Cerca de 200 obras de arte reunidas pelo ex-Banco Português de Negócios (BPN), avaliadas em quatro milhões de euros, continuam sem destino, à espera de uma decisão do Governo, desde a nacionalização daquela instituição bancária, em 2008.
O acervo é gerido pela Parups e pela Parvalorem, empresas criadas em 2010 para gerir os ativos e recuperar os créditos do ex-BPN, e cuja nova administração, liderada por Sofia Torres, iniciou funções na segunda-feira, substituindo o anterior presidente, Francisco Nogueira Leite.
De acordo com os relatórios e contas de 2017 das empresas, publicados este mês, no total, as duas sociedades detêm 196 obras, que estão avaliadas entre 4,1 milhões de euros e 6,1 milhões de euros, sendo 156 obras de artistas nacionais e 40 de artistas estrangeiros, principalmente do século XX.
Segundo os documentos, decorre uma nova avaliação do acervo por uma empresa especializada, e está prevista uma recontagem física das obras, incluindo uma verificação do seu estado de conservação.
Ainda segundo os relatórios, as 40 obras de artistas estrangeiros têm um valor estimado em cerca de um milhão de euros, e as 156 obras de artistas portugueses, em perto de três milhões de euros, para o valor mais baixo do intervalo de avaliação.
A administração anterior fez um depósito de três quadros da pintora Maria Helena Vieira da Silva na Fundação Arpad Szenes-Vieira da Silva.
Excetuando estas peças, o acervo de obras de arte do ex-BPN - que se encontrava anteriormente no cofre da Caixa Geral de Depósitos, na avenida 5 de outubro, em Lisboa, - está guardado, desde dezembro de 2016, a cargo da empresa especializada Iterartis, com um seguro contratado com a multinacional Hiscox.
O que fazer com as obras? Governo ainda não sabe
Em várias ocasiões, a anterior administração solicitou instruções às tutelas da Cultura e das Finanças sobre o destino a dar às obras de arte, a última delas há um ano, sem ter recebido orientações definitivas.
Contactado pela agência Lusa, o gabinete da ministra da Cultura, Graça Fonseca, respondeu que "o destino a dar a essas obras está a ser analisado entre as áreas governativas da Cultura e das Finanças".
No acervo do ex-BPN - de onde saiu a polémica Coleção Miró, que estava para ser vendida no estrangeiro, mas acabou por ficar em Portugal, por decisão do atual Governo - estão obras de artistas consagrados como Paula Rego, Amadeo de Souza-Cardoso, Mário Cesariny, Rui Chafes, Eduardo Batarda e António Dacosta.
João Pedro Vale, Pedro Calapez, Carlos Calvet, Vasco Araújo, Joaquim Rodrigo, Ana Vidigal, Eduardo Nery, João Penalva, Fernando Calhau, João Vieira, Nadir Afonso, Eduardo Batarda, António Sena, José Pedro Croft, Nikias Skapinakis, João Penalva, Pedro Casqueiro, Jorge Martins e Carlos Calvet também estão representados neste acervo.
Em 2015, a então administração das empresas chegou a anunciar publicamente a intenção de colocar estas obras à venda, em leilão, no país, cujo valor a obter deveria servir para abater parte dos créditos do banco, mas a iniciativa acabaria por não se concretizar.
Também chegou a ser negociada, no mesmo ano, a compra de 46 obras de artistas portugueses, avaliadas em cerca de um milhão de euros, pela Secretaria de Estado da Cultura (SEC), liderada, na altura, por Jorge Barreto Xavier, mas essa operação também não chegou a ser efetuada.
No conjunto que a SEC pretendia adquirir, estavam maioritariamente obras – muitas de pintura e algumas esculturas - de artistas portugueses de várias gerações, todos consagrados, como Júlio Pomar, Paula Rego (representada com três obras), Maria Helena Vieira da Silva (com cinco), além de Mário Cesariny, Helena Almeida, José de Guimarães e Julião Sarmento.
Cruzeiro Seixas, Álvaro Lapa, João Cutileiro, João Pedro Vale, Ana Vidigal também estão no conjunto, e artistas estrangeiros, como Antoni Tápies, Arpad Szénes, marido da pintora portuguesa Vieira da Silva, Peter Zimmermann e Sonia Delaunay, e o seu destino seriam museus nacionais.
Miró, um caso de sucesso?
Foi em 2017, depois de um percurso polémico, que a chamada Coleção Miró, com 85 obras, datadas entre 1924 e 1981, acabou por ficar na posse do Estado português, depois de o Governo ter chegado a acordo com a leiloeira Christie's para revogar o contrato de venda em leilão internacional.
Nesta coleção do pintor catalão encontram-se desenhos e outras obras sobre papel, pinturas com suportes distintos, além de seis tapeçarias, uma escultura, colagens, uma obra da série “Telas queimadas”, e várias pinturas murais.
O leilão das obras chegou a ter data marcada por duas vezes, e as obras foram mesmo expostas em Londres, mas a leiloeira Christie's cancelou as operações de venda, devido a uma providência cautelar interposta nos tribunais portugueses pelo Ministério Público para suspensão das deliberações e atos referentes à alienação das obras de Miró.
Na altura, a Christie's previa encaixar acima dos 30 milhões de libras com a venda da coleção num leilão internacional, o que, ao câmbio da época, ascenderia aos 42 milhões de euros.