Esta pré-campanha teve um mérito: confirmar que os programas dos vários partidos com assento parlamentar não foram feitos para ser lidos, nem sequer pelos seus Líderes. Produziram-se apenas resmas de papel na esperança de serem vistas por aquela meia dúzia de carolas jornalistas do costume. Lidos em diagonal, quase em simultâneo, as propostas podem continuar a ser apenas meia dúzia de vacuidades. Aliás, pressionados pelo tempo, os leitores vão sempre retirar “a palha” e encontrar os mil caracteres com conteúdo a que vão ter de os reduzir.
Esta atividade ingrata teve, apesar disso, desta vez, uma inesperada vantagem: perceber até que ponto o PAN, durante quatro anos, passou pelos pingos da chuva e se furtou ao escrutínio de um mínimo de consistência que quase nos envergonha.
Como foi possível que ninguém tivesse esmiuçado o que queria afinal André Silva e ao que vinha. Tratado como uma espécie de canal Panda parlamentar, inocente, “fofinho” e dedicado às causas comuns só lhe descobrimos o tique autoritário, na forma e no fundo, e percebemos como está impreparado na sua sobranceria, tarde demais para lhe travar o caminho. Ou, pelo menos, assinalar o risco de uma chegada ao poder.
Não sei o que é pior: se uma Catarina bloquista cuja proposta parece parada no tempo das nacionalizações, se um André Silva vagamente “animalista” que faz do veganismo uma filosofia de Estado que deve ser inculcada às colheradas, em doses cavalares, da creche às universidades, passando pelos jantares oficiais no Palácio da Ajuda, de S. Bento ou de Belém.
Foi a prestação imprestável de André Silva, logo na sua primeira grande entrevista ao Expresso, que levou os jornalistas a passar a pente fino o seu programa. A salada de ideias soltas e nalguns casos ridículas puseram a descoberto a fragilidade de um partido que não ultrapassa o nível de um grupo de pressão, um lobby profissional e inteligente dos direitos dos animais e de sensibilização ambiental.
Nada contra estes lobbies que servem a causa da Casa Comum que Francisco tanto nos recomenda. Antes pelo contrário, mas não é esse o papel exigível a um partido de governação. Só por isso e apesar da melhoria das prestações televisivas do PAN já terá valido a pena o manifesto excesso de protagonismo que lhe foi dado nesta pré-campanha. É exigível maior consistência quando falamos do próximo partido que pode fazer de charneira parlamentar.
No mais, os programas escritos em puro “eleitoralês”, variaram entre permanecer desconhecidos (os dos novos partidos) e quase desconhecidos, incluindo dos próprios líderes que frequentemente mostraram não querer falar deles, preferindo dizer generalidades sobre o tema, propor como novidades medidas em vigor ou mostrar como diferentes o quase copy paste dos parceiros.
Neste contexto os políticos podem sempre dizer que depois de duas semanas de correria entre entrevistas e debates, ainda em pré-campanha, estão cansados de responder às perguntas dos jornalistas obcecados por temas que “não interessam nada às pessoas lá em casa”.
Só não se lamentam do excesso de “jornalismo inútil” os que ficaram de fora dos confrontos. Aqueles que ainda não tiveram a oportunidade de chegar aos salões do poder. São tantos, tão diferentes, com credibilidade e representatividade tão variada que por questões de equidade básica, face à limitação de meios disponíveis, é quase impossível expor tao mediaticamente. Alguns, acabam votados a um silêncio injusto. Dir-se-á que é a vida.
Fazem-se esforços de “compensação”, aqui e ali (uma entrevista, uma ação de campanha, uma manifestação mais participada), mas sabe-se de antemão que a igualdade de oportunidades é difícil de atingir, e na maioria dos casos perante a impossibilidade do óptimo ainda não se chegou ao bom e já se desiste.
Chegado ao período de campanha a coisa piora. A lei obriga a uma imparcialidade impossível de atingir. Aí as consciências tranquilizam-se. Menos é mais. Sobretudo menos escolhas é com certeza garantia de menos riscos de parcialidade e problemas com a CNE e congéneres. Ouçam-se os tempos de antena e digam-se neles o essencial. Desperdiçada essa hipótese que coloca todos os partidos em pé de igualdade então pouco haverá a esperar dos m.c.s.
Uma coisa, contudo, podemos pedir aos líderes “dos grandes”. Se as perguntas dos jornalistas não interessam aos eleitores porque insistem em não lhes dar resposta, enredando-se no mesmo discurso estafado com os mesmos ataques, os mesmos números, os mesmos argumentos repetidos… as mesmas generalidades.
Por exemplo: se o PSD quer ser alternativa a este Governo porque se limita a dizer que fará apenas “um bocadinho diferente” em quase tudo (uma espécie de versão atualizada da velha “evolução na continuidade” marcelista). E o CDS, se ambiciona liderar a direita, pode dizer ao que vem, que país quer que não nos lembre a Troika, capaz de repor o partido no mapa de alternativas do voto?
E se o PS quer um voto de confiança, talvez não seja suficiente continuar a dizer o que já fez, que vai continuar a fazer o mesmo, “mas agora ainda mais e melhor”.
Haverá por aí alguém que nos diga o que vai fazer mesmo para repor um mínimo de qualidade nos serviços públicos e a qualidade e a disciplina nas escolas, mesmo? Ou deixar-nos finalmente pensar que não temos de ser os eternos “remediados” da Europa?
Os portugueses querem mais do que continuar felizes com a fotografia “um poucochinho” melhor nos quadros estatísticos.
No dia 6 não se vai escolher um ministro das Finanças, mas um projeto para o país que queremos. Alguém consegue explicá-lo nos poucos dias que faltam?