O antigo Rui Pereira diz-se "tranquilo e de consciência tranquila" quanto à sua actuação enquanto ministro da Administração Interna.
O antigo responsável da tutela no governo de José Sócrates responde desta forma a um relatório da Beighley Consulting, que deu entrada no Parlamento em 2009, e que admitia como provável que, nos 10 anos seguintes, os incêndios pudessem consumir 500 mil ou mais de floresta no espaço de um ano.
Questionado pela Renascença sobre uma eventual quota de responsabilidades, Rui Pereira diz ter tomado "as medidas necessárias à data" para contrariar a previsão dos técnicos.
"Reforcei o sistema de Protecção Civil, com mais companhias de bombeiros profissionais, com mais equipas de intervenção permanente nos concelhos, com competências reforçadas dos governadores civis", extintos pelo governo precedente. "Isso foi um erro", sugere Rui Pereira que, dessa forma, conclui que não foi por inacção sua que o país assistiu este ano ao quadro de devastação que tinha sido antecipado em 2009.
Apontar o dedo? "Era o que me faltava"
Questionado sobre a responsabilidade de governos anteriores - em particular o que precedeu António Costa -, Rui Pereira diz que "isso não é comigo, é com os órgãos fiscalizadores da acção executiva, desde logo, os deputados na Assembleia da República. Não me peça para apontar dedos. Era o que me faltava!", remata.
Dispersão no combate é cara, insuficiente e ineficaz
O documento da Beighley Consulting, uma consultora norte-americana, refere que o dispositivo de combate disperso entre Comando Nacional de Protecção Civil, GIPS e Afocelca - a estrutura profissional de prevenção de fogos - é mais dispendioso e ineficaz do que uma estrutura unificada de comando.
No entanto, Rui Pereira considera que a criação de um instrumento desse género "é algo com que as estruturas da Protecção Civil não simpatizam muito, porque pensam que é uma estrutura hierárquica paralela".
O ex-ministro da Administração Interna reconhece que, quando estava em funções "dava alguma atenção e crédito a esse argumento" que, de resto, prevaleceu na reforma da Protecção Civil em 2006.
"Hoje tenho grandes dúvidas", sublinha. "Porque a estrutura dos bombeiros é fragmentária e os últimos acontecimentos provam que essa estrutura fragmentária beneficia se, de futuro, houver uma estrutura hierárquica de bombeiros".
"Sempre tive reservas quanto ao SIRESP"
O relatório da Beighley Consulting antecipava em 2009 as insuficiências reveladas pelo sistema de comunicações de emergência.
Os técnicos consideravam que o SIRESP "potenciava erros humanos, más interpretações e tempo excessivo na resposta e no tratamento da informação para abordar as ocorrências".
Mas também aqui Rui Pereira adopta um discurso cauteloso. Começa por referir que "não foi claro que o Estado tenha sido devidamente salvaguardado no contrato do SIRESP", mas, ao mesmo tempo, não responsabiliza António Costa pelas insuficiências do sistema.
"O ministro que me precedeu renegociou o SIRESP, firmou o modelo mas tudo isso vinha de uma negociação anterior que não foi tão transparente quanto devia".
Perante a insistência da Renascença sobre a competência de António Costa para salvaguardar o interesse público na renegociação do SIRESP, Rui Pereira diz que "agora seria fácil fazer uma avaliação prognóstica" a tudo o que aconteceu.
Já quanto às anomalias do SIRESP que teve de enfrentar enquanto titular da Administração Interna, Rui Pereira explica que "sempre que isso aconteceu, as insuficiências eram pontuais e foram todas reportadas à sociedade SIRESP. O que aconteceu este ano foi um colapso do sistema. E tem de ser investigado", conclui.