Hillary e Trump mais perto de se defrontarem em Novembro
20-04-2016 - 10:27
 • José Alberto Lemos, em Nova Iorque

Não foi exactamente uma surpresa, mas foi uma clarificação na corrida eleitoral pela nomeação do candidato de cada um dos partidos.

Veja também:


As primárias de Nova Iorque, que decorreram esta terça-feira, confirmaram plenamente as sondagens, dando claras vitórias aos líderes das corridas em ambos os partidos. Hillary Clinton e Donald Trump bateram os seus adversários por larga margem, obtendo cerca de 60% dos votos, e consolidando as respectivas posições, talvez de forma definitiva.

A partir desta eleição em Nova Iorque, a expectativa de Bernie Sanders em obter a nomeação do Partido Democrático perdeu credibilidade e o mesmo terá acontecido com Ted Cruz no Partido Republicano, embora em menor dimensão. Hillary Clinton e Donald Trump ficaram ambos mais próximos de serem os dois contendores da eleição geral de Novembro.

Curiosamente, quer a vitória de Hillary quer a de Trump foram obtidas em campanhas mais modestas do que as dos seus adversários. Trump, por exemplo, nem sequer gastou dinheiro em anúncios televisivos, que são a arma mais poderosa e mais cara nas campanhas americanas. Embora tivesse a vantagem de jogar em casa - Trump é nova-iorquino - não há memória nos tempos modernos de alguém ter conduzido uma campanha sem apostar na propaganda televisiva.

Aliás, a campanha republicana em Nova Iorque teve mais originalidades além desta. A mais curiosa foi o facto de nenhum dos candidatos ter feito campanha na cidade de Nova Iorque. Ted Cruz teve uma passagem fugaz pelo bairro de Bronx há mais de uma semana e depois disso limitou-se a fazer campanha na parte rural do estado, não na cidade onde se concentra mais de metade do eleitorado. Dos 27 distritos eleitorais do estado, 17 estão na cidade e em Long Island, um subúrbio próspero.

No entanto, nem Cruz, nem Trump, nem Kasich andaram pela cidade em campanha. Compareceram apenas a um jantar de recolha de fundos num hotel onde estavam escassas centenas de pessoas e alguns milhares de contestatários no exterior. Nesse jantar, de resto, quando Ted Cruz interveio, os comensais conversavam animadamente entre eles de forma ostensiva sem prestar o mínimo de atenção ao seu discurso. Um vídeo do evento tornou-se uma prova algo humilhante para o senador do Texas.

Resposta eloquente

Uma célebre frase de Cruz num dos debates republicanos em que acusou Trump de representar “os valores de Nova Iorque” - expressão usada com uma conotação pejorativa - ter-lhe-á valido o desprezo eleitoral neste estado. Como se sabe, em Nova Iorque, os republicanos são bastante mais moderados do que no resto do país, o que faz deles quase opositores a um senador ultra-conservador, fundador do Tea Party no seio do Partido Republicano, e defensor de valores em clara contradição com o liberalismo reinante na Big Apple.

A resposta foi eloquente: Cruz não chegou sequer aos 15% dos votos, não conquistando um único dos 95 delegados que estavam em jogo no estado, para o que era necessário obter pelo menos 20% dos votos por distrito eleitoral. E ficou em terceiro lugar, atrás de John Kasich, o governador do Ohio, que até hoje só venceu no seu próprio estado. Mesmo com os seus 25% de votos, conquistou apenas três delegados porque Trump ultrapassou os 50% dos votos em quase todos os distritos, arrecadando 92 dos 95 delegados que representarão Nova Iorque na convenção do Partido Republicano, em Julho, em Cleveland.

Com 60% para Trump, 25 % para Kasich e 14% para Cruz, estas primárias de Nova Iorque aumentaram a vantagem do bilionário em relação ao senador do Texas de cerca de 200 para cerca de 300 delegados. Com 847 contra 553 de Cruz, Trump está mais próximo de conquistar os almejados 1237 que lhe garantirão a nomeação de candidato pelo partido às eleições de Novembro. Sobretudo se tivermos em conta que na próxima terça-feira vão a votos alguns outros estados importantes da costa leste, como Pensilvânia, Maryland, Connecticut e Rhode Island, onde as sondagens atribuem a Trump uma vantagem confortável. Se tais previsões se confirmarem, o bilionário liquida praticamente a esperança do establishment republicano e de todos os seus adversários de uma convenção disputada voto a voto, onde essa vantagem poderia ser anulada através da mudança de opinião de muitos delegados.

Sanders fragilizado

No campo democrático, Hillary Clinton consolidou a sua posição de líder da corrida, batendo por 16 pontos percentuais (58% contra 42%) o senador Bernie Sanders. Uma vitória um pouco mais expressiva do que previa a maioria das sondagens. O senador do Vermont, que há várias semanas reclamava ter a dinâmica da campanha a seu favor e que prognosticou uma “surpresa” nestas primárias nova-iorquinas, fica agora em posição matematicamente (quase) impossível de obter a maioria dos delegados do partido na convenção de Filadélfia em Julho.

A pesada derrota que averbou em Nova Iorque, donde é originário e onde fez uma campanha muito mobilizadora, gastando mais dois milhões de dólares do que Clinton, deixa-o em situação fragilizada. Hillary dilatou a vantagem em delegados, que nos democratas são distribuídos proporcionalmente aos votos obtidos, -- 135 contra 104, neste caso -- mas estancou também um ciclo de derrotas eleitorais em estados mais pequenos que alimentava grandes expectativas entre os partidários de Sanders.

Neste momento, a candidata lidera a corrida com uma vantagem de 300 delegados entre os eleitos e com cerca de 700 delegados contando com os chamados super-delegados, membros do partido que exercem cargos dependentes de sufrágio popular.

Clinton conquistou 67% dos votos entre os não-brancos e 60% entre as mulheres, assim como votaram nela 90% dos que lhe creditam a necessária experiência para ser presidente. Estes dados são particularmente cruéis para Sanders, que fez uma forte aposta em Nova Iorque, onde desfrutou de um grande apoio popular evidenciado em alguns comícios com muitos milhares de pessoas. Gente que, contudo, é predominantemente branca, jovem e com níveis educacionais elevados. Nem mesmo o apoio de um activista pela causa dos afro-americanos como o cineasta Spike Lee valeu a Sanders para conquistar o voto negro.

Há, todavia, um aspecto em que a campanha democrática se distinguiu claramente da republicana: andou pela rua, produziu grandes eventos e bateu-se pelos votos porta a porta. Enfrentou o terreno que, obviamente, lhe era mais favorável do que para os republicanos. Se as ruas de Manhattan fossem uma amostra representativa do eleitorado dir-se-ia que o senador Sanders ganharia facilmente estas primárias.

Mas, como esta eleição mais uma vez provou, as aparências iludem.