Referendo manchado de sangue
A menos de uma semana do referendo sobre a permanência na União Europeia, os ministros das Finanças dos 28 olham o dia seguinte com preocupação. As mais recentes sondagens revelam uma ligeira inclinação dos britânicos para saírem da União Europeia. Mas Bruxelas avisa: não há um plano B caso se confirme o cenário de um Brexit.
“Claro que estamos preocupados. Estamos a seguir de perto, considerando os possíveis cenários. Já me perguntaram se há um Plano B. Não, não há nenhum Plano B. Precisamos de mudar os nossos planos em termos de estabilidade financeira ou de política orçamental? Não. Acho que temos uma forte configuração, estamos numa situação melhor de que há anos atrás”, afirmou Joren Dijsselbloem.
Não estava na agenda do encontro do Eurogrupo, ontem. Mas o assunto fez parte das conversas e das declarações dos ministros aos jornalistas. Num ambiente de consternação pelo assassinato de uma deputada britânica, muitos ministros mostraram-se reservados e prudentes sobre as consequências económicas e financeiras, no caso de vitória do “Não” à Europa. O francês Michel Sapin garante que esse cenário vai ter consequências para todos: “A saída do Reino Unido da União Europeia seria, antes de tudo, um drama para a Grã Bretanha. Seria uma dificuldade para a Europa, para nós, mas seria sobretudo um drama para a Grã Bretanha”.
Já o comissário britânico, responsável pelos Serviços Financeiros, defende que é melhor para o Reino Unido e para os parceiros se o país ficar na União Europeia: “É sempre mais aconselhável centrarmo-nos na primeira ponte que temos de atravessar que é o referendo, antes especular com o que se vai passar a seguir. Do meu ponto de vista, enquanto responsável pelos Serviços Financeiros, posso ver claramente os benefícios para o Reino Unido de estar no mercado interno, na União Europeia. E também posso ver, claramente, os riscos para o sector dos serviços financeiros britânicos se o país sair”.
Com apreensão e expectativa, os responsáveis europeus aguardam os resultados do referendo britânico. Isto numa altura em que a campanha para o referendo de 23 de Junho fica manchada pelo assassinato de uma deputada trabalhista pró-europeia. Jo Cox, de 41 anos, foi baleada esta quinta-feira. O suspeito é um homem de 52 anos que, segundo testemunhas, terá gritado “Grã Bretanha primeiro” antes de disparar sobre a deputada trabalhista. O universo político britânico reage com choque e consternação. O Primeiro-ministro David Cameron diz que o Parlamento britânico perdeu uma das suas mais importantes figuras. Já o líder trabalhista Jeremy Corbyn lamenta a morte de Jo Cox, “uma deputada que sempre lutou convicta dos valores que defendia”.
Não é ainda claro o efeito que este dramático episódio poderá ter no sentido de voto dos britânicos. Para Mário David, ex-eurodeputado e antigo Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, estes acontecimentos são “a tradução clara de que algo vai mal nas sociedades europeias”.
Ecofin discute sanções
O Ecofin discute hoje a possibilidade de um adiamento de eventuais sanções a Portugal e Espanha por violação dos limites do défice. Um tema sensível, face ao desacordo entre instituições europeias e Estados-membros. Para a presidente do Conselho de Finanças Públicas há uma contradição nesta ameaça que pende sobre o Governo português. Teodora Cardoso diz ser, no mínimo, estranho que Portugal esteja hoje mais perto de cumprir as metas do défice e, ao mesmo tempo, mais perto de ser sancionado. “Bruxelas deve clarificar esta questão”, defende Teodora Cardoso. Já para Mário David, esta questão revela o que diz ser “a hipocrisia do funcionamento actual da União Europeia”.
“Queremos mais Europa? E que Europa?”
Questões lançadas hoje numa conferência no Palácio da Bolsa. Entre os participantes, a presidente do Conselho de Finanças Públicas - Teodora Cardoso (que já aqui ouvimos) - e o economista João Ferreira do Amaral. A jornalista Teresa Almeida acompanhou.