O pugilista de 24 anos Farid Walizadeh vive no Centro de Rendimento do Jamor, em Lisboa, mas nos últimos dias o seu pensamento está longe. "Tenho a rádio do Afeganistão ligada 24 por dia para saber se algum dos meus amigos morreu", contou à Lusa o jovem que chegou a Portugal em dezembro de 2011 e se revelou um dos melhores pugilistas do país.
No telemóvel, instalou a "Ariana News" que lhe tem permitido acompanhar o avanço dos talibãs no Afeganistão. "Durmo e acordo com as notícias sempre ligadas", disse o jovem que conhece bem as cidades que se ouve na rádio.
Hoje, os combatentes talibãs chegaram à capital Cabul depois de uma semana em que as grandes cidades caíram nas mãos dos radicais islâmicos.
Até há dois ou três dias, a Ariana News ainda nomeava todos os que morriam, recordou. "Eles diziam os nomes das pessoas que tinham morrido nos diferentes bairros. Agora são tantos que dão apenas números", lamentou, admitindo que o facto de a mãe, as duas irmãs e os três irmãos estarem em Portugal consigo lhe reduz um pouco a ansiedade.
Apenas uma das irmãs de Farid está num campo de refugiados na Turquia, onde é "tudo muito mais difícil", mas mesmo assim nada comparado com o que estão a viver amigos e familiares afastados no Afeganistão.
"Não consigo falar com ninguém. Os talibãs são um povo burro: sabem usar as armas para matar, mas toda a restante tecnologia, como os telefones, dizem que são o diabo", desabafou.
Através das notícias sabe apenas que a maioria fugiu para Cabul e, com apenas 24 anos, carrega o peso de estar longe e "não conseguir ajudar, nem fazer nada, pela família e amigos". Há 8.593 quilómetros que separam Lisboa e Cabul.
Sobre o avanço dos talibãs, Farid diz apenas que "o Afeganistão voltou a recuar 20 anos".
Nasceu num país que sempre conheceu em guerra: "A minha mãe diz que houve paz nos anos 70 e que as mulheres até tinham direito a andar de saía, mas nunca vi nada disso, só em fotografias".
O refugiado afegão chegou sozinho a Portugal, tendo atravessado o Paquistão, Irão e Turquia até que em dezembro de 2011 o ACNUR o trouxe para Portugal. Em 2017, chegaram a mãe, duas irmãs e os três irmãos.