No dia em que no Ministério da Educação arrancam as negociações com os sindicatos com o objetivo de alterar o modelo de recrutamento e colocação de professores, a Renascença falou com duas ex-professoras. Mudaram de profissão, porque se cansaram de andar com a “casa às costas”.
Ana Martins, 50 anos, mora em Bragança e trocou a escola por um banco, a cinco minutos de casa e onde já está nos quadros, mas admite que não se sente realizada. Deixou o ensino de que “gostava muito” há seis anos.
Sorri quando pensa nos alunos. “São uma alegria, apesar do mau comportamento e da presença dos pais, sempre gostei muito do ensino”, confessa.
Durante mais de 20 anos, deu aulas de português ao terceiro ciclo e ensino secundário, mas sempre a saltar de escola em escola, um percurso que descreveu à Renascença: “Estive em Faro, em Vila Real de Santo António, Albergaria, Águeda, estive cinco anos em Timor, um em França, um na Suíça, depois voltei para Águeda, estive em Bragança, Mirandela, Moncorvo, Mogadouro, Ribeira de Pena… corri muitas escolas”.
Depois de casar e de terem nascido as duas filhas, Ana Martins admite que “aumentou a pressão familiar para abandonar o ensino”. Agora, considera que será difícil regressar, mas ainda mantém vivo esse sonho e diz que se o ministro da Educação “abrisse concurso para os professores com mais de dez anos de serviço para integrarem um quadro, por exemplo, num raio de 300 quilómetros” ainda poderia ponderar o regresso.
Esta ex-professora reconhece que para ingressar no quadro tem de ser em Lisboa, mas diz de forma perentória que não consegue pagar uma renda. “Um contratado ganha à volta de 1.130/1.140 euros e um T1 quanto é que não custa em Lisboa? Mil euros? como é que eu sobrevivo?”
Também Isabel Louro, de 46 anos, mantem viva a paixão pelo ensino, ao ponto de concorrer todos os anos. Admite que este ano voltou a concorrer, mas não manifestou preferências para não ficar colocada, porque não consegue acumular um horário completo com aquilo que faz.
Está a trabalhar numa empresa em Viana do Castelo, porque a sua formação é gestão informática. “É essa a minha área, em que estou a trabalhar e em que gosto de trabalhar.”
Para trás ficaram os dez anos em que foi professora de informática, do grupo de recrutamento 550, aquele em que há mais falta de docentes.
Apesar de ir concorrendo, Isabel não pensa regressar ao ensino, agora que já passaram oito anos desde que deixou de dar aulas: “Voltar ao ensino ficou fora de questão, porque não há condições para trabalhar!”
Nestas declarações lamentou a falta de autonomia dos professores. Por exemplo, eu dou uma nota e chega a conselho de turma e pode ser alterada. Esta é uma situação que critica, dizendo que “ninguém chumba! Estamos aqui todos para os números”.
Isabel e Ana são dois exemplos dos muitos que chegaram ao conhecimento da Renascença, de professores que trocaram o ensino por uma carreira estável e emprego perto de casa.
Em pouco mais de duas semanas já transitaram para as escolas quase 4. 900 horários, ou seja, são horários que não conseguiram ficar preenchidos depois das três reservas de recrutamento, concursos que seguem as listas ordenadas de professores a contratar.