Se está a pensar marcar casamento ou batizado não pode convidar mais de 50 pessoas. É uma das consequências do estado de calamidade decretado pelo Governo para todo o território nacional.
A medida está a preocupar a indústria dos casamentos, já praticamente parada devido à pandemia causada pelo novo coronavírus.
Raquel Ribeiro é proprietária da Noiva Feliz, casa de vestidos de noiva e cerimónia, e fala num ano “verdadeiramente dramático”. Desde março até agora vendeu, no “máximo, oito vestidos”. Um número insignificante, quando comparado com o de anos anteriores.
“Vamos sobrevivendo. Tínhamos vendido alguns vestidos até ao mês de março e como as clientes deixam um determinado valor de sinal, é com esse dinheiro que vamos sobrevivendo”, conta à Renascença.
Mas se o ano já era mau, o estado de calamidade decretado pelo Governo para todo o território nacional veio baralhar ainda mais as contas e aumentar a apreensão de Raquel Ribeiro. Os casamentos e batizados “têm de ser comedidos” e os que forem marcados a partir da entrada em vigor do estado de calamidade ficam limitados a um máximo de 50 convidados.
“Tinha noivas com perspetivas de casamento para dezembro e que estavam em processo de escolha do vestido e com esta medida já estão a cancelar, porque não estão dispostas a deixar algumas pessoas de fora”.
Prestes a receber a nova coleção para o ano de 2021, Raquel não sabe o que lhe reserva o futuro, mas teima em não desistir. O seu lema é “esperar pelo dia de amanhã, não desistir, tentar perceber o que é que vai acontecer”.
“A machadada final no pior ano de sempre”
António Teixeira, proprietário de uma quinta de grande referência no concelho de Chaves, a Quinta do Príncipe, com capacidade para a realização de grandes eventos, considera que a medida de limitar o número de pessoas “é a machadada final neste setor de atividade que está a passar o pior ano de todo o sempre; é um setor em agonia”.
“Isto não tem comparação nenhuma. Só tem comparação, se estivéssemos numa guerra. E se isto se prolongar no tempo, vai ser o fim de muitas empresas neste setor de atividade”, antecipa.
Sem querer quantificar valores, António Teixeira revela que a faturação da sua empresa “caiu 90%”. “Daí ser fácil tirar conclusões. Estamos a falar em perdas de faturação abismais”, acrescenta.
As perspetivas “não são nada positivas, antes pelo contrário, agora com esta nova medida”, diz António Teixeira, porque tinha a “esperança e a fé que se pudessem realizar, nomeadamente as festas de Natal, no mês de dezembro, a festa de fim de ano, o tão esperado por todos Réveillon que, com esta medida, é impensável estarmos a equacionar a organização deste tipo de eventos”.
De acordo com António Teixeira, o mês de dezembro “servia para algum equilíbrio, porque este é um setor que vive muito do verão para o inverno. O mês de dezembro é o mês de equilíbrio, que nos serve para aguentar o mês de novembro, que é muito parado, e depois o mês de janeiro e fevereiro”.
“Este ano, não existindo este mês de equilíbrio na nossa faturação, vai ser dramático, difícil. Muitas empresas não vão conseguir sobreviver a um período de interregno de atividade tão prolongado, como está a acontecer no nosso setor de atividade”, antevê.
“Grande impacto psicológico”
Já Jorge Ferreira, da BestEvents, empresa responsável pela organização de feiras nacionais e internacionais dedicadas ao casamento, afirma que, “em termos objetivos”, não sabe “qual o efeito prático que essa medida vai ter”.
“Normalmente, quem quer casar faz a marcação com três, quatro meses de antecedência na conservatória. Se eu hoje vou marcar o meu casamento, vou marcar provavelmente para janeiro ou para dezembro. Será que esta medida da limitação das pessoas, ainda existe em dezembro? Não sabemos”, diz à Renascença.
O empresário alerta que a limitação agora imposta pelo Governo “é apenas para os casamentos que se vão marcar. Aqueles que estão marcados já, por exemplo, para novembro ou até para dezembro, que já tenham esse comprovativo da conservatória, mesmo que tenham 150 pessoas, podem-se realizar”.
Jorge Ferreira considera, no entanto, que a medida do Governo em limitar o número de pessoas em casamentos e batizados “é mais uma machadada no setor”, porque “vai ter um grande impacto psicológico nas pessoas”.
