Uma nova vacina contra o VIH será testada esta quarta-feira, véspera do Dia Mundial de Luta contra a Sida, na África do Sul. O novo teste está a ser encarado como o provável mais relevante avanço no combate às infecções por VIH.
O teste será feito na África do Sul e é o primeiro do género em sete anos. O estudo pretende incluir 5.400 homens e mulheres entre os 18 e os 35 anos de idade.
"Se implementada em paralelo com o nosso actual conjunto de ferramentas que deram provas de prevenirem o VIH, uma vacina segura e eficaz pode ser o último prego no caixão do VIH”, afirmou Anthony Fauci, director do Instituto Nacional de Alergias e Doenças Infecciosas dos Estados Unidos, que faz parte do estudo.
“Se se demonstrar esta eficácia de 50/60% [da vacina], já é fenomenal”, diz, em entrevista à Renascença, Pedro Morais, psicólogo clínico da associação Abraço e responsável pelo centro + Abraço que actua na detecção precoce do VIH/sida.
Estamos perante o mais promissor teste dos últimos tempos na procura de uma vacina contra o VIH. Para quem é seropositivo é um factor de esperança ou é apenas mais um anúncio?
Estas notícias geram sempre muita dúvida entre os nossos utentes, as pessoas com infecção, mas esta notícia é um pouco diferente das que têm surgido nos anos anteriores. Não é a apresentação de uma cura, trata-se de uma vacina preventiva para pessoas seronegativas, ou seja, para travar as taxas de incidência enormes que existem naqueles países da África Subsariana.
Contudo, como é óbvio, as pessoas seropositivas e com quem a Abraço lida trazem essas dúvidas e questionam-nos: que notícia é esta? Que vacina é esta? Todos os técnicos que lidam com este tipo de pessoas têm que fazer este trabalho de explicar a importância. Se se demonstrar esta eficácia de 50/60% [da vacina], já é fenomenal.
Mas há sempre receio que seja apenas uma estratégia comercial da indústria farmacêutica.
Sim. Nós já fomos tantas vezes desiludidos que já é difícil acreditarmos sem vermos as provas em si. Contudo, esta vacina já passou por uma fase de testes bastante minuciosa e rigorosa. Só por isso é que agora vão testar em 5.400 pessoas – os testes de segurança e eficácia já foram ultrapassados. Por isso, mal não faz. Só pode trazer coisas boas e é isso que nós aguardamos.
Há um decréscimo, mas Portugal ainda está na cauda da Europa no que diz respeito aos índices de infecção. Que análise faz aos números que têm surgido nos últimos anos em Portugal?
Há duas formas de olhar para estes números. Realmente é fantástico e a tendência a nível europeu é o decréscimo em todo o país da taxa de incidência. Contudo, Portugal, neste decréscimo, vai a passo de caracol, mas [em termos de infecções] estamos só abaixo do Luxemburgo. Claro que depois os países de Leste que ainda não pertencem à UE ainda nos ultrapassam a Estónia e a Letónia.
Temos que perceber por que é que isto está a acontecer no nosso país porque não me parece que os portugueses tenham mais comportamentos de risco do que o resto da Europa.
Mas há um quadro de detecção ainda insuficiente?
Um dos factores apontados como essencial para estes números é a fraca detecção, ou seja, a fraca procura das pessoas do teste e que resulta em diagnósticos tardios. Estima-se, e é uma estimativa com um desvio-padrão pequeno, que existam em Portugal 4 mil pessoas com infecção e não diagnosticadas. São estas pessoas com uma carga vírica descontrolada que aumentam estes números de incidência no nosso país.
Quando falamos de sida falamos também muitas vezes de discriminação. O quadro alterou-se? Como é que um seropositivo é hoje olhado na sociedade e no mercado de trabalho?
Mudar consciências é muito difícil e num país tão tradicional como o nosso. Podemos viver na vanguarda da tecnologia e no discurso de bons cidadãos, mas nas práticas comportamentais não se verifica.
Há pouca procura da realização do teste, porque as pessoas não identificam que o comportamento delas seja de risco ou que se exponha ao risco – ainda acham que é necessário pertencer a grupos de risco [para haver infecção]. Isso já foi uma verdade, mas já há muitos anos que não é – temos a relação heterossexual desprotegida com a maior percentagem de novos casos de infecção. A relação sexual normativa da nossa sociedade é quem mais transmite.
E as entidades patronais olham de lado para quem é seropositivo?
Vão-se fazendo passos pequeninos e já não há esse estigma tão cristalizado. Já tivemos bons “feedbacks” de algumas empresas que até nos chamam para dar algum tipo de formação porque têm uma pessoa infectada na equipa e que optou por partilhar.