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Reduzir ou isentar. As posições variam, mas os autarcas das oito principais câmaras municipais afectadas pelos incêndios de Junho e Outubro concordam num ponto: é essencial avançar com medidas que baixem as taxas pagas por casas “que já não existem”.
É uma questão de justiça para com quem perdeu quase tudo e também de facilitar a recuperação de pessoas e territórios, dizem as autarquias, contactadas pela Renascença.
A esquerda rejeitou uma proposta dos sociais-democratas que isentaria do Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) as casas afectadas pelos fogos. A maioria parlamentar argumenta que decisões em matéria de IMI são competência dos municípios e não da Assembleia da República.
Porém, para o fiscalista Tiago Caiado Guerreiro, é o Governo que legisla e por isso é dele a responsabilidade de acrescentar ao código do IMI (que é cobrado pelas Finanças e depois devolvido aos municípios) uma alínea que permita decretar a isenção a nível autárquico.
Eventuais isenções
decididas pelas autarquias decorrem de uma “interpretação muito extensiva da
lei”, considera o fiscalista, até porque a legislação “não é suficientemente
clara nesse sentido”. Uma tese que parece ser confirmada pelas interpretações diversas recolhidas pela
Renascença junto dos autarcas.
PEDRÓGÃO GRANDE
O concelho tem mais de 300 imóveis que foram afectados pelas chamas, segundo o presidente da câmara, Valdemar Alves. O número inclui casas “de primeira e segunda habitação e outros imóveis. São bastantes, infelizmente”, contabiliza.
Sobre a cobrança do IMI, o autarca socialista relembrou que “a câmara municipal não tem autonomia” para decretar isenções. O que pode fazer é encontrar formas alternativas de apoiar os munícipes. Face aos constrangimentos legais, o município de Pedrógão Grande vai tomar duas medidas: reduzir e compensar. “Temos autonomia para reduzir o valor do IMI ao mínimo dos mínimos, que é isso que vamos fazer [0,30% do valor patrimonial tributário do imóvel]”, explica Valdemar Alves.
A segunda medida de apoio é “compensar as pessoas com o IRS” que vai ser devolvido na sua totalidade. É a “única maneira dentro da legalidade de podermos ajudar as pessoas e foi por esse princípio que nos norteamos na última reunião de câmara”, declara o autarca.
O Imposto Municipal sobre Imóveis é uma das principais fontes de receita para as autarquias, mas o presidente de Pedrogão admite que o cálculo relativo ao peso que terá nas finanças da câmara ainda não está feito, "até porque não é isso que está em causa".
"Atendendo ao assunto que é, não é nosso princípio estarmos a discutir uma coisa dessas. Se é para ajudar, não há discussão. É preferível o município ficar efectivamente prejudicado quanto ao recebimento desse IMI, de umas casas que infelizmente não existem", afirma Valdemar Alves.
CASTANHEIRA DE PERA
O município reduziu a taxa de IMI em Setembro, antes das eleições autárquicas e antes de a actual presidente da câmara, Alda Correia, ter tomado posse. "Foi uma redução para a taxa mínima de 0,30% [sobre o valor patrimonial do imóvel] para todos os municípios do concelho”, explica.
Apesar de não ter sido uma decisão do seu executivo, a autarca do PSD considera que é despropositado reverter, até porque “faria todo o sentido, que, pelo menos enquanto as pessoas estão impossibilitadas de estar na habitação própria, houvesse efectivamente alguma isenção”.
Em Castanheira de Pera foram destruídas pelo fogo "17 casas de primeira habitação de um total de 66 casas afectadas". Apesar de concordar como a taxa mínima, Alda Correia reconhece o impacto financeiro que terá na receita da autarquia. “Representa quase 50% daquilo que era reembolsado ao município”, admite. Antes dos incêndios, a câmara aplicava o valor máximo do IMI [taxa de 0,45% do valor patrimonial do imóvel] e neste momento reduziu para o mínimo”, explica.
O anterior executivo aplicou a taxa mais alta “durante alguns anos” e agora “faz sentido alguma redução”, considera Alda Correia. “Se foi uma decisão correcta ou não, não posso avaliar porque não foi tomada pelo executivo que se encontra agora em funções”, conclui.
GÓIS
Está em marcha um plano de redução do Imposto Municipal sobre Imóveis nas duas freguesias do concelho de Góis mais fustigadas pelos incêndios: "a freguesia de Alvares, que sofreu muito como o incêndio de Junho, e a União de Freguesias de Cadafaz e Colmeal, que está praticamente devastada pelo incêndio de 15 de Outubro”, diz a presidente da câmara, Maria de Lurdes Castanheira.
Para a autarca socialista, isentar de IMI os proprietários afectados pelos fogos não é uma "política muito correcta e pode ser uma discriminação, não pela positiva, mas pela negativa. Porque Góis já teve vários incêndios nestes últimos 20 anos e algumas pessoas que viram o seu património destruído, não tanto com a gravidade que foi este ano, não tiveram qualquer apoio nem qualquer benefício”.
Em Góis, para já, a palavra de ordem é reduzir. E “nunca pode ser menos de três a cinco anos porque se for um período inferior a este, pelo menos cinco anos, temos de reconhecer que não tem grande impacto”, diz Maria de Lurdes Castanheira.
A autarca reconhece que o “IMI constitui-se como uma das primeiras receitas do nosso orçamento”, mas mesmo assim, no futuro, a decisão pode vir a sofrer alterações.
“Não significa que, depois de ver as habitações recuperadas, não possamos equacionar a possibilidade de uma isenção para as pessoas que tiveram maiores prejuízos. Significa que, para além de uma redução que é abrangente e que emana da lei, podemos equacionar, em 2018, a isenção para o conjunto das pessoas que perderam as suas habitações”, diz.
