Coronavírus. Exército brasileiro contraria Bolsonaro e defende isolamento social
06-04-2020 - 22:15
 • Lusa

"Há um consenso mundial entre especialistas de que o isolamento social seja a melhor forma de prevenção do contágio”, escreve num estudo.

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O Centro de Estudos Estratégicos do Exército (CEEX) brasileiro defende o isolamento social como estratégia de combate ao novo coronavírus, medida já adotada por vários governadores, contrariando a posição do Presidente do país, Jair Bolsonaro, que defende o oposto.

O estudo, a que a imprensa local teve acesso, sustenta que num cenário de aumento de casos de infetados são necessárias medidas como "isolamento horizontal" [restrição de circulação do maior número de pessoas possível], "redução da atividade aos serviços essenciais", "restrições ao movimento", "realização de testes em massa" e "mobilização de instalações temporárias".

"Há um consenso mundial entre especialistas de que o isolamento social seja a melhor forma de prevenção do contágio, especialmente o horizontal, para toda a população. O isolamento seletivo, ou vertical, para determinados grupos de risco, é defendido por alguns especialistas e vem sendo adotado por alguns países. No entanto, ainda é prematuro que sejam elaboradas conclusões acerca de resultados", diz o documento, citado pelo jornal O Globo.

Contudo, o chefe de Estado do Brasil defende, desde a chegada da pandemia ao país, no final de fevereiro, precisamente o oposto, frisando a necessidade de a população sair de casa para trabalhar, tendo chegado ele próprio a sair para as ruas, para socializar com apoiantes.

Na semana passada, Jair Bolsonaro voltou a criticar alguns governadores que impuseram medidas de distanciamento social para evitar a disseminação do novo coronavírus, afirmando que têm "medinho" de serem infetados através do contacto com a população.

"Eu fui a Ceilândia e Taguatinga [cidades satélites da capital brasileira] no fim de semana passado e fui massacrado pelos media. Disseram que fui passear, mas eu fui ver o povo. Duvido que um governador desses, um João Doria [de São Paulo], um Carlos Moisés [de Santa Catarina], vá no meio do povo. Vão nada. A justificação é que podem apanhar o vírus. Estão com medinho de pegar vírus?", questionou o chefe de Estado, em conversa com pastores evangélicos, em Brasília.

Jair Bolsonaro chegou, várias vezes, a desvalorizar a covid-19, apelidando-a de "gripezinha" ou "histeria".

Capitão reformado do Exército, Bolsonaro vê agora um alto órgão estratégico daquela que é uma das suas maiores bases de apoio a contrariar as suas indicações.

"Embora ainda seja cedo para uma avaliação mais conclusiva, observa-se que a adoção precoce de estratégias de isolamento horizontal tem apresentado resultados parciais mais efetivos no achatamento da curva [de infetados]", adianta o estudo do CEEX.

O estudo chama ainda a atenção para o facto de grandes grupos populacionais viverem em ambientes precários e sobrelotados nas grandes cidades, havendo, em algumas localidades, saneamento básico precário e deficiências no sistema hospitalar.

"O modelo horizontal tem-se apresentado mais eficiente para atender as demandas de emergência de saúde pública, porém tende a mostrar-se muito impactante a nível económico. Tal situação é previsivelmente agravada caso se estenda no tempo, tendendo a gerar consequências severas para os campos económico e social, com prováveis desgastes para o campo político", analisa ainda o texto.

"[O] consenso tem de ser construído de forma urgente. Não parece razoável quebra de governabilidade num momento tão crítico", sublinha o documento.

Segundo uma sondagem do instituto Datafolha divulgada esta segunda-feira, três em cada quatro brasileiros preferem manter-se em casa para enfrentar a pandemia de covid-19, ao contrário da posição do Presidente do Brasil.

O último balanço divulgado pelo Ministério da Saúde brasileiro no domingo indicou que o país teve 486 mortes causadas pela covid-19 e já confirmou 11.130 casos da doença.

O novo coronavírus, responsável pela pandemia da covid-19, já infetou mais de 1,3 milhões de pessoas em todo o mundo, das quais morreram mais de 73 mil.