Passado aquele início de discurso de vitória que lhe é tão característico, carregando no azedume pelas estruturas do PSD, aconselhando-as a ligarem-se "mais aos militantes", depois disso, Rui Rio mostrou mais uma vez aquela pressa pelas legislativas que marcou boa parte das suas intervenções na campanha interna para estas directas contra Paulo Rangel.
As directas já estão, "ponto final parágrafo", siga para a campanha eleitoral e para 30 de janeiro. Avista-se agora um interminável jogo de relações. Desde logo com o próprio PSD. Que partido vai levar Rio para esta campanha e em que estado? Rio reconheceu no discurso de vitória que sozinho não consegue, mas à "unidade" pedida pelo derrotado Rangel, o líder reeleito respondeu que "só se consegue fazer unidade com quem está disponível". Electrizado o partido está, resta saber em que sentido.
Como reconheceu o próprio Rangel, "este processo eleitoral interno reforçou a legitimidade do líder do PSD" e isso implica por em marcha aquilo que Rio foi dizendo ao longo dos últimos meses, por exemplo, clarificar rapidamente a relação com o CDS para as legislativas de janeiro.
O líder centrista Francisco Rodrigues dos Santos é, de resto, dos que, claramente, ganhou com a vitória de Rui Rio este sábado, sabendo que é vontade deste em levar à comissão política nacional a proposta de um acordo pré-eleitoral com o CDS, tal como o presidente social-democrata garantiu na entrevista à Renascença.
E se estamos a falar de gente que ganhou nestas directas do PSD, no pólo oposto podemos colocar o Presidente da República, que em pleno debate do Orçamento do Estado no Parlamento fez questão de receber Paulo Rangel numa audiência "de cortesia", que decorreu, segundo Marcelo Rebelo de Sousa, a pedido do candidato à liderança do PSD.
O resultado deste sábado só pode ser lido como um balde de água fria para Marcelo e uma verdadeira bofetada de luva branca que só dá azo a uma expectativa sibilina, para quem assiste de fora, pelo encontro protocolar entre Rio e Marcelo que deverá ocorrer em breve com a reeleição do líder do PSD.
Com uma certa azia terá ficado também André Ventura, líder do Chega, que em pleno congresso de Viseu assistiu ao resultado destas directas e não demorou a reagir dizendo que esta foi "uma noite feliz para António Costa, com Rio ficamos mais perto de um bloco central".
Sobre o partido de Ventura o líder do PSD foi evoluindo ao longo do tempo. Rio já não admite que o Chega se modere para poderem conversar e agora está definitivamente arredado da equação no caso de o PSD alcançar uma maioria nas próximas legislativas. Muito mais depressa Rio conversa com a Iniciativa Liberal, resta saber com que resultado sai das eleições o partido liderado por Cotrim Figueiredo.
Sobra a relação talvez mais importante neste quadro político. A de Rio com o PS de António Costa. Durante a campanha para as directas o líder social democrata foi repetindo que se não vencer as legislativas está disponível para viabilizar um governo socialista por meia legislatura.
Agora, voltamos ao início. E se o PSD e o eleitorado de centro se electrizarem, de facto? E se estiverem todos "picados", usando uma expressão popular que Rio tanto gosta de usar?
E se depois do resultado das directas for mesmo possível ao PSD de Rui Rio ganhar as eleições legislativas com a estratégia da "oposição construtiva" ao longo de quatro anos e colher fruto disso e do desgaste do governo de António Costa? E se Rio teve razão desde o início?
Em 2018, numa das primeiras reuniões que teve com o grupo parlamentar social democrata, Rio disse essa frase sulfurosa de que "não se ganham eleições, as eleições perdem-se". Ponto final, parágrafo?