Em Maio de 2017 as Filipinas sofreram o maior ataque jihadista da sua história, com grupos militantes a ocupar grande parte da cidade de Marawi, na ilha de Mindanao, no sul do país. A catedral da cidade foi queimada e um padre levado como refém. Vários cristãos tiveram de se esconder.
As forças armadas têm feito avanços progressivos e há poucos dias o padre raptado foi resgatado. Apesar da violência, o arcebispo John Du, de Palo, diz à Renascença que não existe um problema inter-religioso no seu país.
“Esta guerra não é sobre religião, não se trata de tensão entre muçulmanos e cristãos. Tem a ver antes com ideologia e terrorismo e a tentativa de destruir a paz em Mindanao. Digo que não tem a ver com religião, porque agora que deflagrou a guerra vemos que as massas cristãs e muçulmanas estão unidas, estão-se a ajudar uns aos outros, estão unidos contra os terroristas”.
O Presidente das Filipinas, Rodrigo Dutrerte, tem prometido luta sem tréguas contra os jihadistas, mas para os bispos o próprio chefe de Estado é visto como uma ameaça à paz, devido à forma como tem promovido uma autêntica purga na sua autoproclamada guerra contra as drogas. Desde a sua eleição milhares de pessoas, alegadamente toxicodependentes ou traficantes, foram mortas. Em muitos casos os cadáveres são encontrados com as mãos atadas e com tiros à queima-roupa. Quando em meados de Agosto 32 pessoas morreram num único dia o Presidente afirmou “matemos mais 32 todos os dias, talvez possamos reduzir os males que afligem este país”.
A Igreja tem sido uma das poucas instituições que se tem oposto ao Presidente, levando a uma situação de conflito aberto entre Duterte e os bispos. Parte do problema, explica o arcebispo John Du, é cultural. “O Presidente diz o que quer e por vezes usa linguagem muito ordinária. Ele é natural de Dabao, no sul, e lá as pessoas são muito informais, dizem as coisas de forma muito directa, por vezes com palavrões, mas são apenas expressões”.
Para tentar fomentar o diálogo com Duterte a conferência episcopal elegeu como presidente dos bispos precisamente um homem que é também de Dabao. Mas claramente o problema não se resume a uma questão de linguagem. “Não podemos aceitar a forma como o Presidente tem lidado com o problema da droga. Ele é muito reactivo, diz imediatamente que a solução é matar, mas claro que isto vai contra os nossos princípios. Temos de dar às pessoas uma possibilidade de se reformarem, de mudar.”
Inocentes estão a ser
mortos
Inevitavelmente, diz o arcebispo John Du, numa lista de mortos que já ultrapassa os milhares existem muitos inocentes. “Duterte diz que consegue resolver o problema matando estas pessoas, mas mesmo que isso fosse verdade, não deixa de ser pecado, porque sabemos muito bem que a morte não é a solução. A morte leva a mais mortes. Até inocentes estão a ser mortos”.
Vários bispos já denunciaram publicamente a situação e o anterior presidente da Conferência Episcopal, Socrates Villegas disse mesmo estar disposto a dar a vida pela verdade. “Chegámos ao ponto em que já não me interessa o que me pode acontecer. Estou pronto a morrer. Uma parte de mim já morreu centenas de vezes, em cada uma das mortes a que assisti nestas últimas semanas. Que é mais uma morte para mim?... A barbárie não terá a última palavra. A razão prevalecerá. A humanidade vencerá”.
Agora, com a escolha de um novo presidente da Conferência Episcopal, a abordagem será outra, explica John Du, mas o propósito mantém-se. “Estamos a tentar dialogar, convencer Duterte de que esta não é a forma de resolver o problema. Mas acreditamos que este problema, as ordens para matar, não pode ser resolvido através de linguagem conflituosa, deve ser de forma amigável, através do diálogo”, diz.
Num país de esmagadora maioria católica, porém, Duterte continua a ter o apoio das massas. O arcebispo diz que isso se explica porque as pessoas estão saturadas. “O problema existe há tanto tempo e as pessoas, sobretudo os empresários, querem resolvê-lo o mais rapidamente possível.”
Reconstrução integral
O arcebispo John Du esteve em Portugal a convite da fundação Ajuda à Igreja que Sofre (AIS), para participar na peregrinação internacional daquela organização a Fátima, por ocasião do centésimo aniversário das aparições.
A AIS tem desempenhado um papel importante naquele país, com o arcebispo de Palo a destacar a ajuda à reconstrução na sequência do tufão Haiyan, que assolou o país em 2013 e atingiu de forma particular a sua diocese. “Eles estão lá para ajudar a todos, não só a Igreja, mas o nosso povo insiste que os primeiros restauros sejam para as igrejas. Quando se restaura uma igreja, segundo eles, não é apenas a igreja que está a ser restaurada, é também a fé que está a ser restaurada e isso fá-los sentirem-se completos e dá-lhes a força para seguirem em frente.”
“Esta reconstrução tem sido integral, não apenas material. Permite-nos avançar e estender os braços uns aos outros, para nos ajudarmos. E isso faz com que tudo aconteça mais depressa”, diz o arcebispo John Du.