Na véspera de o Governo anunciar as medidas de combate aos efeitos da inflação, Jerónimo de Sousa não perdoou o PS de António Costa e colou os socialistas a toda a direita - do PSD ao Chega, passando pela Iniciativa Liberal e CDS.
No comício de encerramento da Festa do Avante, que decorreu desde sexta-feira na Quinta da Atalia, no concelho do Seixal, o líder do PCP lamentou as "medidas de faz de conta" do executivo, acusando que se trata de uma "política que une o Governo do PS e o conjunto das forças retrógradas e reacionárias de PSD, CDS, Iniciativa Liberal e Chega".
Jerónimo foi mesmo mais longe considerando que todas estas forças políticas desenham "falsas e hipócritas medidas de assistencialismo para esconder a origem e os mecanismos de extorsão e da sobre-exploração", concluindo de improviso que "os trabalhadores são presos por ter cão e por não ter cão à pala da inflação".
Bom, bom, para o líder comunista, é que entre as "medidas de emergência" a anunciar esta segunda-feira pelo primeiro-ministro estivessem, por exemplo, o "aumento geral dos salários e das pensões numa percentagem que assegure já este mês a reposição e a valorização do poder de comprados trabalhadores e dos reformados".
Aumento dos rendimentos, com a subida do Salário Mínimo Nacional para os 800 euros, mas também a redução da taxa do IVA sobre a eletricidade e o gás para os 6%. E volta a proposta de fixação de preços de bens alimentares como o pão, a carne ou o peixe.
"Tudo está assustadoramente mais caro", conclui Jerónimo e, portanto, a "fúria exploradora e especulatória que avança impune precisa de ser travada", atira o líder do PCP. Como? Não indo na cantiga da direita mais e menos moderada - do PSD ao Chega - e aposte na taxação dos lucros das empresas considerados extraordinários.
Governo "cúmplice" pela escalada da guerra e o "cerco" à Rússia
No palco 25 de abril, no centro do recinto da Quinta da Atalaia, o secretário-geral comunista considerou ainda que os Estados Unidos, Bruxelas e a NATO, "com a cumplicidade do Governo português", tudo estão a fazer para continuar a guerra na Ucrânia, sem qualquer preocupação pelas condições de vida das populações.
No início do discurso no comício de encerramento da 'rentrée' comunista, Jerónimo de Sousa foi direto ao tema da guerra na Ucrânia. Se no primeiro dia da Festa, na sexta-feira, o líder comunista pediu que se evitasse a confusão de assuntos, referindo o Avante como uma "festa da paz", este sábado usou e abusou do tema colando o Governo português à criação do monstro da inflação.
"A escalada da guerra na Ucrânia e a espiral de sanções impostas pelos Estados Unidos da América, a União Europeia e a NATO, com a cumplicidade do Governo português, são indissociáveis da desenfreada especulação e aumento dos preços da energia, dos alimentos e de outros bens de primeira necessidade", sustentou o dirigente comunista.
Para o secretário-geral do PCP, "a realidade está a demonstrar quem tudo faz para que a guerra não termine" e também "quem tudo faz para acumular lucros colossais com a sua continuação", referindo-se à indústria do armamento e às multinacionais do setor da energia.
Seis meses depois do início da invasão russa à Ucrânia, Jerónimo de Sousa fez questão de deixar, mais uma vez, vincada a posição do partido: "Razão tem o PCP ao estar desde a primeira hora do lado da paz e contra a guerra, razão tem o PCP ao defender uma solução política para o conflito".
Ao mesmo tempo, o líder comunista dá conforto à Federação Russa - que defende estar sobre um "gradual cerco" e à China, que considera ser alvo de "manobras e provocações" crescentes.
"Cá estamos"
Desde sexta-feira a definir esta edição do Avante como a "festa da paz," o líder do PCP atirou à multidão em frente do principal palco do recinto um "cá estamos" numa edição da festa que Jerónimo garante que se "traduziu num enorme êxito, apesar das reiteradas campanhas de manipulação e mentira, das pressões e das desprezíveis chantagens".
Um discurso bem diferente das declarações que prestou aos jornalistas na sexta-feira, em que o líder comunista pedia que se fosse à Quinta da Atalaia "com os olhos limpos de preconceito", admitindo mesmo que o evento da Atalaia até pode ser alvo de "possíveis reparos críticos".
O líder comunista voltou ao ataque em força e em todas as frentes. Em relação ao estado da saúde, por exemplo. "O que se passa no Serviço Nacional de Saúde e nas suas presentes dificuldades é o claro retrato desta política prosseguida anos e anos pelo PS, tal como por PSD e CDS e que os seus sucedâneos da IL e do Chega aspiram prosseguir".
De novo, Jerónimo a colocar toda a direita e o PS no mesmo saco. Os comunistas querem a valorização das carreiras e dos salários dos profissionais deste sector, mas consideram que "o Governo não avança com soluções!". E fica o remoque a António Costa: "Não é com demissões de ministros que se salva o SNS".
"Cá estamos". E estaremos, parece dizer Jerónimo de Sousa num discurso mais curto do que o normal num habitual discurso de fim de festa. Este, diz o líder comunista é o "Partido com uma identidade inconfundível, razão da sua existência, da sua força e do seu papel insubstituível".
Um papel que diminuiu com a perda da força parlamentar. O PCP viu-se reduzido a uma representação de seis deputados na Assembleia da República. Mas, mesmo com uma bancada parlamentar mirrada, Jerónimo tem o alvo definido: esta é a "força de oposição ao PS e aos projetos reacionários".
[atualizado às 22h33]