As dificuldades nas comunicações impediram "gerir em tempo útil os inúmeros pedidos de socorro feitos por cidadãos ameaçados pelas chamas" no incêndio de Pedrogão Grande, revela o Centro de Estudos e Intervenção em Protecção Civil.
No relatório de análise à "catástrofe do incêndio florestal de Pedrogão Grande", que vai ser apresentado na terça-feira, este centro de estudo, liderado pelo ex-presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses Duarte Caldeira, conclui também que existiram "situações de total descontrolo, motivadas pela insuficiência ou mesmo a inexistência do planeamento".
"O colapso das comunicações em vários momentos vitais da operação constitui um dos réus das consequências catastróficas que se verificaram neste GIF [Grande Incêndio Florestal]. A impossibilidade de manter em permanência um fluxo de comunicações do posto de comando para o teatro de operações e deste para o primeiro foi o principal responsável pela incapacidade de gerir em tempo útil os inúmeros pedidos de socorro formulados, através de diversas vias, por cidadãos ameaçados pelas chamas", sublinha o documento, a que agência Lusa teve acesso.
O relatório do Centro de Estudos e Intervenção em Proteção Civil (CEIPC) adianta que, além "da falta de robustez da rede SIRESP", verificou-se "uma sistemática anarquia funcional, da parte de múltiplos utilizadores da rede, circunstância que agravou a situação".
O documento sustenta também que "não foi atempadamente percepcionada" a circunstância que se estava perante um grande incêndio florestal com características de severidade anormais relativamente ao padrão que o dispositivo de combate enfrenta habitualmente.
Este organismo concluiu igualmente que o Posto de Comando Operacional (PCO), enquanto órgão director das operações, "levou várias horas a estabilizar uma localização, impossibilitando que cumprisse as suas missões essenciais", como a recolha e tratamento operacional de informações, preparação das acções a desenvolver, formulação e transmissão de ordens e consequente controlo da sua execução.
"Ainda no domínio do funcionamento do PCO verifica-se que em momento algum da operação, este esteve correctamente constituído pelas células de planeamento, combate e logística, nem pelos respectivos núcleos que, num evento desta magnitude, se justificava estarem constituídos, na sua máxima extensão", refere o relatório, adiantando que os meios de reforço accionados para o incêndio de Pedrogão Grande "não foram desde logo integrados", não lhes foi atribuída missão específica e actuaram, em muitos casos, por sua "conta e risco".
Segundo o Centro de Estudos, "a falta de conhecimentos mínimos das populações para lidar com situações de emergência e para salvaguarda da sua autoprotecção resultou na morte de um número significativo de pessoas".
O relatório indica ainda que os três municípios afectados pelos incêndios não cumpriram as orientações dos Planos Municipais de Emergência, bem como desvalorizaram os Planos Municipais de Defesa da Floresta Contra Incêndios.
O relatório pretendeu fazer uma reflexão sobre todo o processo de decisão que orientou a operação de protecção civil no incêndio de Pedrogão Grande e contribuir para uma mudança no sistema de protecção civil.
O Centro de Estudos e Intervenção em Protecção Civil é uma associação privada sem fins lucrativos, que tem como objetivo a produção e divulgação de informação, bem como a realização de estudos e trabalhos de investigação que contribuam para a construção de uma cidadania responsável e interventiva, no âmbito da protecção civil.
O incêndio de Pedrógão Grande, que começou a 17 de Junho e alastrou a vários municípios vizinhos, causou 64 mortos e mais de 200 feridos.