“Vai fazer com que as pessoas não tomem decisões imediatas. Mesmo que estejam a pensar que vão casar em julho ou agosto do próximo ano, não vão tomar essa decisão, para ver o que é que isto vai dar”, explica.
O setor dos casamentos foi, segundo o empresário, dos mais afetados pela pandemia de Covid-19. Ainda não há dados definitivos em termos do valor dos prejuízos, mas Jorge Ferreira adianta que em julho estavam com “80% entre cancelamentos e adiamentos para 2021 e é provável que este número vá aumentar em termos de adiamentos para 2021, que poderá chegar aos 90%”.
Segundo os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), em 2019 realizaram-se 32.595 matrimónios em Portugal. Destes, 10.037 são religiosos, 22.404 são uniões apenas com cerimónia civil e 154 de outro tipo.
O responsável da BestEvents não se atreve a fazer projeções para o futuro, porque, diz, “não sabemos como vai ser o comportamento da pandemia, não sabemos como serão os comportamentos políticos também, porque, muitas vezes, nestas decisões, há muitas decisões de base política e torna-se difícil uma previsão”.
Ainda assim, o empresário quer acreditar que “o ano 2021 vai ser um ano forte no mundo dos casamentos, devido à ausência deles este ano” e espera “que volte à normalidade a partir de fevereiro ou março”.
BragaNoivos para alavancar a “retoma”
A BragaNoivos 2020 está marcada para os dias 23, 24 e 25 de outubro, no Altice Forum Braga, e conta com a participação de cerca de 110 empresas.
Em ano “particularmente difícil para o setor dos eventos”, com empresas a passarem “sérias dificuldades financeiras”, devido à pandemia de Covid-19, o evento assume uma “importância crucial”, indica Jorge Ferreira, da BestEvents.
“Mais do que ajudar os casais a organizar o casamento de sonho, o certame será uma alavanca para a retoma deste importante setor que movimenta mais de 181 milhões de euros só na região de Braga, onde, em 2019, se registaram 1. 453 casamentos”, assinala Jorge Ferreira, da BestEvents.
O promotor do evento sublinha que Portugal “registou uma quebra de 74% nas uniões católicas e uma descida acentuada nos casamentos civis, 22.915 casamentos em 2019, contra 11.985 nos primeiros nove meses de 2020”, e alerta que “grande parte das empresas que trabalha nesta área está a passar sérias dificuldades financeiras”.
Daí que a realização da BragaNoivas seja encarada como uma lufada de ar fresco para o setor.
“Acreditamos que a realização da BragaNoivos vai ajudar a relançar negócios e fazer mexer este setor”, refere o responsável da BragaNoivos, um dos maiores certames do setor nupcial em Portugal.
“É importante de múltiplas formas. É importante para as empresas que trabalham na organização de eventos, que estão paradas há muito tempo, e é uma ajuda a dinamizar também esse setor”, acrescenta Jorge Ferreira.
Com toda a segurança e testes rápidos à Covid-19
O evento apresenta-se também como um espaço de motivação “para passar confiança ao mercado, passar confiança às pessoas, em que as coisas podem ser feitas com regras”.
“É esta a mensagem que queremos passar na BragaNoivas. Ao organizar este evento, queremos organizá-lo com regras e que as pessoas se sintam seguras, mas também, ao mesmo tempo, demonstrar que é possível fazer”, conta.
“Vamos tentar dar todas as condições de segurança a quem vai visitar o evento e, principalmente, também a quem vai estar lá a trabalhar”, assegura o responsável da BestEvents, revelando que vão “incrementar uma medida nova” que resulta de uma parceria com a Cruz Vermelha Portuguesa e que consiste na disponibilização de testes rápidos à Covid-19.
“Vai ser possível fazermos testes no momento a pessoas que, presumivelmente, possam estar infetadas, e conseguimos obter em quase 15 minutos o resultado de um teste. É um novo serviço que a Cruz Vermelha apresenta”, concretiza o empresário.
De acordo com Jorge Ferreira, a zona Norte do país foi desde sempre uma referência no mundo do casamento. “Continua a ser a região onde se celebra o maior número de casamentos religiosos. E um fiel representante da força deste setor é a BragaNoivos”, considera o promotor.
A área de influência do evento abrange as NUTS do Cávado, Ave, Alto Minho e parte da área Metropolitana do Porto, regiões que, em 2019, e segundo dados do INE, se realizaram 9.105 casamentos.