A comissão independente para o estudo dos abusos sexuais contra as crianças na Igreja começa esta terça-feira a receber testemunhos de situações ocorridas entre 1950 e 2022.
O objetivo do trabalho da comissão é o da recolha de testemunhos, para um estudo que não procederá a reparações financeiras nem judiciais, mas que pode dar como reparação às vítimas o quebrar de um silêncio e de um sofrimento pessoal, disse hoje o coordenador da comissão, o pedopsiquiatra Pedro Strecht.
Pedro Strecht referiu que “apenas o ter alguém com quem falar” pode ser “absolutamente marcante” na “viragem emocional” na vida de uma pessoa.
No entanto, todos os testemunhos recebidos que possam ser enquadrados como denúncias de crimes ainda não prescritos serão “imediatamente encaminhados” para as autoridades competentes, explicou o membro da comissão Álvaro Laborinho Lúcio, juiz conselheiro jubilado do Supremo Tribunal de Justiça e ex-ministro da Justiça.
“Nós vamos distinguir claramente denúncias de testemunhos. As denúncias não as vamos trabalhar, mas vamos imediatamente enviá-las para as instâncias competentes”, disse o juiz conselheiro, referindo que estão já estabelecidos canais de comunicação com as hierarquias superiores da Procuradoria-Geral da República e da Polícia Judiciária.
Qual são os meios de denúncia?
A terapeuta familiar Filipa Tavares explicou que há cinco formas de atendimento dirigidas às vitimas: “aceder ao site darvozaosilencio.org e preencher um inquérito, telefonar para o 917110000, todos os dias úteis das 10h00 às 20h00”.
Esta especialista esclarece que “não se trata de uma linha de apoio clínico, mas um meio para receção de testemunhos que quem não possa fazê-lo online”.
É, ainda, possível enviar um email para geral@darvozaosilencio.org e uma carta por correio para o apartado que será oportunamente divulgado.
As vítimas podem também agendar entrevistas com profissionais especializados e que podem decorrer através das plataformas digitais ou presencialmente.
Na conferência de imprensa desta segunda-feira, os seis elementos da comissão independente sublinharam que o objetivo é dar voz ao silencio para que as vítimas se sintam confiantes em dar o seu testemunho.
Qual o espaço temporal da investigação?
Inicialmente a comissão não tinha anunciado um hiato temporal em que decorriam as investigações, mas hoje Ana Nunes de Almeida precisou que será a partir de 1950.
A socióloga Ana Nunes de Almeida adiantou ainda o estudo procurara quantificar número de crianças vítimas de abuso sexual no seio da igreja e perceber quais as características dos abusos, os perfis das vítimas e perfis dos abusadores.
A comissão irá pesquisar em jornais, revistas e bases de dados de entidades como a CPCJ, APAV, Procuradoria-Geral da República e Instituto de Apoio à Criança.
“A comissão dará a palavra às vítimas”, frisou a especialista.
A comissão vai investigar todos os casos que surgirem?
A comissão irá investigar casos que envolvam crianças e que tenham ocorrido no seio da Igreja. Pessoas vulneráveis não serão contempladas, tal como casos que ocorram noutros contextos que não o da Igreja.
Pedro Strecht, o coordenador da comissão independente, sublinhou que este organismo foi criado “para estar ao lado das pessoas, tem disponibilidade total para as escutar, a seu tempo e com tempo”.