; nas suas vidas privilegiam a procura de sentido, a espiritualidade, as relações educativas autênticas e credíveis, considerando que o desporto, as redes sociais e a cultura quotidiana se apresentam como oportunidades para construir e se construir.
À Igreja, os jovens crentes espanhóis pedem escuta, proximidade, abertura ao mundo de hoje; consideram imprescindível que se comprometa com o Evangelho de Jesus, aceite as diferenças, acolha com tolerância, diálogo e claridade evangélica; uma Igreja inclusiva, misericordiosa e samaritana, que trata de todos os feridos. Uma Igreja também mais moderna, com uma linguagem mais sugestiva, renovada, em contacto com as ideias de hoje, comprometida com a justiça, a solidariedade e o cuidado do planeta. Também pedem mais formação para os leigos, de modo a aumentar a sua consciência crente e a favorecer a corresponsabilidade na missão. O relatório final refere que os jovens sentem que não dão nenhum contributo ao mundo e à Igreja porque não são ouvidos.
Talvez as pessoas que não são crentes ou, até, que são antipatizantes convictos da coisa religiosa ou eclesial, considerem que nada disto é relevante ou digno de nota. Mas é, e de um modo muito profundo: nas últimas décadas, muitas pessoas foram-se afastando das Igrejas, quase todas sem bater e porta e sem questionar, lentamente, sentindo-se estranhas e sem desejo ou capacidade de lhes reconhecer interesse ou poder. Muitas pessoas também sentem dificuldade em voltar, mantendo as suas objeções, apesar de e com, as alterações do ciclo de vida. Mas buscam espaços de liberdade e de acolhimento, oportunidades de «ser», de se realizar, de encontrar sentido, de ter paz, de ser feliz, às vezes envergonhados dos seus erros, desiludidos do apoio e do esclarecimento que não encontraram.
É essencial que a Igreja mude, encontrando-se a si mesma, mas não há razão para nenhum foguetório anti-eclesial: porque aquilo que os jovens de hoje sentem e esperam da Igreja é exatamente o que esperam da sociedade, da política e da economia: escuta, aceitação, integração, participação, sem os quais não é possível construir um projeto de vida nem manter são um tecido social. O indiferentismo religioso que resulta desta incompreensão tem um nome político muito apelativo: passaporte para o fanatismo totalitário.
O Sínodo também pretende dar voz ao futuro naquilo que é crucial para o progresso do mundo e a defesa das sociedades abertas e oxalá possa fazê-lo.