Veja também:
- “Ferro Rodrigues desrespeita o Parlamento”, acusa novo líder parlamentar do PSD
- Hugo Soares: "Em 2013 fomos copiosamente derrotados e Passos continuou líder do partido”
- Hugo Soares: O que aconteceu na Caixa "não é muito diferente do que aconteceu no BES”
- Hugo Soares e caso Euro2016: "Paguei as viagens e os dois jogos”
- Ouça a entrevista a Hugo Soares
"Quem esteve em Pedrógão sabe que houve uma gritante falta de coordenação", acusa o novo líder parlamentar do PSD, Hugo Soares, em entrevista ao programa Hora da Verdade, da Renascença e do jornal “Público”, que deixa críticas ao primeiro-ministro, António Costa.
Foi candidato único, por falta de alternativas ou unanimismo?
Era o que faltava era que fosse por falta de alternativas. O grupo parlamentar tem mais de 80 deputados. Gente competente, com capacidade e experiência há sempre. Julgo que tem que ver apenas com o facto de o grupo parlamentar ter reconhecido em mim capacidades para liderar nos próximos dois anos neste combate.
O seu antecessor substituía várias vezes Passos Coelho nos debates quinzenais. Vai debater com António Costa?
Espero debater muitas vezes com o doutor António Costa, para poder demonstrar as fraquezas de um primeiro-ministro cuja autoridade tem vindo a diminuir todos os dias. Quanto aos debates quinzenais, ainda não tive a oportunidade de falar com o presidente do partido. Nem é algo sequer que me preocupe. O que me preocupa é combater este Governo, em que o primeiro-ministro acha que não pode ser alvo de críticas. Um primeiro-ministro que um mês após a tragédia de Pedrógão ainda não conseguiu fazer chegar os apoios às famílias e àqueles que mais sofreram. E que assiste a um desgoverno total em relação ao que aconteceu em Tancos, com declarações amplamente contraditórias entre chefias militares e Governo (que um dia dizem ser um motivo de grande preocupação e no outro quase parecem agradecer aos larápios por terem levado sucata velha). E um primeiro-ministro que assiste impávido e sereno, com a cumplicidade da esquerda, à degradação dos serviços públicos. Mas acentuadíssima.
Serão essas as suas prioridades?
Estamos a entrar numa nova fase da legislatura. Vamos querer ir mais para o terreno, até para podermos denunciar nos locais aquilo que está a acontecer nos serviços públicos. Ainda hoje são conhecidos dois despachos do secretário de Estado da Saúde que acho inacreditáveis. O primeiro, a 11 de Julho, em que quer terminar com o apoio directo do Estado ao tratamento da hepatite C, passando os custos para os hospitais. Isso ia criar a necessidade de os hospitais cortarem noutros serviços, ainda mais. No dia 14 de Julho sai outro despacho a revogá-lo. Este desnorte do Governo traz uma instabilidade ao país que não vamos deixar de denunciar.
Destacou-se a sua proposta de referendar a adopção de crianças por uniões do mesmo sexo. Foi apontado como mais conservador do que a JSD, que liderou. Revê-se nessa imagem?
De conservador? Não, de todo. Não sou. Mas não tenho dúvida de que a proposta da JSD fazia todo o sentido. Já referendámos outras questões fracturantes, o que estava em causa era - e é - os direitos das crianças e o referendo sobre essa matéria devia ter sido feito, até porque não estava inscrito em nenhum programa eleitoral (o que não aconteceu já em 2015). Foi uma pena não se ter feito o debate, pelo facto de o Tribunal Constitucional ter entendido que não se podia fazer duas perguntas em conjunto.
Em relação à eutanásia, também pode ser referendável?
O PSD e o grupo parlamentar têm feito uma reflexão sobre essa matéria. Fizemos já um colóquio muito participado, com posições muito diferentes. Tivemos como convidado um ex-deputado do Bloco, João Semedo. Mas não me parece que nesta altura seja uma posição que o líder parlamentar deva tomar.
A propósito de incêndios, ouviu o apelo do Presidente da República para uma "trégua eleitoral" até às autárquicas. O PSD respeitará?
Não estamos em campanha com os incêndios. Portanto, não há necessidade de fazer nenhuma trégua. Há que denunciar o que está a acontecer. Tivemos um incêndio há um mês onde morreram mais de 60 pessoas. Temos pessoas que perderam as casas, os seus bens e até familiares. Ainda hoje essas pessoas não foram ressarcidas de absolutamente nada - e o Estado ainda não assumiu a sua responsabilidade objectiva perante as pessoas que pereceram. Esta semana voltaram a acontecer incêndios com grande escala. E voltámos a saber que o SIRESP voltou a falhar. O que o país pergunta hoje é o que é que o Governo está a fazer. E tivemos declarações a dizer que no final da época de incêndios vão rever a questão do SIRESP? Mas então que confiança é que o cidadão pode ter de cada vez que haja um incêndio? Não tenho dúvida nenhuma de que, em qualquer incêndio hoje de maior escala, o cidadão que esteja perto fica em pânico, porque o Estado não consegue garantir as condições de segurança. E isto é o colapso do Estado, da autoridade do Estado, na sua função última de soberania.
Pode haver condições para reverter a gestão do SIRESP para o Estado?
Pouco me importa de quem é o SIRESP. O que quero é que ele funcione. E não está a funcionar. O que não pode o Estado fazer é pedir ao mesmo escritório de advogados que redigiu o contrato para agora fazer auditoria ao contrato. Isto é uma brincadeira. O país fica atónito e tem que desconfiar. Aquilo que me importa é que o SIRESP funcione; o que me importava era que não tivesse havido as alterações que aconteceram nos comandos distritais da Protecção Civil. Porque há dois meses foram mudados vários e os resultados estão à vista. Quem esteve em Pedrógão sabe que houve uma gritante falta de coordenação. Não estou a dizer que foi essa a causa da morte das pessoas. O que está em causa é o falhanço do Estado em garantir a protecção daquelas pessoas. Isso não pode acontecer. E o primeiro-ministro está ausente de tudo isto.
Não está antecipar-se as conclusões da comissão que o PSD propôs?
Não, porque há coisas que já sabemos. É preciso uma comissão técnica para sabermos que o SIRESP falhou? Não creio, toda a gente o diz.
Menos o SIRESP.
Isso é outra coisa inacreditável: como é que autoridades debaixo da mesma tutela colocam cá fora relatórios que se contradizem uns aos outros? Há uma total descoordenação, uma inexistência da ministra que é responsabilidade do primeiro-ministro, que saiu de cena porque só está habituado a dar as notícias boas. Em conversa fiada, não há ninguém que bata o doutor António Costa. Quando o país precisa de um primeiro-ministro, o doutor António Costa não está.