Portugal fez “progressos significativos” contra a violência contra mulheres e até é pioneiro em certas áreas, mas verifica uma baixa taxa de condenações e necessita de uma “coordenação mais robusta” entre as agências governamentais. A conclusão consta no primeiro relatório de avaliação realizado a Portugal após a ratificação, em 2013, da Convenção do Conselho da Europa para a Prevenção e o Combate à Violência Contra as Mulheres e a Violência Doméstica, designada como Convenção de Istambul.
A avaliação é da responsabilidade do Grupo de Peritos para o Combate à Violência contra as Mulheres e a Violência Doméstica (GREVIO, na sigla em inglês), órgão especializado e independente previsto na Convenção, que tem a missão de monitorizar a aplicação do texto por parte dos Estados signatários.
“O GREVIO reconhece o compromisso significativo das autoridades portuguesas e os progressos alcançados”, indica o relatório assinado pelo grupo de peritos, que aponta, no entanto, um conjunto de deficiências e recomenda, ao longo de cerca de 80 páginas, medidas para melhorar a proteção das vítimas, os procedimentos judiciais contra os agressores e a área da prevenção.
Os últimos dados conhecidos, relativos a 2018 e apresentados em meados de novembro passado pelo Observatório de Mulheres Assassinadas, davam conta de 24 mulheres assassinadas por familiares ou companheiros em Portugal, mais seis do que em 2017.
No período em análise, o grupo etário que registou mais femicídios foi o das mulheres com mais de 65 anos, seguido da faixa etária entre os 36 e os 50 anos.
Segundo o GREVIO, e no seguimento da ratificação da Convenção de Istambul, Portugal alargou o âmbito das políticas públicas, tendo instituído a criminalização de outras formas de violência contra as mulheres, como a perseguição, a mutilação genital feminina e o casamento forçado.
Mas os peritos recomendam que estes esforços abranjam outras situações de violência e apelam que sejam desenvolvidos programas de longo prazo que abordem todas as formas de violência cobertas pela Convenção e se baseiem nos progressos já alcançados.
O relatório europeu elogia igualmente o papel assumido pela Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género (CIG) na aplicação, na monitorização e na avaliação das políticas relacionadas com a igualdade de género e a violência baseada no género.
“Mesmo assim, (o GREVIO) considera que a implementação de planos de ação nacionais beneficiaria de uma coordenação mais robusta entre as agências governamentais”, frisa o texto, que aconselha igualmente, e para melhorias operacionais, “um maior envolvimento das autoridades locais”.
Outras “lacunas importantes”
O relatório reconhece o progresso alcançado na construção de uma moldura legislativa sólida para abordar a violência contra as mulheres, “mas uma área de particular preocupação é a definição de violação que não se baseia apenas na ausência de consentimento livre e requer o uso de 'restrição'“.
Outro foco de preocupação é “o uso generalizado de processos suspensos e a falta generalizada de ênfase na obtenção de condenações em casos de violência contra as mulheres”.
Neste sentido, os peritos recordam que “os procedimentos judiciais e as sanções penais constituem uma parte essencial da proteção das mulheres” e solicitam às autoridades portuguesas que assegurem “que as sentenças em casos de violência contra as mulheres preservem a função dissuasora das penas”.
O relatório do GREVIO destaca ainda os esforços de Portugal em combater os estereótipos de género e em aumentar a consciencialização sobre a prevalência da violência contra as mulheres, especialmente entre as gerações mais jovens, por exemplo, através de medidas para prevenir a violência no namoro.
Os peritos sublinham igualmente os progressos alcançados “na promoção da igualdade de género e no combate à discriminação de género no local de trabalho”.
Na lista de recomendações, o GREVIO pede ainda que as autoridades portuguesas assumam medidas que assegurem que “os direitos e a segurança das vítimas e dos respetivos filhos sejam garantidos em relação à determinação e ao exercício dos direitos de custódia e visita”.