Tempo estranho este...
Dizem que voa, mas parece parado!
Para alguém que, hipoteticamente, tenha decidido, há seis meses, não atender ao noticiário da actualidade nacional no semestre seguinte, hoje, decorrido o mesmo, o tempo virtualmente congelou... continuam, como temas em dia, os abusos sexuais na Igreja, o caso das indemnizações ou remunerações na TAP, a contestação dos professores, o encerramento de maternidades, o estado do SNS, a localização do futuro aeroporto de Lisboa (?), as trapalhadas da maioria governante...
No domínio da economia, entre outras recorrências, um tema veio para ficar, verdadeiro ‘Toyota’ da actualidade empresarial: a Sustentabilidade!
Para tal, tem bastado a sua aceitação e utilização sem contestação por parte de empresários, executivos, economistas, até políticos...
O tema está, contudo, longe de ser pacífico!
Logo à partida porque não é, normalmente, ‘à primeira’ que se entende o que se diz ou se escreve sobre o conceito, tornando indispensável a sua contextualização, tamanha é a sua ambiguidade: Sustentabilidade enquanto valor e prática de gestão contributiva para a não degradação do meio físico envolvente ou sustentabilidade enquanto valor e prática de Gestão tendente a assegurar, sem perda para a actividade corrente, a manutenção das condições necessárias à continuidade e sobrevivência da instituição a longo prazo?
Sustentabilidade na perspectiva da sua integração no ecossistema – eventualmente qualificável como ‘sustentabilidade sistémica’...- ou sustentabilidade na perspectiva da consecução de níveis de performance que não comprometam o desenvolvimento futuro da actividade – eventualmente qualificável como ‘sustentabilidade endógena’?
De seguida porque são frequentes, igualmente, as entorses na utilização, quer na linguagem verbal quer escrita, dos qualificativos correspondentes: Sustentável ou sustentado(a)?
Para além disso, porque, em termos conceptuais, sustentabilidade é, na verdade, uma ‘geringonça’ da gestão: É visão? Ou será missão? Talvez valor? Ou objectivo? Porque não estratégia?
Finalmente porque, é discutível a relevância conferida ao conceito... justifica-se? Faz sentido?
De facto, se for questionado, em abstracto, qual a qualidade que se associa mais a sustentabilidade, se ‘estabilidade’ se ‘instabilidade’, a maioria esmagadora das respostas será estabilidade!
Ora, nos dias que correm, face à incerteza, à imprevisibilidade intrínsecas da evolução, recente e perspectivável, do meio envolvente, a qualidade que melhor caracteriza o desenvolvimento da actividade das empresas e outras instituições é, precisamente, o oposto: a instabilidade!
Melhor fora então, a consagração do vocábulo, criado por uma conhecida marca de automóveis há alguns anos, para definir o principal atributo dos seus modelos: a “sustentaGilidade” - no inglês original, ‘sustainagility’ em contraponto a ‘sustainability’... -, no sentido da garantia e manutenção das condições para a adaptação permanente ao imprevisto, mediante o fomento da criatividade e, até mesmo, da capacidade de improvisar!
Sob múltiplas perspectivas, portanto, um conceito ambíguo, difuso, no mínimo, paradoxal...
Como paradoxal é o tempo que passa. Basta comparar a duração dos 5 minutos finais de uma partida de futebol que a nossa equipa está a ganhar por 1-0 e que não pode sequer empatar, com os 5 minutos finais de uma partida que a nossa equipa está a perder por 1-0, necessitando, imperiosamente, de, no mínimo, empatar...
Afinal, quanto tempo tem o tempo?
Afinal, quão sustentável é a sustentabilidade?
Nota: O autor escreve de acordo com a antiga ortografia
Paulo Pardal é professor na Católica Lisbon Business School & Economics
Este espaço de opinião é uma colaboração entre a Renascença e a Católica Lisbon School of Business and Economics