Recorde aqui como foi o debate
O tema "combate à corrupção e justiça" deu origem a um dos momentos tensos do debate das rádios, protagonizado por Assunção Cristas e António Costa.
Chamando a si alguns "galões", António Costa lembrou que foi no seu Governo que foram aprovados a nova lei orgânica da Polícia Judiciária e o novo estatuto profissional da mesma força de segurança.
A líder do CDS reagiu e lembrou que essas medidas só foram tomadas à beira das férias do Verão, "depois de quatro anos de inação".
"Não basta fazer leis, é preciso dar meios e a PJ queixou-se durante estes quatro anos da falta de meios e só no último mês é que lhes deu qualquer coisa e não foi tudo", lembrou Cristas.
A líder do CDS insistiu: "O doutor António Costa saberá porque não deu meios durante quatro anos". A frase provocou reação em tom indignado: "Tem alguma concreta a acusar?"
Todos os líderes defenderam que quer o Ministério Público quer a Polícia Judiciária precisam de mais meios para que a investigação e o julgamento dos casos de corrupção sejam mais céleres.
"Omeletes sem ovos"
“Sem ovos não se fazem omeletes", defende o secretário-geral do PCP, retomando a questão dos meios. "Se não forem reforçados os quadros, na investigação e noutros profissionais da justiça”, não se consegue dar celeridade aos processos.
“Tanta denúncia de corrupção, de compadrio e depois não encontra desfecho”, lamenta Jerónimo de Sousa, sublinhando que estes profissionais se debatem também com questões importantes que têm de ser atendidas: “a questão das carreiras, dos salários, do investimento necessário para respeitar os interesses destes trabalhadores”.
Costa apontou, então, a promoção de “uma administração simplex”, com processos administrativos mais simples; “processos mais transparentes; e aquilo que designamos o ‘princípio dos quatro olhos’ e que se destina a haver um maior controlo nas “decisões acima de certo montante”.
A estas medidas acrescenta a “pegada legislativa”, que implica o registo de “todas as entidades, pessoas e empresas que intervieram no processo legislativo, para ver quem tentou ou não e quem influenciou o processo legislativo”.
Na opinião do primeiro-ministro, o magistrado que faz a investigação não deve ser o mesmo que depois procede ao julgamento - o que não acontece atualmente - e conclui que o Ministério Público “dispõe, como poucos em qualquer parte do mundo, de instrumentos para investigação por corrupção”. Já quanto aos meios materiais, “são sempre necessários e faltarão sempre”, acrescenta.
Rio contra "condenação na praça pública"
Questionado sobre como se resolve o problema da corrupção, o líder do PSD aponta algumas medidas: “fazendo os julgamentos no sítio certo, a investigação no sítio certo - que é a PGR, o Ministério Público e depois a condenação ou absolvição nos tribunais”.
“Não defendo o combate à corrupção nas páginas dos jornais nem nos ecrãs de televisão. Nem defendo o combate à corrupção com a violação permanente do segredo de justiça, por mil e um objetivos, alguns até de ordem comercial”, começa por criticar.
Do ponto de vista de Rui Rio, “o combate à corrupção não compete a nenhum de nós aqui [seis líderes dos principais partidos], não é o poder político, não é o presidente da Câmara, o presidente da Junta, não são os deputados; compete ao Ministério Público, compete à Procuradoria-Geral da República e, na sequência disso, aos tribunais”, sustenta.
Ao poder político compete “dar ao Ministério Público e à Polícia Judiciária os instrumentos necessários para que façam um melhor trabalho”.
“Mas depois têm de fazer o trabalho, não tem que se andar a noticiar nos jornais. Tem que se fazer o trabalho, tem de haver julgamentos nos tribunais, que é no sítio certo”, insistiu, mostrando-se muito crítico das condenações na praça pública.
Na linha dos restantes líderes partidários, Rio defende o reforço dos “meios de combate” à corrupção, “porque estamos a falar de crimes chamados de colarinho branco, extremamente sofisticados e muitas vezes escondidos”.
