A Associação de Cidadãos Auto-Mobilizados (ACA-M), assistente no processo do atropelamento mortal de um trabalhador na A6, quer responsabilizar o ex-ministro Eduardo Cabrita, considerando que, por omissão, cometeu um crime de homicídio por negligência.
A associação, cujo pedido de constituição como assistente foi deferido na segunda-feira, entregou hoje um requerimento de intervenção hierárquica, ao magistrado do Ministério Público coordenador da comarca de Évora, para tentar responsabilizar o ex-ministro.
No requerimento, ao qual a agência Lusa teve acesso, o advogado da ACA-M, Paulo Graça, considera que deve ser deduzida acusação penal contra o antigo ministro da Administração Interna "pela prática, em autoria paralela e por omissão, do crime de homicídio por negligência".
Cabrita, como superior hierárquico de Marco Pontes, o motorista que conduzia o automóvel em que seguia e que atropelou mortalmente o trabalhador Nuno Santos na Autoestrada 6 (A6), tinha "poder legal para lhe dar ordens e instruções e exigir obediência às mesmas", pode ler-se.
Mas, no dia do acidente, ocorrido a 18 de junho de 2021, na A6, entre Estremoz e Évora, o ex-ministro "omitiu dar-lhe ordens ou instruções", que tinha também "o dever legal de dar", para "adequar a velocidade da viatura às condições da via e para circular pela via da direita".
Cabrita, contudo, não pode "alhear-se da forma concreta como Marco Pontes conduzia" o automóvel, afirma o advogado.
"Com tal omissão, que é ilícita, quer por violar as disposições legais", quer "por ter criado um risco acrescido para a vida e integridade física dos trabalhadores" que se encontravam na A6, Eduardo Cabrita "violou o dever de garante que sobre si impedia", diz, no requerimento.
E essa "omissão ilícita" foi "causa direta e necessária do embate da viatura em Nuno Santos e do óbito deste", considera Paulo Graça.
No pedido, o advogado lembra que a magistrada do Ministério Público responsável pelo inquérito só deduziu acusação contra o motorista, pela prática de um crime de homicídio por negligência e duas contraordenações.
"Não só não constituiu arguido senão este, como não lavrou despacho de arquivamento relativamente a mais ninguém", afirma.
De seguida, Paulo Graça apresenta jurisprudência do Tribunal da Relação de Évora para justificar o recurso à reclamação hierárquica, a via que resta a um assistente quando pretende o "apuramento de responsabilidades de quem não tenha sido devidamente investigado", uma vez que, neste caso, não pode pedir a abertura de instrução para responsabilizar Cabrita.
O ex-ministro "foi apenas inquirido como testemunha", não se "tendo em nenhum momento cogitado a possibilidade de o inquérito seguir tendo em vista o apuramento da sua responsabilidade criminal", afirma.
E não foi "lavrado despacho de arquivamento dos autos" contra o ex-ministro "que permitisse ao assistente suscitar o respetivo controlo por via de requerimento de abertura de instrução", diz o advogado.
O requerimento de intervenção hierárquica é, por isso, o meio "próprio para lograr" que seja deduzida "acusação contra Eduardo Cabrita", segundo Paulo Graça, considerando que "os autos contêm matéria" que permite acusar o ex-governante "pelo crime de homicídio por negligência cometido por omissão".
Paralelamente à intervenção hierárquica, o advogado da ACA-M requereu, na semana passada, ao juiz de instrução criminal titular do processo que a acusação a Marco Pontes considere que o automóvel por si conduzido seguia, não a 166 quilómetros por hora, como disse o MP no despacho de acusação, mas a "mais de 180 quilómetros/hora".
No dia 03 de dezembro de 2021, o MP revelou ter deduzido acusação contra o motorista de Eduardo Cabrita, que, nesse mesmo dia, se demitiu, tendo, entretanto, no início de janeiro, o advogado da família do trabalhador que morreu no acidente adiantado que requereu a abertura de instrução do processo, para "conseguir a pronúncia da responsabilidade criminal" do ex-ministro.