A empresa portuguesa Biotecnol criou uma molécula com três braços - designada Tb535H - que vai ser testada em doentes com cancro avançado no Reino Unido. O novo biofármaco procura usar certas células imunitárias do doente (os linfócitos T) para destruir as células cancerosas.
"Este medicamento apresenta um forte potencial de
utilização em vários tipos de cancro, como o cancro de mama e rins, mas o
foco inicial, neste ensaio clínico, incide sobre os cancros torácicos,
designadamente pulmão e pleura", explica a empresa em comunicado.
A Biotecnol, que desenvolve medicamentos que usam o nosso próprio sistema imunitário para atacar as células cancerosas, estabeleceu uma parceria com o centro de oncologia britânico, o Cancer Research, para fazer um ensaio clínico, no final de 2018, em 45 doentes com cancro avançado.
“É como um míssil direccionado para
o ‘alvo 5T4’, que se liga apenas às células cancerosas que ‘emitem o sinal’
5T4, as que queremos eliminar, e não se liga às células normais. Tem-se uma
molécula com ‘dois braços’ de reconhecimento selectivo apenas das células
cancerosas com 5T4. Ao ligar-se ao antigénio 5T4, o anticorpo não só selecciona
as células cancerosas como bloqueia o seu processo de propagação. Tem assim um
duplo efeito de reconhecimento e de bloqueio”,
explicou ao jornal “Público” o
investigador Pedro de Noronha Pissarra, presidente da Biotecnol.
Para destruir as células
cancerosas, entra em acção o terceiro braço da molécula. “Com um mecanismo de
acção muito inteligente e inovador, mas também muito difícil de desenvolver, os
cientistas da Biotecnol ‘montaram’ através de técnicas de engenharia genética
uma maneira de usar as próprias defesas imunitárias do doente, para elas
atacarem e matarem o tumor”.
“Os linfócitos-T, um subtipo de
glóbulos brancos, são as células do sistema imunitário envolvidas na protecção
do corpo contra doenças infecciosas e invasores externos. Existe um lugar de
ligação (como um magneto) nos linfócitos T chamado CD3, que, quando é activado,
os torna verdadeiras células assassinas”, acrescenta. “Montaram um anticorpo
atractor do CD3: atrai os linfócitos T e liga-os a esse atractor, provocando
assim a sua activação”, detalhou ao jornal o investigador.
Resumindo: a molécula liga-se com dois braços ao tumor que tem 5T4 e, com
um outro braço, atrai e activa os linfócitos T que passeiam pelo sangue e
direcciona-os para o tumor. Ao entrar em contacto com o tumor, os linfócitos T
libertam substâncias bioquímicas letais para o tumor, que é destruído.
Os chamados biofármacos não são sintetizados quimicamente, mas servem-se dos mecanismos biológicos do corpo para combater uma doença.
A imuno-oncologia, classificada em 2013 pela prestigiada revista “Nature” como o avanço do ano, é um tipo de imunoterapia que recorre ao sistema imunitário da própria pessoa a combater o cancro.