A presidente do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida (CNECV), Maria do Céu Patrão Neves, considera “lamentável” que a alteração legislativa, que põe fim ao anonimato de dadores de óvulos e espermatozoides, não tenha “acautelado” a proteção da vida humana, permitindo que, a partir do próximo mês, milhares de embriões possam ser destruídos.
Em agosto, com o fim da norma transitória que impedia a destruição de embriões, em cinco anos, e de gâmetas, em três, no âmbito do novo regime de confidencialidade de dadores, milhares de embriões e de gâmetas, criopreservados com vista ao nascimento de bebés através de procriação medicamente assistida, estão em risco.
“Trata-se de vida humana e destruir vida humana, porque não se acautelou a sua proteção proporcional, é no mínimo lamentável. Por isso, mais uma vez, afirmo que o legislador deve acautelar as consequências da aplicação da lei. Se o tivesse feito, se calhar, não estávamos nesta situação”, sublinha Maria do Céu Patrão Neves, dizendo que, “neste momento, de aplicação de uma lei, já feita, só quem tenha competência para a suspender” pode evitar a destruição destes embriões.
O tema levou a Associação Portuguesa de Fertilidade a lançar, na última semana, uma petição pública “Pela não-destruição dos embriões doados sob o regime de anonimato”.
O documento dirigido ao Presidente da República e aos grupos parlamentares e cidadãos conta, até ao momento, com quase duas mil assinaturas.
De acordo com a presidente do CNECV, “é interessante que se esteja a assistir a uma consciência cívica de repúdio pelas consequências da aplicação da lei”. “É sempre importante perceber que, de facto, a sociedade civil, o cidadão comum se importa efetivamente com aquilo que são os impactos na vida humana de legislação”, diz Maria do Céu Patrão Neves, que lamenta que o organismo a que preside não tenha sido consultado sobre o tema.
“Esta seria matéria em que o Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida seria obviamente competente e teria tido oportunidade para chamar a atenção para a implicação da aplicação da lei, ao fim dos cinco anos de transição. Tal não se verificou, lamentavelmente, e agora temos uma situação complexa em que se percebe que, por um lado, se está a dar cumprimento à lei e, por outro lado, finalmente as pessoas, quer dizer os políticos, legisladores, cidadãos comuns, se apercebem das consequências que esta aplicação tem para o que, para todos os efeitos, é vida humana que merece ser protegida”, remata a presidente do CNECV.