Numa altura em que muitos portugueses sentem na pele os efeitos da nova crise económica provocada pela pandemia, o tema dos grandes devedores à banca voltou à ribalta com algumas detenções sonantes no espaço de poucos dias. Sabe quantos hospitais, aeroportos, linhas de comboio ou até estádios de futebol dava para construir com as dívidas de Luís Filipe Vieira ou Joe Berardo? Fizemos algumas contas e comparações.
As aplicações milionárias de empresários e investidores mais ou menos conhecidos tornaram-se em ativos tóxicos e fizeram mossa nas contas dos bancos. As grandes quantias das principais dívidas ao Novo Banco (NB), o “lado bom” do intervencionado BES, têm sido um dos temas mais recorrentes dos últimos anos. Os portugueses habituaram-se a ver vários números impressos nos jornais ou demonstrados nas televisões.
Mas com tanto número, às vezes é difícil perceber ao certo o verdadeiro valor destas dívidas. Aplicados na prática, a que é que equivalem todos estes muitos milhões de euros?
A empresa Promovalor de Luís Filipe Vieira , o presidente autossuspenso do Benfica na sequência da operação Cartão Vermelho, devia ao Novo Banco cerca de 760,3 milhões de euros, segundo uma auditoria da Deloitte divulgada pelo jornal "Correio da Manhã" no ano passado. Entre agosto de 2014 e finais de 2018, a empresa causou uma perda de 225 milhões ao banco.
Outra empresa de Vieira, a Imosteps, tinha uma dívida a rondar os 58 milhões de euros ao Novo Banco e provocou perdas superiores a 45 milhões à instituição bancária, contabilizou a investigação do Ministério Público.
No entanto, o presidente autossuspenso do Benfica nega estes valores. Na comissão de inquérito parlamentar às perdas registadas pelo Novo Banco e imputadas ao Fundo de Resolução, em maio deste ano, Vieira apontou para uma exposição da Promovalor que rondava os 227 milhões de euros, em 2017, transferindo o seu património para um fundo que a reestruturou.
Se assumirmos os montantes divulgados pela comunicação social, as dívidas das empresas de Luís Filipe Vieira valem mais do que cinco Estádios da Luz, que teve um custo de construção de 162 milhões de euros. Aliás, os dez estádios construídos para o Euro 2004 custaram menos (665 milhões de euros) do que a dívida da Promovalor ao Novo Banco.
Ainda dentro do futebol, a venda de Neymar do Barcelona para o PSG (222 milhões de euros), a transferência mais cara da modalidade, teria de ser repetida mais de três vezes para se chegar aos valores das dívidas do “universo” Luís Filipe Vieira.
O total da dívida de Vieira ao NB dava para construir o futuro hospital de Lisboa Oriental, orçado em 470 milhões de euros, e ainda sobravam 290 milhões de euros, mas não chegava para uma ponte Vasco da Gama, que custou cerca de 900 milhões de euros.
E seriam precisas mais de 20 pontes sobre o Douro (a nova ligação rodoviária Porto-Gaia custa 36,9 milhões de euros) para igualar as dívidas da Promovalor e da Imosteps ao Novo Banco.
Dívida de Berardo dava para construir vários hospitais
Joe Berardo é outro grande devedor do Novo Banco que tem marcado a atualidade, após ter sido constituído arguido e sujeito a uma caução de cinco milhões de euros.
A dívida de cerca de 327,7 milhões de euros, segundo o "Expresso", do empresário madeirense é superior ao custo de oito novas pontes sobre o rio Douro.
O "buraco" deixado por Joe Berardo no Novo Banco representa quase cinco vezes o valor do projeto do Hospital de Proximidade de Sintra (cerca de 75 milhões de euros em edifício e equipamentos), que deverá começar a ser construído este ano.
De realçar ainda que, para igualar a soma das dívidas da Promovalor e da Imosteps de Luís Filipe Vieira, eram necessárias quase duas dívidas e meia de Joe Berardo.
Esta não é a única dívida do empresário madeirense. Joe Berardo deve ainda 439 milhões de euros à Caixa Geral de Depósitos e ainda cerca de 230 milhões ao BCP. No total, são cerca de mil milhões de euros em dívidas.
A Ongoing, grupo liderado por Nuno Vasconcellos que foi declarado insolvente em agosto de 2016, é outras das grandes devedoras do Novo Banco, com uma exposição de 600 milhões de euros.
No entanto, o ex-presidente do grupo recusou-se a admitir este montante numa audiência parlamentar que terminou em polémica, devido à indignação dos deputados perante a postura de Nuno Vasconcellos. Nessa mesma audiência, disse que a dívida total ao BES era de 520 milhões de euros, com juros.
Se considerarmos a quantia de 600 milhões de euros, tratam-se de valores que são equivalentes a cerca de 90% do custo de todos os estádios construídos para o Euro 2004.
A dívida da empresa é ainda superior ao custo para construir o novo Hospital de Lisboa Oriental. Seriam precisas mais de 16 novas pontes sobre o Douro para igualar a quantia devida ao Novo Banco.
O Grupo Moniz da Maia é outro dos grandes devedores ao NB, no valor de 550 milhões de euros. A dívida da Sogema, que pertence ao Grupo Moniz da Maia, é superior ao custo anual de descer o IVA da energia - eletricidade e gás natural - de 23% para 13%.
Se somarmos todas as dívidas já mencionadas (2.296,2 milhões de euros) podíamos construir duas pontes Vasco da Gama e ainda teríamos troco ou então dois aeroportos no Montijo.
Menos de 100 milhões de euros separam a soma destas dívidas e o custo de construir cinco Hospitais de Lisboa Oriental. Também ficávamos com dinheiro a sobrar mesmo se construíssemos 60 pontes sobre o Rio Douro.
Estas dívidas todas juntas eram ainda capazes de cobrir mais de metade do custo total do projeto de TGV Lisboa-Porto (4.500 milhões de euros).