Divididos na eutanásia; unidos na defesa de mais financiamento para o SNS e na redução de vagas de acesso aos cursos de Medicina; com ideias diversas sobre como reduzir o congestionamento das urgências e o aumento de médicos no interior do país.
A Renascença ouviu os quatro candidatos que se apresentam às eleições para a Ordem dos Médicos, marcadas para quinta-feira.
Os médicos terão de escolher entre Miguel Guimarães (urologista do Hospital de S. João, no Porto, e presidente do Conselho Regional do Norte da Ordem), Álvaro Beleza (socialista e clínico do Hospital de Santa Maria, em Lisboa), Jorge Torgal (ex-presidente do Infarmed), e João França Gouveia (ex-chefe de urgência do Hospital Fernando da Fonseca, na Amadora).
Eutanásia divide
Assumindo que o principal objectivo das suas candidaturas é aproximar os médicos da Ordem, os quatro candidatos a bastonário divergem na questão da eutanásia. Uma petição pela despenalização da eutanásia vai ser debatida na Assembleia da República a 1 de Fevereiro e o Bloco de Esquerda já anunciou a intenção de agendar, em momento posterior, uma iniciativa legislativa sobre a matéria.
Jorge Torgal declara-se defensor da “despenalização da morte assistida”, enquanto os outros três candidatos recusam a ideia.
Os restantes candidatos rejeitam a eutanásia. Álvaro Beleza, que “na qualidade de cidadão” admite “a possibilidade de a pessoa ter o direito ao suicídio digno”, afirma que “a medicina é para salvar vidas e não para ajudar a morrer” e por isso “enquanto bastonário” respeitará “o Código Deontológico da Ordem”.
Miguel Guimarães garante que a morte assistida “é proibida pelo Código Deontológico da Ordem” pelo que “qualquer candidato a bastonário que seja a favor da eutanásia está a cometer um erro grave”.
Jorge Torgal afirma que o facto de ser subscritor do manifesto da despenalização da morte assistida não viola os estatutos da Ordem dos Médicos: “Estamos perante uma questão de cidadania e de defesa da despenalização e não de defesa de qualquer tipo de actividade”.
“Se fosse chamado a exercer a eutanásia evocaria a figura de objector de consciência”, diz, por seu turno, João França Gouveia.
Unidos na defesa de maior financiamento
Todos os candidatos defendem a necessidade de se aumentar o financiamento do Serviço Nacional de Saúde.
Álvaro Beleza promete “auditorias aos serviços de saúde e também às urgências”.
O ex-presidente do Instituto Português do Sangue diz que “tem que haver uma aposta nos cuidados primários e, nomeadamente, um alargamento do horário de atendimento dos centros de saúde e Unidades de Saúde Familiar”.
Estas estruturas “não podem funcionar apenas no horário de expediente dos bancos e do comércio em geral”, diz Beleza. “Têm de funcionar até muito mais tarde, muitas vezes até ao fim-de-semana e os maiores até à noite. E não apenas quando há um surto de gripe”, afirma.
João França Gouveia, que se candidata para “resolver o problema das urgências”, diz que “deve haver equipas fixas nas urgências”.
O candidato sustenta que a Ordem “deve reconhecer a especialidade de medicina de emergência”, dado que sem essa especialidade “não se consegue dar a volta aos serviços de urgência dos hospitais”.
O modelo do Canadá
Para combater o problema da falta de médicos no interior do país, Miguel Guimarães advoga “que se adeque as remunerações às necessidades e se possa dar mais dias de férias aos médicos que trabalham” fora do litoral.
O actual presidente do Conselho Regional do Norte da Ordem alude mesmo à possibilidade de se importar o modelo adoptado pelo Canadá, “com uma redução no pagamento de impostos durante algum tempo”.
Caso contrário, diz Miguel Guimarães, corre-se o risco “de as regiões mais periféricas e com mais dificuldade se afundarem cada vez mais” enquanto se centra “cada vez mais” a saúde nos “grandes hospitais públicos e nos grandes hospitais privados”. Foi, diz, “o que aconteceu com o ministro Paulo Macedo e está a manter-se com o actual ministro da Saúde”.
Jorge Torgal quer os médicos a gerir todas as unidades de saúde e defende, por isso, que “ a Ordem deve liderar a discussão das políticas públicas de saúde” e “ter uma capacidade de diálogo e de proposição junto dos ministros da saúde, de quem deve ser claramente independente”.