Abuso sexual de menores. O que dizem a lei civil e a lei canónica?
09-02-2023 - 17:35
 • Liliana Monteiro

O que prevê a lei civil para estes crimes? Qual o prazo de prescrição destes crimes? Conheça a resposta para esta e outras perguntas

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A quatro dias da divulgação das conclusões da comissão independente que investigou suspeitas de abusos na Igreja Católica em Portugal, neste Explicador Renascença olhamos para o que diz a lei civil e a canónica relativamente a casos de abuso sexual de crianças ou adolescentes.

O que prevê a lei civil para estes crimes?

O Código Penal define dois tipos de crimes: o de abuso sexual de criança (leia-se, até aos 14 anos) é um crime público e para o qual basta uma denúncia. Este crime prevê punições a penas de prisão que podem chegar aos dez anos.

O Codigo Penal contempla também o crime de ato sexual com adolescente , que abrange menores entre os 14 e os 16 anos. Este é um crime semipúblico, ou seja, o procedimento criminal depende da apresentação de queixa do ofendido. Neste caso, a pena de prisão pode chegar aos três anos ou ser ainda mais agravada conforme o ascendente do arguido sobre a vítima.

A medida da pena depende sempre dos atos sexuais de relevo apurados jurídica e clinicamente; o principio é sempre o de que, quanto menor a idade da vítima, maior a punição ao agressor.

Qual o prazo de prescrição destes crimes?

Se estivermos a falar do crime de ato sexual com adolescente, o prazo de prescrição é de 10 anos. Já relativamente ao crime de abuso sexual de menor são 15 anos.

Estes prazos podem ser sempre maiores tanto quanto a suspensão que pode acontecer, por exemplo, quando se constitui arguido, quando se abre instrução, entre outras situações.

O direito de queixa ou denúncia extinguia-se após os 18 anos da vítima, mas foi alargado até aos 23 anos.

O que está previsto em matéria de indemnização?

A responsabilidade civil está sempre associada à prova dos factos ilícitos criminais feita em tribunal.

Não há uma tabela definida de forma rígida e universal. Por exemplo, no processo Casa Pia, aquele que foi até hoje o maior caso de abuso sexual de menores e adolescentes, as indemnizaçoes definidas pelo tribunal em 2010 rondaram os 25 mil euros a cada vitima. O valor foi definido sempre em função do abuso provado e das consequências fisicas e psicológicas.

E o que diz o direito canónico?

É mais rígido do que a legislação civil. A Igreja tem regras claras para tratar dos casos de abuso sexual de menores, que têm vindo a ser melhoradas nos últimos anos.

O Código que rege a lei da Igreja para esta matéria está no "Vade Mecum", uma espécie de ‘manual’ de procedimentos criado em 2020 por iniciativa do Papa Francisco e revisto no ano passado, reforçando a obrigatoriedade de cada bispo diocesano atuar em primeira linha.

Para lá dos prazos da lei civil, a Igreja reserva-se ao direito de, quando existem factos sólidos que envolvam membros católicos, poder atuar e sancionar os que vierem a ser classificados como abusadores. No limite, podem ficar impedidos de exercer o sacerdócio, não deixando de ser padres porque esse é um sacramento para a vida. A decisão final é sempre tomada pelo Vaticano.

Se na lei civil são considerados menores todos os que têm idades inferiores a 16 anos, no direito canónico essa idade sobe para os 18 anos.

Em materia de prescrição, o prazo é também mais longo na lei da igreja, ou seja, 20 anos a partir da maioridade da vítima. Mesmo assim, é sempre possível alterar a regra da prescrição e atuar, mas a decisão depende sempre da Santa Sé.

O código da Igreja prevê que os casos suspeitos sejam comunicados às autoridades civis, não ficando apenas no núcleo religioso, a bem da proteção da vítima e para evitar a possibilidade da continuação da atividade criminosa.

De resto, tal como a legislação civil, o direito canónico prevê igualmente o sigilo do processo, aplicação de medidas cautelares e o direito à presunção da inocência do acusado.

Quantos condenados por crimes sexuais há nas cadeias portuguesas?

De acordo com as estatísticas da Direcção Geral de Reinserção Social, até ao final de 2021 havia até 15 pessoas sujeitas a vigilância electrónica por crimes sexuais e 221 presos pelos mesmos crimes, reclusos com 21 ou mais anos de idade.

As estatísticas mostram que, desde 2019, tem vindo a aumentar o número de reclusos nas prisões por estes crimes; em três anos são mais uma dúzia de presos.