O coletivo de juízes que julga o processo Hells Angels decretou a libertação dos arguidos que estavam sob prisão domiciliária pela aparente impossibilidade de terminar o julgamento até ao final do prazo da medida de coação.
De acordo com o despacho do tribunal a que a Lusa teve acesso, assinado pela juíza presidente Sara Pina Cabral, "não se vislumbra como possível que o julgamento em primeira instância alcance o seu "terminus" dentro do prazo máximo legalmente estabelecido para a vigência das aludidas medidas de coação".
Por considerar que ainda existe "o alarme social associado à gravidade dos factos e o concreto perigo de continuação de atividade criminosa", o tribunal decidiu aplicar a estes arguidos a obrigação de apresentação periódica semanal no órgão de polícia criminal das respetivas residências, à exceção de dois arguidos que vivem no estrangeiro e de outro que está sob obrigação de permanência na habitação com vigilância eletrónica por um outro processo.
A revogação das medidas de coação até agora em vigor para estes arguidos abrange, além da prisão domiciliária, a proibição de se ausentarem para o estrangeiro sem autorização do tribunal, de contactos entre si ou por interposta pessoa, de contactos com assistentes, ofendidos ou testemunhas e de se deslocarem e permanecerem em locais de concentrações de "motards".
Os 88 arguidos do processo do grupo "motard" Hells Angels estão acusados de crimes graves, incluindo associação criminosa, depois de o Tribunal Central de Instrução Criminal ter decidido em outubro de 2020 pronunciar todos os arguidos "nos exatos termos da acusação", sendo que agravou a medida de coação imposta a muitos dos arguidos, colocando vários deles em prisão domiciliária.
Para o juiz de instrução Carlos Alexandre, face aos indícios analisados, "este conjunto de elementos assim agrupados não é um simples clube recreativo "motard", mas um conjunto de pessoas que se organizam em moldes paramilitares ou semelhantes ao modo de atuação de uma milícia".
Nas alegações do debate instrutório, o Ministério Público pediu a ida a julgamento de todos os arguidos, sustentando que todos praticaram os crimes que constam na acusação, nomeadamente extorsão e posse de arma proibida, designadamente soqueiras, mocas e bastões extensíveis.
O MP deu como provado, entre outros factos, o ataque perpetrado pelos arguidos e membros do grupo Hells Angels no restaurante Mesa do Prior, no Prior Velho, bem como a perseguição movida por estes a Mário Machado, líder do movimento de extrema-direita Nova Ordem Social e que pertencia a um grupo "motard" rival.
A acusação do MP considerou que aqueles membros do grupo "motard" elaboraram um plano para aniquilar um grupo rival, em março de 2018, com recurso à força física e a várias armas para lhes causar graves ferimentos, "se necessário até a morte".
Os arguidos estão acusados associação criminosa, tentativa de homicídio qualificado agravado pelo uso de arma, ofensa à integridade física, extorsão, roubo, tráfico de droga e posse de armas e munições, entre outros ilícitos.