A Casa da Obra de Santa Zita (OSZ), em Aveiro, já não fervilha de atividade, como aconteceu entre os anos 50 e 70 do século passado, quando era frequentada por muitas mulheres que ali iam aprender as tarefas de donas de casa ou de criadas de servir, como ao tempo eram chamadas vulgarmente as empregadas domésticas. Cursos de culinária, corte e costura, bordados e outros trabalhos manuais que foram precursores para os tempos de então.
Nas últimas décadas, o antigo palacete oitocentista do Visconde da Granja, conhecido por ostentar a maior fachada de azulejos da cidade, tem servido como lar de estudantes e professores universitários, que chegam à cidade das antigas colónias, residência de associadas mais idosas e acolhimento de pessoas de passagem temporária e até último recurso de gente sem abrigo.
A casa de Aveiro, uma das várias do País a cargo do Instituto Secular das Cooperadoras da Família (ISCF), continua a cumprir o desejo do fundador, monsenhor Joaquim Alves Brás, nomeadamente ao abrir as portas para as famílias das paróquias locais que tomam parte nas reuniões de reflexão do Movimento por um Lar Cristão (MLC), que também foi uma criação do padre natural de Casegas, distrito da Guarda, falecido em 1966.
As "exigências legais e, sobretudo, financeiras", afastaram o sonho de instalar um lar vocacionado para a terceira idade no emblemático edifício da Rua dos Combatentes da Grande Guerra, contíguo à praça Marquês do Pombal, adquirido pela OSZ à família dos Sacchetti, em 1958.
Preservar património único e abrir centro de dia
Hoje o foco das Cooperadoras da Família está em mobilizar vontades para a classificação do imóvel como património de interesse público devido ao valor arquitetónico e coleção rara de painéis de azulejos do princípio do Século XIX, procurando, por essa via, apoios para o restauro e, assim, avançar com uma valência para idosas aberta a associadas e não só, já que a cidade carece de equipamentos deste tipo.
"O lar, infelizmente, já colocámos de lado. Agora o centro de dia, que é parte do nosso trabalho, não está fora de questão, pelo contrário queremos estudar isso", afirmou Etelvina Silva, diretora da casa de Aveiro, sem esconder as dificuldades em mobilizar os apoios necessários, nomeadamente públicos, que permitam a obrigatória adaptação dos espaços.
"Monetariamente não sei se vamos lá chegar, estamos a marcar audiências com entidades para procurar os financiamentos", acrescentou a Cooperadora da Família motivada com a visita 'ao local', prevista para breve, de responsáveis autárquicos e da direção do ISCF.
Se aquando das comemorações do cinquentenário, em 2007, já se ouviram alertas para "o estado de desgaste" do antigo palacete, agravado pela construção nas proximidades de um estacionamento subterrâneo, 11 anos depois, mantendo-se sem qualquer obra de fundo, o tom do apelo tornou-se mais dramático, apontando-se para frisos nos tetos antigos a ruir, rachas nas paredes e azulejos com mais de um século presos por fita cola.
"Temos muitas despesas para manter esta casa, mas estou com esperança que vamos dar passos e que iremos ter ajudas pelo menos para dar a conhecer; abrir a casa ao publico como museu, é o nosso desejo, dando a conhecer este património que é desconhecido de muitos podemos ter apoios", referiu Etelvina Silva.
Apelos para travar degradação
Cooperadora da Família desde 1950, Cesaltina Martins, ficou "chocada" com o que viu quando regressou em janeiro para viver na casa de Aveiro, onde foi diretora (1980-87). Agora ocupa muito do seu tempo e forças em "apelos" para travar a degradação. "Seguiram cartas para as superioras gerais, são precisas intervenções rápidas para que isto se mantenha. Quanto mais tempo demorar, mais danificada fica, foram muitos anos sem manutenção, causa-me muita dor", lamentou, lembrando que não existe alternativa "às pessoas que temos a nosso encargo".
A Renascença acompanhou uma visita pelo antigo palacete com elementos da Associação para o Estudo e Defesa do Património da Região de Aveiro (ADERAV), finda a qual se decidiu tratar do processo de classificação do imóvel como de interesse, atendendo, sobretudo, às suas coleções interiores de painéis de azulejos raros (1909), assinados pelo pintor Licínio Pinto, da extinta fábrica de louça da Fonte Nova.
"São exemplares fantásticos, ficam escondidos ao olhar comum. Temos poucos exemplos na cidade em Aveiro, ainda para mais num casa com arquitetura fantástica", destacou Paulo Morgado, da direção da ADERAV, deixando o compromisso de apoiar as pretensões da OSZ.