Quando soube da manifestação, Joana Freitas não hesitou: tinha de marcar presença, em nome de todos os jovens portugueses.
Com 25 anos, queixa-se de ter de pensar várias vezes antes de fazer qualquer despesa: “estamos a criar prioridades a toda a hora, a pensar que dinheiro podemos gastar, para não ficarmos sem uma almofada em emergências”.
Enquanto fala à Renascença, segura um cartaz onde se pode ler “habitação acessível para todos” – um problema que Joana espera ficar resolvido com o início da próxima legislatura.
“Creio que possa haver uma viragem política positiva em Portugal. Centenas de pessoas estão aqui hoje, o povo tem lutado muito por melhores condições de vida e a situação há-de melhorar. Com tanta mobilização, eu quero acreditar que os portugueses vão votar a favor dos seus interesses”, explica, quando estamos mesmo a chegar ao Cais do Sodré.
Lá, encontramos Luísa Simão, professora de música há mais de 20 anos em Lisboa. Ao contrário de Joana, não está tão otimista quanto ao futuro.
Luísa duvida que “Portugal mude”, principalmente porque se sente “enganada” há décadas: “A narrativa que me venderam quando era adolescente – de que a entrada na Comunidade Económica Europeia ia acabar com a pobreza em Portugal – não se concretizou”, lamenta.
Ainda com mais de dez anos pela frente até à reforma, Luísa tem a certeza de que vai ter uma velhice “precária”, com rendimentos insuficientes para pagar renda, alimentação e medicamentos. Por terra, já caíram os projetos de uma reforma passada a ler e a viajar. “Só me posso sentir injustiçada, por chegar aos meus últimos anos de vida, depois de tanto trabalho, e não ter dinheiro para o meu lazer”.
"Estou desiludido com o país que escolhi para viver"
Enquanto a multidão grita pela subida do salário mínimo e por um Sistema Nacional de Saúde mais forte, Jorge Filho e os amigos queixam-se das “contas cada vez mais pesadas no supermercado, semana a semana”. Vindo do brasil, aterrou em Portugal há seis anos, com uma bagagem carregada de sonhos – queria uma vida “sem apertos ao final do mês”. Agora, diz que está “desiludido” com o país onde vive.
“A vida de um trabalhador atualmente é impraticável. As políticas só beneficiam os patrões e nós ficamos desassistidos. Eu não consigo pagar a minha renda, não consigo comprar tudo o que é essencial no supermercado”, conta.
Já nos tínhamos despedido, quando Jorge volta atrás para acrescentar que ainda tem esperança: “É preciso uma viragem, mas quando vejo tanta gente nas ruas eu acredito que ainda é possível”.
Catarina Cardoso também aplaude a “larga adesão” à manifestação da CGTP esta tarde, em Lisboa – segundo a organização, mais de 1000 pessoas. Catarina espera que a “situação política e as guerras, que têm enchido os noticiários” não façam os decisores políticos esquecerem-se dos temas “cruciais” para a população – como o aumento do Imposto Único de Circulação.
“Não faz sentido e espero que a medida seja revertida. Se as pessoas não compram carros mais novos é porque não têm dinheiro. Não podem ser prejudicadas apenas porque lhes é impossível ter um carro elétrico. A solução é fortalecer a rede de transportes públicos, mas isso também só se consegue com mais trabalhadores e melhores salários”, explica.
Já decorriam os discursos de encerramento da manifestação, quando nos encontramos com Vitória Cardoso. Depois de uma “vida de trabalho como operária”, garante-nos que não é pela reforma que consegue sobreviver: “o que me vale é ter alguma terra que vou cultivando”. Veio à manifestação não por si, mas por todos os jovens que ganham uma “miséria”.
“A minha geração foi ensinada a poupar, mas os mais novos não conseguem: ganham pouco e pagam muito de renda”. E dá-nos o exemplo do filho: “Tem 44 anos, ainda não saiu de casa e trabalha todos os dias. Este país é impossível para os jovens. Têm o futuro boicotado”, remata.