O vice-almirante Henrique Gouveia e Melo enfatizou esta terça-feira a importância da adoção de uma retórica belicista no combate à pandemia da Covid-19 enquanto coordenador do processo de vacinação, numa sessão de perguntas e respostas na Web Summit.
Presente pela primeira vez na cimeira tecnológica, que regressou este ano a um modelo presencial a Lisboa, o responsável da extinta task force atraiu mais de uma centena de curiosos para a sua sessão e confessou-se algo "cansado" dos elogios pelo seu trabalho, que recusou ser obra de apenas "um homem", partilhando os louros do processo com a "comunidade".
"Penso que o aspeto mais difícil foi comunicar para ter toda a gente alinhada com o processo de vacinação. Usei uma retórica de guerra em que o vírus era o inimigo, em que ou a pessoa estava connosco ou com o vírus. Penso que este plano de comunicação foi importante para as pessoas perceberem que não podiam ficar em casa sem vacinação", frisou, sublinhando: "Isto é uma guerra com um vírus mortífero e não se pode ser neutral com um vírus".
Entre as muitas perguntas da audiência, tanto de portugueses como de estrangeiros, o antigo coordenador da task force foi confrontado com a proliferação de grupos antivacinas na sociedade e o seu impacto em termos mediáticos. A este nível, Gouveia e Melo considerou os disseminadores de propaganda antivacinação como "falsos profetas" das redes sociais.
"A desinformação é sempre má, espalham-se mentiras ou dados não provados nas redes sociais e criam-se bolhas de obscurantismo. Estas situações afetam as soluções na gestão de uma pandemia", observou o anterior responsável pela "task force", que revelou estar a escrever um livro sobre a sua experiência à frente do processo.
Segundo Gouveia e Melo, a experiência de coordenação do plano de vacinação contra a Covid-19 foi equiparada a "uma campanha militar", na qual "o vírus era o inimigo de todos". Questionado sobre as razões do seu sucesso na missão de coordenação, o vice-almirante foi direto na resposta: "Porque não sou um político".
Paralelamente, defendeu que as alterações climáticas poderão tornar pandemias como a da Covid-19 "mais comuns e espalhadas pelo globo". Entre os fatores decisivos para uma resposta efetiva, Gouveia e Melo destacou a "tecnologia" e a "coordenação", valorizando esta última como essencial para melhorar a resposta a uma escala mundial e não somente nacional.
"Vacinámos 86% e continuamos a vacinar, mas não é muito ético, porque cada ser humano é importante. De um ponto de vista estratégico, isto também não é bom, porque podemos ganhar esta batalha aqui e perder a guerra, sofrendo depois um efeito "boomerang". Temos de aprender a detetar e a reagir muito rapidamente, sem esconder nada", notou.
Por fim, o vice-almirante não excluiu um hipotético regresso às funções de coordenação do processo de vacinação pela sua condição de militar: "Direi que sim até sair deste uniforme. Obedecerei ao governo, é a minha condição de militar. Faço-o e não há questão, é a minha forma de ver as coisas".