A comissão independente criada para averiguar denúncias no Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra confirmou, esta quarta-feira, a existência de padrões de conduta de abuso de poder e assédio, por parte de pessoas em posições hierarquicamente superiores. As conclusões do relatório agora divulgado serão enviadas ao Ministério Público (MP).
"Da análise de toda a informação reunida, bem como das versões entre as pessoas denunciantes e pessoas denunciadas que foram compatíveis entre si, indiciam padrões de conduta de abuso de poder e assédio por parte de algumas pessoas que exerciam posições superiores na hierarquia do CES", revela o relatório final da comissão independente, que iniciou funções em agosto do ano passado.
Três investigadoras que passaram pelo CES da Universidade de Coimbra denunciaram situações de assédio num capítulo do livro intitulado "Má conduta sexual na Academia - Para uma Ética de Cuidado na Universidade", o que levou a que os investigadores Boaventura Sousa Santos e Bruno Sena Martins acabassem suspensos de todos os cargos que ocupavam no CES.
O nome de Boaventura Sousa Santos, o diretor emérito do CES e o assistente, Bruno Sena Martins, não são referidos neste relatório.
De acordo com o relatório divulgado, esta quarta feira, à comissão independente foram denunciadas 14 pessoas, por 32 denunciantes, registando-se um total de 20 audições.
Segundo a comissão independente, 78% dos denunciantes são mulheres, 6% são homens e em 16% dos casos não foi possível identificar o sexo devido à denúncia ter sido feita de forma anónima.
Ainda no que toca aos denunciantes, 47% identificaram-se como estudantes de doutoramento no CES, 10% investigadores e 9% investigadores de pós-doutoramento.
"Verificou-se que as versões apresentadas por várias pessoas denunciantes e por várias pessoas denunciadas foram em muitas situações incompatíveis entre si, tornando-se, nessas situações, impraticável aferir evidências das mesmas", refere ainda.
A comissão independente indica que a documentação apresentada e as audições realizadas, tanto de pessoas denunciantes como de pessoas denunciadas, "não permitiram esclarecer indubitavelmente a existência ou não da ocorrência de todas as situações comunicadas", embora indiciem padrões de conduta de abuso de poder e assédio por parte de algumas pessoas que exerciam posições superiores na hierarquia do CES.
O relatório alude ainda ao facto de as várias direções do CES, ao longo dos anos, terem subvalorizado algumas situações com indícios de comportamentos menos próprios nas relações entre membros da sua comunidade.
"As várias direções do CES, ao longo dos anos, pese embora da nossa análise tivessem indícios de situações menos próprias nas relações entre membros da sua comunidade, subvalorizaram-nas e, com isso, podem ter contribuído para a eventual perpetuação das mesmas."
"Verificaram-se indícios de negligência na forma como certas questões foram tratadas por parte de algumas pessoas que ocupavam cargos nos órgãos sociais do CES, bem como de pessoas que estavam hierarquicamente em posições díspares (por exemplo, na relação orientador/a – orientando/a)", sublinha a investigação interna.
O relatório vai ser agora enviado ao Ministério Público. "A comissão independente não pretende, nem poderá substituir as entidades ou autoridades administrativas ou judiciais competentes para a apreciação das condutas que possam constituir infrações disciplinares ou infrações penais", conclui o relatório.
“A nível individual é importante registar que um conjunto de denúncias, e que são indiciadas através do relatório da comissão, podem ter determinado tipo de valor penal que o CES não é a entidade que deve avaliar. Vamos remeter o relatório para o Ministério Público para todos os fins considerados convenientes”, afirmou o presidente do CES, Tiago Santos Pereira, em conferência de imprensa.
[notícia atualizada às 18h50]