Na sequência das condenações fora dos sítios certos, o presidente do PSD mostra-se muito crítico da violação do segredo de justiça, crime que defende que seja “aplicado a todos os portugueses” de igual forma.
“Não pode ser uma lei que serve para uns e não serve para outros. Se eu violo o segredo de justiça porque pego em algo que não posso saber e toco à porta do meu vizinho e lhe mostro o que não devo mostrar, e isso consiste num crime, se eu mostrar a 10 milhões de portugueses o crime é 10 milhões de vezes maior”, argumenta.
Consciente de que o que defende “não é minimamente politicamente correto”, Rui Rio insiste que a revelação de segredos de justiça “arruína a investigação”, pelo que “a publicação não deve ser permitida, obviamente”.
Na reação a esta exposição, Catarina Martins (BE) vem alertar que, se “a fuga do segredo de justiça é mau, perseguir jornalistas é atacar a democracia”.
“Os jornalistas têm de fazer o seu trabalho e defender as suas fontes e dependemos também disso para combater a corrupção”, destaca.
Tribunais especializados?
A resposta é positiva apenas para o PAN. André Silva baseia-se em relatórios de instituições internacionais sobre Portugal para defender “a criação de tribunais especializados para o julgamento de crimes cometidos no exercício de funções públicas”.
A ideia não recebe o apoio dos restantes partidos, com o secretário-geral do PS a esclarecer que o que as instituições internacionais recomendam “é que haja formação especializada”.
“É na formação, não na criação de tribunais especiais, nem sequer para a violência doméstica”, sublinha António Costa, acrescentando que, no que toca a este tipo de violência, defende “uma composição especial do tribunal, de modo a conjugar família e crime”.
“Estamos a falar de uma formação especial para julgar processos onde a matéria de família e criminal estão profundamente intricados”, sustenta.
Também o CDS se mostra “totalmente contra a criação de tribunais especializados”. Na opinião de Assunção Cristas, “isso é próprio de regimes totalitários”.
Enriquecimento injustificado e a proteção do denunciante
O programa eleitoral do Bloco de Esquerda inclui a criação da figura do enriquecimento injustificado.
“O que defendemos é que, quando um titular de um cargo político de um alto cargo público não é capaz de explicar o enriquecimento que tiver tido e que contraria as declarações que apresenta, esse dinheiro deve ser 100% confiscado pelo Estado”, avança Catarina Martins.
“Gente que já teve de dizer tudo o que tem e, acima disso, aparece com uma fortuna incapaz de injustificar, esse é o enriquecimento injustificado”, esclarece ainda.
A medida merece a oposição do líder do PS e até do presidente do PSD, que para quem as leis existentes são suficientes para sancionar o enriquecimento ilícito.
Se houver uma desconformidade entre as declarações apresentadas ao Tribunal Constitucional e a manifestação de riqueza, “já estamos a cometer um crime, que é de falsas declarações”, sublinha António Costa.
“O Ministério Público tem de nos vir perguntar como temos este património e estes rendimentos e a pessoa ou tem justificação ou o Ministério Público abre um inquérito criminal. Pode ter sido corrupção, fuga ao fisco... Não é necessário criar um novo crime público”, sustenta.
Da mesma maneira, Rui Rio considera que “as leis existentes” já preveem a investigação das diferenças entre os rendimentos apresentados no início e no fim do exercício de um cargo público.
“Alguém fazer uma declaração de rendimentos de 100 no início e sai de lá com 500, essa diferença tem de ser investigada, mas dentro das leis que existem”, afirma.
No que toca à proteção do denunciante do crime de corrupção, que o PAN quer o CDS defendem a melhoria da lei em vigor, sendo que no caso do Partido das Pessoas, Animais e Natureza a proposta é alargar a proteção aos denunciantes que sejam também criminosos.
“É preciso instituir sanções contra medidas retaliatórias contra denunciantes. Com ou sem participação no crime”, defende André Silva.
Da parte do CDS, a proposta é melhorar o estatuto do arrependido, “para funcionar em todo o processo”, e do denunciante.