FIGUEIRÓ DOS VINHOS
A primeira coisa que está a ser feita é a avaliação de quantas pessoas efectivamente pagavam IMI. Só depois será tomada uma decisão sobre a cobrança do imposto. Para o presidente da câmara, Jorge Abreu (PS), “é preciso ver se as pessoas pagavam sequer IMI, seja por baixos rendimentos ou pelo valor patrimonial do imóvel”.
Se houver pessoas afectadas que tenham que pagar IMI, o presidente garante que a câmara “não vai ficar de fora”. “Reconhecemos que há aqui um apoio que deve ser dado a essas famílias e a câmara cá estará para analisar caso a caso, com essa perspectiva”, diz o autarca.
No concelho, o fogo queimou mais mato e floresta do que casas. “De primeira habitação estamos a falar de mais ou menos 30” e, por isso mesmo, Jorge Abreu reconhece que o valor em causa é “pouco significativo” para as contas do município.
SERTÃ
A isenção do IMI é uma das ideias que está em cima da mesa da Assembleia Municipal, embora a autarquia ainda não tenha tomado nenhuma decisão em concreto. A medida pode ser aprovada "dentro de um mês", diz o presidente da câmara.
José Farinha Nunes, do PSD, diz que é uma ideia “que faz sentido”. “Ainda não tomámos essa decisão, mas eu concordo que se isente. Vamos ver por que período”, considera o autarca.
Prevê que “várias centenas de imóveis” sejam abrangidos por uma futura determinação camarária. No entanto, a autarquia ainda não sabe o impacto que a medida poderá vir a ter nas contas. “Esse cálculo não está feito, mas esse ensaio tem de ser feito, dentro de um mês esse assunto estará definido."
OLIVEIRA DO HOSPITAL
O presidente da câmara, José Carlos Alexandrino, diz à Renascença que o concelho foi o mais atingido pelos incêndios de Outubro. De primeira habitação foram afectadas “perto de 200 casas". Houve também um "um número bastante grande, que ultrapassa as 400”, de segundas habitações afectadas, contabiliza o autarca.
O presidente da câmara socialista considera de “elementar justiça” apoiar as pessoas que viram as casas destruídas pelo fogo, mas “a proposta do PSD choca com as competências das câmaras municipais e das assembleias municipais”. “Quem tem competência para fazer a isenção do IMI não é o Governo, porque isso está dentro do poder de autonomia autárquico”, relembra.
Em Oliveira do Hospital, a câmara está “a pensar propor a isenção sobretudo das habitações que arderam. Percebemos que muitas destas pessoas têm dificuldades, ficaram sem nada. Ficaram sem casas e agora ainda teriam que pagar o IMI”, diz o presidente.
Há muitas casas destruídas e uma eventual isenção de IMI vai implicar menos dinheiro da autarquia, “mais de 200 mil euros", nas contas de José Carlos Alexandrino, "uma receita importante".
A ideia é aliviar o imposto a todos os proprietários – sejam de primeira ou segunda habitação. Para o autarca, “a isenção deve vigorar sobretudo enquanto as casas não estiverem reerguidas totalmente. Nós teremos uma perspectiva de isenção pelo menos durante dois anos a três anos que será suficiente, até as pessoas voltarem a ter os seus recursos materiais para poderem voltar a ter uma vida normal.”
PAMPILHOSA DA SERRA
A autarquia decidiu que “todos os prédios urbanos afectos ao comércio e à indústria ficarão isentos de IMI três anos após a recuperação”. O presidente da câmara, José Brito (PSD), fala em “justiça” para com os lesados e também porque a vantagem pode funcionar como um incentivo para os proprietários de segundas habitações.
“É fundamental motivarmos a reconstrução num território como o nosso, caso contrário ele ficará cada vez mais desertificado”, diz. Em relação aos prejuízos, houve "36 empresas e 501 habitações" atingidas, "mas é evidente que não são todas de perda total. Temos uma grande parte que é perda total, mais de 200, mas todas as outras são pequenos danos.”
O pagamento do imposto só voltará a ser instituído após a recuperação do imóvel porque “enquanto está destruído, não existe IMI, não há prédio. Até porque é declarada a sua destruição, impossibilidade de uso e, portanto, isso é claro. Não tenho dúvidas”, conclui Jorge Brito.
VISEU
O presidente da câmara, António Almeida Henriques (PSD), também afirmou à Renascença que “é uma questão de elementar justiça isentar as pessoas que viram os seus imóveis destruídos, fábricas ou outro tipo de imóveis que estejam sujeitos a IMI”.
O autarca considera “anormal não ter havido entendimento [no Parlamento] sobre esta matéria”. Almeida Henriques recorda que “não há impostos municipais, os impostos são nacionais” e, apesar de o Imposto Municipal sobre Imóveis reverter depois para as câmaras, a margem de autonomia neste caso é escassa.
“Temos a liberdade de fixar a taxa e minorar e majorar imóveis degradados ou não” e pouco mais. Porque “não temos um poder específico para levar às assembleias municipais uma resolução que permita fazer uma isenção de IMI durante ‘x’ anos a pessoas nestas circunstâncias”.
Almeida Henriques diz que “falta enquadramento legal para que os municípios o possam fazer de forma automática”. O município de Viseu não tem tantos imóveis destruídos pelo fogo como os concelhos vizinhos e, por isso, “o problema não se põe como noutros sítios”. No entanto, o autarca frisa que é difícil encontrar o enquadramento legal que permita fazer isenções ou reduções de IMI, “de uma forma genérica para que as Finanças possam ter essa informação”.