Mário Centeno disse, esta quarta-feira, no Parlamento, que não fazem sentido os ataques de que tem sido alvo e que lhe apontam conflitos de interesse vários para assumir o lugar de governador do Banco de Portugal. Novo Banco, Caixa Geral de Depósitos ou Banif são alguns desses dossiês que geram polémica. Sobre esses assuntos, afirmou que apesar de ter estado envolvido nos processos, não esteve na tomada de decisão direta. E disse que se assim fosse "não conseguia encontrar emprego em Portugal nas próximas décadas".
O ex-ministro das Finanças está a ser ouvido no parlamento a propósito da sua designação pelo Governo para governador do Banco de Portugal, sucedendo a Carlos Costa, que está em funções há 10 anos.
A audição, que arrancou pelas 9h00 na Comissão de Orçamento e Finanças, é obrigatória antes de ser nomeado governador do banco central.
Centeno disse aos deputados que as questões de conflito de interesse como as que lhe estão a ser colocadas não acontecem noutras regiões do euro.
Na intervenção inicial, antes das questões dos deputados, Mário Centeno respondeu a algumas críticas sobre a alegada falta de independência que terá enquanto governador perante o poder político, dada a passagem direta do ministério das Finanças para o Banco de Portugal.
“A independência não é outorgada, é conquistada na ação”, sublinhou. “A independência do Banco de Portugal não se questiona nem se impõe”, acrescentou, ao mesmo tempo que disse que espera que no seu mandato a instituição não seja uma "torre de marfim" e que o trabalho que ali será feito tenha a participação dos portugueses.
Nessa altura foram notórios os remoques ao antigo governador Carlos Costa. "O Banco de Portugal deve voltar a ser uma instituição de referência em Portugal e na Europa”, defendeu. "O papel do Banco de Portugal não se deve caracterizar por antagonismos", acrescentou.
Elencou ainda aqueles que serão os pilares da sua ação enquanto Governador: a supervisão exigente e eficiente; a participação na condução da política monetária; a definição da política macroprudencial que evite a transmissão de riscos no sector bancário; e a credibilização do sector para a estabilidade financeira.
Numa fase posterior começaram as intervenções dos partidos, qprimeiro do PS, através do deputado Fernando Anastácio que argumentou que esta audição tem de se focar no "mérito" do candidato e no que quer fazer à frente do Banco de Portugal, nomeadamente sobre o eurosistema, e não "outra coisa qualquer"
"O currículo é à prova de bala", disse Anástácio.
Em relação a uma possibilidade de intromissão no trabalho do gabinete de estudos do Banco de Portugal, onde trabalhou antes de ingressar no Governo, Centeno disse que o seu trajecto recente, "mostra como consegui ancorar a minha sensibilidade política na minha capacidade técnica".
Estas palavras não convencem o PSD, que através do deputado Duarte Pacheco rebateu: "O PSD é contra a sua nomeação para o cargo de governador do BdP. Entendemos que não preenche as condições para exercer com independência e credibilidade o cargo de governador do Banco de Portugal".
De seguida, Centeno defendeu novamente que a sua saída do Governo já estava cabalmente explicada e que foi motivada pelo cansaço que o cargo cria. “É por isso que mais nenhum ministro das finanças até hoje na democracia teve este tempo com legislaturas completas como ministro das finanças”, reiterou.
Regressando ao tema dos conflitos de interesse, Centeno falou de cada um. Afirmou ter recebido um país em que três quartos do sistema financeiro estava "incapacitado de agir ou à beira de resolução".
Em relação à venda do Novo Banco, disse que esta foi feita pelo Fundo de Resolução, que é do Banco de Portugal, e não do Ministério das Finanças. Em relação à Caixa Geral de Depósitos explicou que agiu enquanto acionista, "e o Ministério das Finanças atua em nome de todos os portugueses".
Já em relação ao Banif explicou que o mesmo foi resolvido pelo Fundo de Resolução, "não foi o Governo". "Há uma total independência dentro do BdP nas suas funções segregadas”, afiançou.
O Bloco de Esquerda, através da deputada Mariana Mortágua, não apostou na tónica do conflito de interesses. Disse que a nomeação tem de ser colocada sob o prisma do conflito de interesses. Mortágua defendeu que Centeno não deve ser governador por causa dos conflitos de interesse, mas devido às ações que tomou enquanto ministro das Finanças.
A deputada bloquista acusou ainda Centeno de ter "recuado" na reforça da supervisão "porque tocava na relação de poderes do Banco de Portugal" e de confundir "o interesse público e o interesse particular".
Já a deputada do CDS, Cecília Meireles pegou nas palavras de Centeno que falou de “desgaste” que foi alegado para a saída das Finanças, e disse que o Banco de Portugal não é o melhor sítio para “relaxar” ou para “descansar”. O antigo ministro sentiu a farpa e disse que não saiu do Terreiro do Paço por medo de "enfrentar dificuldades políticas".