Pode o oceano sufocar?
05-01-2018 - 21:08
 • André Rodrigues

O aquecimento global está a provocar oceanos doentes. As primeiras vítimas deste processo são os recifes de corais, mas o impacto ecológico promete não ficar por aqui.

Imagine uma área superior à de África ou da América do Norte. São 32 milhões de quilómetros de quadrados de oceanos com baixos níveis de oxigénio, a uma profundidade de 200 metros. Dois novos estudos de investigadores norte-americanos, publicados pela prestigiada revista Science, alertam para a redução drástica dos níveis de oxigénio, que está a pôr em perigo a sobrevivência da esmagadora maioria das espécies marinhas.

Os artigos revelam que só os pequenos micróbios marinhos são suficientemente resilientes para resistir a este fenómeno. As primeiras vítimas deste processo são os recifes de corais, mas, a médio e longo prazo, existe o sério risco de desequilíbrio nos ecossistemas marinhos.

Em declarações à Renascença, o hidrobiólogo Adriano Bordalo e Sá antecipa um cenário de extinção em massa nos oceanos. "Não num futuro para a nossa geração, ou dos políticos que temos actualmente, mas poder-se-á dar o caso de os grandes organismos desaparecerem e ficarem os organismos microscópicos que depois se vão reinventar, tal como a vida no nosso planeta se reinventou ao longo destes quatro mil milhões de anos".

Um processo que "nada tem de novo", sublinha o professor do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS), que, contudo, realça que a circunstância particular de ser "o próprio Homem a acelerar os prazos, especialmente de há 150 anos para cá".

Mondego e Ria Formosa com "níveis perigosos de oxigénio"

De acordo com o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), os níveis de oxigénio nas águas costeiras são bons, "de um modo geral".

As excepções são o estuário do Mondego e a Ria Formosa, onde os especialistas admitem que a desoxigenação das águas pode afectar a vida aquática podendo, no limite, provocar índices preocupantes de mortalidade.

No caso particular do Mondego, Bordalo e Sá explica o fenómeno com os incêndios que devastaram a região Centro do país.

"Com estas quatro semanas de chuva continuada, toda a massa de cinzas e restos de madeira mais ou menos carbonizados estão a ser lavados e levados da superfície dos solos para os cursos de água", afirma.

Segundo este especialista, "há casos em que as reduções de oxigénio rondam os 30% em relação ao que seria normal nesta altura do ano".

Um fenómeno que é tanto mais preocupante quanto a proximidade "àquelas margens fortemente queimadas e frente às zonas onde desembocam os afluentes", conclui Bordalo e Sá.