Os chamados “Pandora papers” revelaram dinheiro escondido, pelo menos do fisco, pertencente a centenas de ricos e poderosos. Estão lá políticos, empresários, gestores, famosos do desporto e da moda, etc.
Não foi uma surpresa, o que talvez explique o débil escândalo provocado por estas revelações. Já sabíamos, não há grande novidade.
O pior é que parece estarmos todos conformados com uma situação em que os mais ricos escondem dinheiro – muito dinheiro – que tanta falta faz para aplicar no crescimento económico e no progresso social.
Podemos duvidar da sinceridade dos políticos que falam em combater as desigualdades, mas pouco ou nada fazem para pôr termo a estes paraísos, que melhor seriam designados de infernos fiscais.
Por exemplo, os EUA têm exercido forte pressão sobre bancos suíços, obrigando-os a revelarem ao fisco americano depósitos cujos titulares pretenderiam não ser identificados. Mas em vários Estados norte-americanos – como o Dacota do Sul, a Flórida ou o Delaware – funcionam “off-shores” bem conhecidos. E o Reino Unido também conta com alguns paraísos fiscais.
Não tem lógica. Ou melhor, a lógica é a admissão tácita de que o combate à evasão fiscal não vai ao ponto de se eliminarem os infernos fiscais. Dão jeito a muita gente, para fugir a impostos, lavar dinheiro sujo, realizar operações ilegais ou que por qualquer motivo se pretendam ocultar.
Nos países não democráticos, das teocracias islâmicas aos estados autoritários, como a Rússia de Putin (tão admirada pela extrema-direita caseira...), o combate à evasão fiscal via “off-shores” só terá alguma eficácia uma vez sejam dados passos no sentido de uma real democracia.
Mas nas democracias terá de ser a opinião pública a levar os políticos a combaterem a sério os infernos fiscais. Só uma forte onda de repúdio por este magno fator de injustiça e desigualdade será capaz de vencer as pressões de quem lucra com a atual situação – pressões sobre os governantes, incluindo sob a forma da retirada de apoios financeiros a quem se atrever a travar o acesso aos ditos paraísos fiscais.
Enquanto tal não acontecer, revelações como esta dos “Pandora papers” darão algumas notícias curiosas durante dois ou três dias, mas nada de significativo irão mudar. É mais um “fait divers”.