Sem política pura, sem ideologia à vista, mas com muitas emoções à mistura, gritos, pedidos de calma e até proclamações de amor ao Livre. Pode resumir-se assim o primeiro dia de Congresso do partido que está a decorrer em Lisboa e com uma manhã que assumiu um ritmo vertiginoso, de intervenções e votações de braço no ar.
Joacine Katar Moreira foi direta ao assunto. A actual direção do partido quer que a deputada renuncie ao mandato, pois ela não lhes faz a vontade em nome "das pessoas que votaram" no partido.
A assembleia, órgão máximo do Livre entre congressos, insiste na decisão e Joacine intervém e grita aos dirigentes "que isto é inadmíssivel, é mentira, mentira", atirando um "tenham "vergonha", apontando muitas vezes para os elementos da direcção sentados à frente do palco do Centro Cívico Edmundo Pedro, em Alvalade.
A isto juntou-se uma outra frase da deputada. Se a querem substituir no parlamento, Joacine lamenta, mas "elegeram uma mulher que gagueja muito bem, que nunca escondeu isso, elegeram uma mulher negra, que foi útil para a subvenção", arrancando muitas palmas nesta parte do discurso improvisado.
Foi o burburinho total na sala, a mesa do congresso a pedir calma à deputada, com os trabalhos a serem interrompidos para uma pausa de cinco minutos "até para ir à casa de banho".
As coisas acalmaram, de facto, mas depois sucederam-se as intervenções de dirigentes do Livre e de militantes de base que se inscreveram para tomar partido. Ou a favor ou contra Joacine. Ao longo deste período foi evidente a divisão entre os militantes.
A dirigente da Assembleia, Bárbara Tengarrinha foi sibilina ao dizer que "há casos em que a melhor terapia de casal é o divórcio", apoiando uma rutura entre o Livre e a deputada.
Renunciar ao mandato de deputada? Sim, "já devia ter renunciado" e devia ter sido "imediatamente", defendeu o militante Ricardo Dias, acrescentando que "trata-se da imagem da Assembleia da República", concluindo que "ela", ou seja, Joacine, "nunca foi independente do Livre", nem "consegue agregar o partido em torno de si".
Outros militantes pediram que "não se faça deste congresso um tribunal", o dirigente da assembleia Jorge Gravanita pediu que não seja usada a "arma atómica", ou seja, a retirada da confiança política à deputada, justificando que se trata de "um grave erro político e ético".
Joacine Katar Moreira não mais usou da palavra na tribuna e esteve sempre sentada a ouvir estas intervenções, a meio de uma sala à pinha e com muitos intervenientes a queixarem-se que nunca tiveram um congresso com tantos jornalistas a acompanhar os trabalhos.
Ao final da manhã, já perto do almoço, decorreram as votações, confusão total, contagem cabeça a cabeça, com pedidos permanentes de "mantenham os votos no ar" e os militantes a manter os braços ao alto com as cartolinas verdes com a papoila vermelha que é o símbolo do partido.
No final da votação, em que o que estava em causa era atirar ou não para depois do congresso a decisão de retirar a confiança política a Joacine, os militantes decidiram não decidir. Por apenas dois votos de diferença o congresso deixou para a próxima direção do partido a batata quente sobre o que fazer.
O que também dá um balão de oxigénio à deputada e a mantém em jogo - não se sabe é por quanto tempo.