Centenas de professores ameaçam abandonar o ensino no próximo ano letivo
03-01-2024 - 19:46
 • Fátima Casanova

Há um grupo fechado do WhatsApp que reúne docentes que entraram nos quadros ao abrigo da vinculação dinâmica e que não querem dar aulas longe da área de residência. Preferem abandonar o ensino para ficarem perto da família.

No arranque do segundo período de aulas milhares de alunos continuam sem professor, pelo menos, a uma disciplina, mas no futuro a situação poderá ser ainda mais grave. Há centenas de docentes, que entraram nos quadros do ministério da Educação ao abrigo da vinculação dinâmica, que garantem que vão recusar uma colocação longe da área de residência.

De acordo com as regras, no próximo ano letivo os cerca de oito mil professores que entraram nos quadros através da vinculação dinâmica têm de concorrer a todo o país.

Uma situação que para Cristina Mota, da Missão Escola Pública, é “uma ratoeira”, porque no momento da abertura do concurso para vinculação dinâmica “foram divulgadas as vagas num número que justificavam concorrer para ficarem perto da sua área de residência, mas as listas de não colocação na mobilidade interna vieram provar que as vagas anunciadas eram fictícias”.

Face a este cenário e antecipando que não vão conseguir um lugar numa escola perto da área da residência, há centenas de professores que se juntaram num grupo fechado de WhatsApp, segundo revela à Renascença Cristiana Oliveira.

Esta professora de inglês, em Portimão, diz que o grupo já conta “com 850 membros, mas vai sempre crescendo”. Questionada sobre se muitos têm vontade de desvincular caso sejam colocados longe da área de residência, Cristiana Oliveira garante que “todos os que aqui estão é o que vão fazer”. O mesmo fará esta professora, que admite que “não consegue dormir descansada nenhum dia da sua vida” com receio de uma colocação fora do Algarve.

Apesar de estar numa região com falta de docentes, as regras ditam que um colega mais graduado de outro ponto do país, se colocar o Algarve como opção, pode ficar com o seu lugar, por isso, Cristiana Oliveira, que tem um filho de três anos, garante que “se ficar colocada em Beja, Évora, Santarém, tudo por aí acima, é para esquecer”, porque se não ficar no Algarve desvincula-se “imediatamente”.

“Abandonar está em cima da mesa”

Serafim Soares mora em Matosinhos e está a dar aulas de educação física em Vila Nova de Gaia. Admite que, finalmente, encontrou a estabilidade depois de muitas viagens para poder dar aulas.

Desde 2010 já ficou colocado na Guarda, Torres Vedras, Gouveia, Mira, Algarve, Penafiel, Póvoa de Varzim, por isso, “viu a vinculação dinâmica como uma oportunidade de estabilizar”, sabendo que no próximo ano letivo teria de concorrer a todo o país.

Tem esperança que as regras mudem, porque, diz “que é sempre o que está a acontecer”. Caso isso não aconteça, Serafim Soares garante que “a questão de abandonar o ensino, está em cima da mesa”.

Recorda à Renascença o que aconteceu quando ficou colocado em Cascais com um filho de um ano: “dei duas aulas e despedi-me, nem meti baixa, não quis estar lá, não consegui estar lá”.

Não tem receio de mudar de área, porque, diz que desde que tenha “a perspetiva de estabilidade, já aceito fazer seja o que for”.