Os líderes parlamentares do PS e do BE trocaram acusações esta quarta-feira quanto às responsabilidades da atual situação política, com Pedro Filipe Soares a responsabilizar o Governo pela falta de diálogo, e Ana Catarina Mendes a acusá-lo de "inverdades".
Naquele que foi o debate mais aceso até agora entre os líderes parlamentares do BE e do PS, o bloquista Pedro Filipe Soares começou por recordar que, em 2015, no início do primeiro mandato do Governo de António Costa, houve "uma negociação que durou semanas, quase dois meses", entre o executivo e os partidos à esquerda, de onde "saíram documentos escritos que comprometiam o Governo e os grupos parlamentares de partidos à esquerda do PS por medidas a implementar ao longo de vários anos".
"Desse processo resultou um diálogo permanente. Não estou a exagerar quando digo que tínhamos reuniões semanais em todas essas sessões legislativas para avaliar as propostas do grupo parlamentar do Bloco, propostas de outros grupos parlamentares, propostas de lei do Governo, vontade de cada uma das partes em cada um dos debates que estavam em cima da mesa", indicou.
Em contraponto, Pedro Filipe Soares referiu que, após as eleições legislativas de 2019, "tudo mudou": "o Governo deixou de querer ter um acordo escrito que fosse identificador de um rumo para o país e preferiu uma negociação pontual, medida a medida, ponto a ponto".
Segundo o deputado bloquista, após 2019, as "reuniões semanais deixaram de existir e o diálogo com a esquerda ficou apenas e só reduzido ao debate orçamental", mostrando-se "admirado" que, agora, António Costa tenha pedido que os parceiros à esquerda separassem o debate orçamental dos restantes assuntos, quando "foi exatamente o primeiro-ministro que disse à esquerda que a única coisa que queria dialogar com ela era o Orçamento do Estado".
"Eu creio que a pergunta é esta: o povo de esquerda, o povo do nosso país percebe que se crie uma crise polítca porque não se quer responder a pensões, a trabalho digno, a um SNS de qualidade? Eu creio que a resposta é clara e inequívoca: não percebe. Infelizmente, parece que apenas o Governo, apenas o PS e apenas o senhor primeiro-ministro não percebem a resposta do nosso povo", indicou.
Na resposta, a líder parlamentar do PS, Ana Catarina Mendes, acusou Pedro Filipe Soares de "falsear a verdade", referindo perceber o "incómodo" por, no dia da votação da proposta orçamental, o BE "não saber o que dizer aos portugueses que confiaram em 2019 num Governo liderado pelo PS com o apoio à esquerda".
Reconhecendo, como avançou o deputado bloquista, que "houve muito diálogo promovido pelo PS" e pelo Governo durante o primeiro mandato de António Costa, a líder parlamentar socialista adiantou que, também nesta legislatura, houve "muito diálogo".
"E os primeiros que quebraram essa vontade de diálogo foram os senhores, com uma página A4, que impediram que houvesse um acordo escrito. Foram os senhores, porque sabiam que o que estavam a pedir ao Governo do PS não era um acordo, era uma encenação", indicou.
Ana Catarina Mendes acusou ainda o BE de ter defraudado os "eleitores que confiaram numa maioria de esquerda, quando o ano passado votaram contra o Orçamento do Estado, mesmo com propostas dialogadas e inscritas pelo BE".
"Não basta dizer que é de esquerda, encher a boca com a esquerda, encher a boca com o povo, quando votam contra o melhor Orçamento para o povo e um orçamento de esquerda", exclamou.
Em resposta, Pedro Filipe Soares afirmou que a postura do PS, que considera que mostrar um documento durante as negociações é um "ultraje", mostra "mais da arrogância do lado de lá do que da forma de estar do Bloco de Esquerda", reiterando que, durante a primeira legislatura, apesar de os parceiros não concordarem em tudo, "havia um diálogo construtivo, não havia uma resposta" como a atual.
"Essa sobranceria, essa arrogância de tratar o BE, mas acima de tudo essa forma de tratar o país, mostra bem como o diálogo que era base, o cimento da geringonça, foi a primeira coisa a ruir, e isso foi por vontade do Governo, foi por vontade do PS", acusou o deputado.