“Portugal terá um novo resgate se a DBRS cortar o rating”
29-01-2016 - 16:50
 • Hugo Monteiro

Os bancos nacionais ficariam sem financiamento, diz o economista, antigo quadro do FMI. Defende que é preciso tomar as medidas que ponham a situação orçamental portuguesa em linha com as regras europeias.

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Portugal pode enfrentar um novo resgate se a agência de notação financeira DBRS descer o rating para “lixo”, alerta o economista Álvaro Santos Almeida em entrevista à Renascença.

O antigo quatro do Fundo Monetário Internacional (FMI) explica que os bancos nacionais ficariam sem financiamento e isso significaria o regresso da troika. Para evitar esse cenário, Álvaro Santos Almeida defende que é preciso tomar as medidas que ponham a situação orçamental portuguesa em linha com as regras orçamentais europeias.

A agência canadiana DBRS, fundamental para que Portugal mantenha o programa de estímulos do BCE e continue a ter acesso juros de dívida baixos, afirma que está “continuamente a monitorizar os desenvolvimentos em Portugal para perceber se são necessários fazer ajustamentos ao “'rating' do país”.

A DBRS admite cortar o "rating" de Portugal. Que consequências uma decisão dessas pode ter?

Se se materializar e se a DBRS cortar o "rating" de Portugal, isso significa um segundo resgate, na medida em que os bancos portugueses deixam de ter acesso ao financiamento do Banco Central Europeu, a não ser que exista um programa em curso com o país.

Como a hipótese de não ter acesso ao financiamento era catastrófica, a única solução, nessa altura, será acordar um novo programa de resgate, um novo acordo com a troika. Portanto, mais uma vez voltar a ter aqui a troika e as medidas de austeridade de que, aparentemente, nos tínhamos livrado, mas que, pelos vistos, com este Orçamento, que não respeita as regras orçamentais europeias, pode pôr tudo isso em causa.

Por que é que esta agência de "rating", em particular, é tão importante para Portugal?

É importante porque, para que os bancos portugueses possam utilizar os títulos da dívida portuguesa nas suas operações com o BCE, têm de ser títulos que tenham um "rating" acima de lixo. Das quatro agências que o BCE aceita como credíveis, três já avaliam a dívida pública portuguesa como lixo. Esta agência canadiana é a única que não o faz. Está no limite. O que significa que se houver uma descida do "rating" para o nível de lixo, o BCE deixa de aceitar os títulos da dívida pública portuguesa.

A dívida pública não sendo aceite pelo BCE, também não poderá ser utilizada pelos bancos. Portugal deixa, assim, de ter acesso a financiamento, os bancos portugueses, que têm dívida pública, deixam, também, de ter acesso a financiamento. Se isso se materializasse, seria o caos completo: os bancos iam à falência, deixava de haver financiamento à economia. As consequências seriam desastrosas. Não é isso que vai acontecer, acho eu. O que irá acontecer é que, nessa altura, vamos ter de invocar outra cláusula que diz que o BCE pode aceitar títulos de países que estejam com um acordo com a Comissão Europeia – que estejam sob resgate.

Como evitar este cenário?

É preciso tomar as medidas que ponham a situação orçamental portuguesa em linha com as regras orçamentais europeias. Nessas circunstâncias, em princípio, a DBRS não corta o "rating". Aquilo que a DBRS invoca é, exactamente, a aparente falta de compromisso de um país europeu com as regras orçamentais europeias, nomeadamente porque o Orçamento que foi apresentado em Bruxelas não cumpre a meta de redução do défice estrutural. Há uma série de outras dúvidas, sobre o cenário macroeconómico de base que é optimista.

Portanto, sendo um Orçamento que não é credível, é natural que a DBRS ponha em causa a capacidade do país, no futuro, cumprir os seus compromissos, que é isso que uma agência destas avalia. Portanto, a solução para evitar esse desfecho é apresentar um Orçamento que seja credível, mas que, pelos vistos, não é o caso do que foi apresentado em Bruxelas.

Tendo em conta a conjuntura governativa em Portugal, o que é que isso pode significar?

Eu vejo com muita dificuldade que a maioria actual se mantenha intacta na hipótese de haver um resgate, porque, se nos recordarmos que em 2011, quando foi o outro resgate da troika, o PCP e o Bloco de Esquerda opuseram-se a esse resgate, até se recusaram a falar com a troika. Desta vez não poderia ser assim. Teriam que aprovar esse programa e eu vejo com muita dificuldade que o façam.