É a própria vítima que muitas vezes leva ao arquivamento de processos, considera o presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público.
“Há casos em que existe uma agressão, fruto de uma discussão, é relatada à polícia a quente, mas depois a senhora é chamada para depoimento e o caso já está sarado. A vítima já não pretende qualquer procedimento criminal contra o seu marido”, afirma António Ventinhas à Renascença.
O procurador lembra que a vítima é, na maior parte dos casos, “a testemunha chave do processo”. Sem o seu depoimento, “o que acaba por acontecer é que o processo é arquivado por falta de provas”.
“O processo iniciou-se até por um relato policial, mas passado uns dias a intenção da vítima já não é a mesma”, reforça.
A Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV) considera que o facto de a vítima ter de “repetir vezes sem fim a mesma história” é um dos motivos que a leva a ficar em silêncio.
Mas António Cotrim, dirigente da APAV, aponta também o peso atribuído à prova como um dos factores que contribui para o arquivamento de inquéritos. Defende, por isso, uma melhor formação dos magistrados nesta matéria, de modo a compreenderem que “é normal que uma vítima fique triste e deprimida”.
“Quanto melhor formados estiverem os nossos magistrados, também é mais fácil para as vítimas poderem avançar com os seus processos”, sustenta, em declarações à Renascença, considerando que o peso da evidência é desvalorizado pela justiça.
“Por isso, é importante – em situações em que há violência física e até violência psicológica – que as pessoas recorram às organizações de apoio, que recorram aos serviços de saúde e que expliquem que aquele hematoma, aquela depressão, se prende com situações de violência doméstica”, aconselha.
Em 2015, a taxa de arquivamento dos processos de violência doméstica situou-se nos 79%. A grande maioria (74,5%) decorreu por falta de provas.