As mensagens não param de chegar. Desde que Vladimir Putin anunciou a “mobilização parcial” de cidadãos para a guerra na Ucrânia, a organização de defesa dos direitos humanos Pro Asyl não tem tido mãos a medir.
“Somos contactados permanentemente nas redes sociais sobre se há alguma possibilidade de vir para a Alemanha, se é possível pedir asilo aqui”, conta Karl Kopp à Renascença.
O responsável do departamento europeu da Pro Asyl elogia o Governo alemão por ter anunciado estar disponível para abrir as portas do país a objetores de consciência russos, que recusem combater na Ucrânia. O problema, segundo Karl Kopp, é que muitos dos caminhos para a Alemanha estão bloqueados. Para começar, não há voos diretos.
“Há rotas de fuga? Há formas legais de sair da Rússia para pessoas que fogem desta guerra que viola o direito internacional?”
A Geórgia e o Cazaquistão são algumas das rotas escolhidas por cidadãos russos. A Turquia é outra possibilidade para quem tem dinheiro para pagar o bilhete de avião - é preciso ter passaporte para entrar no país, mas não é preciso visto. Já a União Europeia dificultou a emissão de vistos de turismo para cidadãos russos. A Finlândia, a Polónia e os países bálticos decidiram fechar as fronteiras a turistas da Rússia.
A “dolce vita” do Ocidente
O chefe da diplomacia da Letónia, Edgars Rinkēvičs, escreveu no Twitter que os jovens desertores russos são um “risco de segurança”. E questionou onde é que eles estavam há sete meses, quando a guerra começou? Porque não se insurgiram mais cedo?
“Muitos dos cidadãos que estão agora a fugir da Rússia por causa da mobilização não disseram nada sobre a morte de ucranianos, não protestaram na altura. Não é correto considerá-los como objetores de consciência”, disse Rinkēvičs.
Para o embaixador da Ucrânia na Alemanha, Andrij Melnyk, todas essas pessoas deveriam ficar na Rússia a combater o regime de Putin em vez de desfrutar da “dolce vita” no Ocidente.
Karl Kopp, da organização alemã Pro Asyl, critica as palavras do embaixador. “Sabemos quantos opositores estão presos na Rússia. É bom que haja resistência ao regime, mas também devemos apoiar aqueles que se recusam a aceitar [as ordens de Putin] e 'votam com os pés'”, defende.
O ativista alemão Rainer van Heukelum concorda. “A minha opinião pessoal é que devemos acolher esses cidadãos que fogem por não quererem juntar-se ao Exército. Mas a Alemanha deveria coordenar o processo com os outros países europeus”, afirma van Heukelum em declarações à Renascença.
Refugiados “de primeira e segunda classe”
Até ao final de agosto, a Alemanha recebeu 1.241 novos pedidos de asilo de cidadãos russos, quase tantos como no ano inteiro de 2021. Foram também concedidos vistos humanitários a centenas de pessoas, incluindo jornalistas e dissidentes políticos.
Ainda assim, é um número pequeno em comparação com as dezenas de milhares de pedidos de asilo de cidadãos da Síria, do Afeganistão e do Iraque.
Este fim de semana, dezenas de pessoas protestaram na cidade de Bona, no oeste da Alemanha, para lembrar todos esses refugiados.
“Estamos aqui porque temos a sensação de que, com todos os refugiados da Ucrânia e agora da Rússia, outros refugiados estão a ser esquecidos", disse van Heukelum, membro da organização Seebrücke, acrescentando que “seria bom se a Alemanha seguisse a política que adotou em relação aos refugiados ucranianos, deixando-os entrar no país, disponibilizando dinheiro rapidamente e permitindo que possam trabalhar. Há uma espécie de refugiados de primeira e segunda classe”.
A organização de direitos humanos Pro Asyl apela à União Europeia que pare de “tentar fechar hermeticamente as suas fronteiras”, e isso não se aplica só aos refugiados da Rússia, mas também aos de outros países. Quanto a possíveis “riscos de segurança”, o chefe do departamento europeu da organização, Karl Kopp, desdramatiza, considerando que “há controlos de segurança e diversas verificações durante o processo de asilo. Um Estado democrático consegue monitorizar tudo isso”.