Em Portugal estima-se que o número de pessoas afetadas por demência ronde as 205 mil. Desses, 60 a 70% têm Doença de Alzheimer. Dois terços são mulheres.
Mas para o futuro, as perspetivas da Alzheimer Europe são ainda mais negras: num dos países mais envelhecidos da Europa esse número deverá mais do que duplicar em 2050. Com a agravante de se perspetivar que Portugal tenha a população reduzida em mais de 1,2 milhões de habitantes. Ou seja, a taxa de incidência das demências na população aumenta. Já em 2025 estima-se que 230 mil portugueses tenham demência, em especial Doença de Alzheimer.
Há uma Estratégia da Saúde para a área das Demências aprovada desde junho de 2018, mas até hoje não foi implementada. A promessa de concretização consta também do PRR – Plano de Recuperação e Resiliência. A Alzheimer Portugal espera que seja cumprida e que os planos regionais avancem rapidamente.
Entretanto, na última década e com o apoio da Fundação Gulbenkian, Fundação Montepio e Sonae Sierra pôs em marcha dois projetos que visam o acompanhamento e apoio aos doentes e familiares: o projeto Cuidar Melhor e o Café Memória. Porque se receber um diagnóstico de demência é um choque, viver com a doença – uma “maratona” – é um desafio, sublinha Catarina Alvarez, coordenadora de projetos da Alzheimer Portugal, em declarações à Renascença.
Lidar com a doença e com o estigma
Falar de Demência ou da Doença de Alzheimer já se tornou mais normal, mas ainda há quem não conheça estas patologias e os efeitos que têm no comportamento dos doentes, muitos já a viver no seu próprio mundo e até sem reconhecer os que lhe são mais próximos. Há sintomas que são desvalorizados pelos próprios ou familiares e por vezes, o diagnóstico é adiado “porque não se quer pertencer a um grupo-alvo de exclusão e de deixar de ser aceite”, diz Catarina Alvarez, responsável das Relações Institucionais da Alzheimer Portugal.
Lidar com a doença torna-se, por vezes, mais difícil para os familiares e cuidadores do que para os próprios doentes, que exigem acompanhamento e atenção permanentes, 24/24 horas e normalmente, durante vários anos. Esta é uma doença de longa duração, “não é uma corrida de 100 metros, mas uma maratona”, sublinha Catarina Alvarez, em declarações à Renascença.
Foi para apoiar os doentes cuidadores que surgiu em 2012 o projeto Cuidar Melhor, da responsabilidade da Alzheimer Portugal com o apoio logístico e financeiro da Fundação Gulbenkian e outras entidades como a Fundação Montepio e ao nível científico, da Universidade Católica, através do especialista Alexandre Castro Caldas.
“O objetivo é informar, apoiar e dar uma resposta específica com técnicos que têm formação específica na área das demências, mas também acolhedora e disponível. Porque receber um diagnóstico de demência é um desafio para os doentes e familiares. É uma maratona, não é uma corrida de 100 metros. Os gabinetes pretendem ser uma resposta de continuidade na comunidade e oferecem vários serviços, inclusive clínicos. Mas também têm sessões de estimulação cognitiva para as pessoas com demência e apoio psicológico para os cuidadores informais”.
Os projetos-piloto foram implementados em Cascais, Sintra e Oeiras. Hoje são vistos com boas práticas e suportados integralmente pelas respetivas autarquias. Os municípios de Almada e Peniche já seguiram o mesmo modelo.
À espera de uma Estratégia de Saúde para as Demências que nunca mais sai do papel
Apesar do progresso, em quase uma década existem apenas vinte seis gabinetes em funcionamento no país. “Tem sido um trabalho árduo, a falta de implementação dos planos regionais da Estratégia da Saúde para a Área das Demências (aprovada em junho de 2018) impede a expansão da resposta”, diz Catarina Alvarez.
A responsável da Alzheimer Portugal frisa que é fundamental que os planos regionais sejam concretizados porque é preciso ter uma resposta integrada. “Temos de pensar numa resposta desde o diagnóstico até ao fim de vida, também numa lógica de equipamentos sociais e capacitação dos cuidadores. E a criação de um gabinete é mais fácil se tivermos um plano regional”.
Catarina Alvarez frisa que há um longo caminho a fazer, mas acredita que “se for cumprida a promessa expressa no PRR de implementar os planos regionais, teremos mais condições de, em colaboração com as autarquias, expandir o nosso trabalho no terreno”.
Um café para avivar a memória
O Café Memória “nasceu” em 2013, com o apoio da Sonae Sierra, com encontros no Cascais Shoping e Colombo. É outra forma de dar apoio a doentes e cuidadores de maneira mais informal, com informação, troca de experiências e a possibilidade de participação dos doentes em atividades lúdicas de estimulação cognitiva, como música ou jogos.
Com a pandemia, o Café Memória passou para o formato digital. Conseguiu chegar até pessoas em qualquer ponto, mas por outro lado, não tem uma ação tão eficaz junto dos doentes. “Foi uma forma de manter o projeto vivo, mas rapidamente, temos de passar para o presencial, para as pessoas com demência poderem participar, o formato presencial é muito importante”.
Catarina Alvarez revela que a retoma da atividade das vinte equipas vai ser feita conforme as condições epidemiológicas dos locais onde funcionam. Espera que no início de 2022 já todos funcionem em formato presencial. A semana passada o grupo foi reforçado com um novo Café Memória em Pombal, que abriu presencialmente e que se segundo Catarina Alvarez, teve uma boa adesão.
É o balanço destes dois projetos – Cuidar Melhor e Café Memória – que vai ser feito esta terça-feira à tarde na Fundação Gulbenkian numa sessão para assinalar o Dia Mundial da Doença de Alzheimer. Mas em que também será perspetivado o futuro, à luz de uma Estratégia da Saúde para a Área das Demências e que todos esperam que avance rapidamente.
Convite: Partilhe experiências para memória futura
As demências, por enquanto, não têm cura. Mas já se sabe que há fatores de risco que lhes estão associados e que podem ser eliminados se forem adotadas as estratégias mais adequadas. Todos estão ligados a um estilo de vida saudável e destinam-se a todos os indivíduos como forma de prevenção das demências. Ou seja, cuidar do cérebro desde novo e ao longo da vida.
É esse o objetivo da campanha que a Alzheimer Portugal lança esta semana e em que convida os portugueses a participarem em experiências online, que os ajudem a conhecer os fatores de risco modificáveis e o que podem fazer para os reduzir.
Em cinco sessões, dinamizadas por figuras públicas há uma “sala de convívio” para combater o isolamento; uma leitura partilhada, um workshop de alimentação saudável, um ensaio musical e uma sessão de treino físico.