Para Vânia Sousa, autora do livro “Turismo, Competitividade e Destino Portugal – fatores de sucesso e imagem internacional”, o marketing digital tem um papel fundamental nesse crescimento. Já tinha antes da pandemia de Covid-19 e acentuou-o depois.
Assim como a conectividade aérea, com o aumento das companhias low-cost a operar em Portugal.
Um destino que atrai cada vez mais turistas pela qualidade do produto e pela forma eficaz como é divulgado.
O poder do digital
O recurso ao marketing digital não é uma novidade, já estava a ser usado pelo próprio Turismo de Portugal desde 2013, diz Vânia Sousa, em entrevista à Renascença. A investigadora da área da Comunicação explica que, com a intervenção da Troika em Portugal, o orçamento para a promoção do Turismo nacional foi consideravelmente reduzido. Seguiu-se, tal como outros países, a recomendação da União Europeia para o recurso a especialistas e ao marketing digital.
“Portanto, o marketing digital e a digitalização têm vindo a acontecer desde 2013. É um dos fatores críticos de sucesso desde essa altura até 2019 (o período de estudo da tese de mestrado que deu origem ao livro agora publicado). Portugal utilizou essas ferramentas para segmentar o turista, para se destacar no digital e trazer os turistas certos para os destinos mais indicados nos momentos chave, no momento em que o turista decide a compra.”.
Para Vânia Sousa, o que começou por ser uma tendência, é agora uma realidade, que acompanha a necessidade do mercado e dos consumidores. “O digital é essencial para o Turismo, como noutros setores”. Sites, blogues, redes sociais, influencers são ferramentas cada vez mais importantes para o Turismo de Portugal comunicar. Mas também as regiões e as cidades enquanto destinos.
“As pesquisas dos consumidores são feitas on-line, através de motores de busca do Google. E é importante que os destinos e as entidades – publicas e privadas – que trabalham com o turismo tenham essa presença forte e diferenciadora no digital, nas plataformas, nas redes sociais, com web sites e nas plataformas de avaliação. É preciso trabalhar bem o digital porque isso, depois, vai impactar na perceção positiva – ou negativa – do próprio destino”.
O trabalho de investigação ficou concluído antes da pandemia, mas se fosse feito agora, não teria grandes mudanças, admite Vânia Sousa. Explica que durante esse período ajudou muitos profissionais do setor que (antes) não acreditavam no poder das redes sociais e no digital porque estavam demasiadamente ligados ao presencial. “Não é que esteja mal, mas temos que dar a volta e também saber usar as ferramentas digitais”.
A digitalização ganhou um peso significativo depois da pandemia e acabou por convencer cada vez mais gente. No entanto, Vânia Sousa alerta que depois da pandemia, alguns profissionais quase esqueceram o momento e esqueceram o digital. “Não pode acontecer: o digital tem que acompanhar o presencial. É muito importante”.
Low-cost trazem novos turistas e mais conscientes em termos económicos
Outro fator de sucesso do turismo nacional foi o aumento de voos das companhias aéreas low-cost para Portugal. “As low-cost (companhias aéreas de baixo custo) ajudam-nos a trazer novos turistas, de novos espaços e de novos mercados emissores; ajudam a gerar mais-valias em termos económicos nos destinos”, diz a especialista em Comunicação.
“As pessoas não se importam de pagar menos por uma viagem que normalmente é de poucas horas para ter mais dinheiro para gastar no destino, seja no hotel, restauração, atividades lúdicas, nas compras. É um turista mais consciente em termos económicos. Por exemplo, o Porto e Norte (Região de Turismo) trabalha muito bem essa conectividade aérea”.
Mais do que lugares, os turistas procuram cada vez mais experiências marcantes, “que lhes vão tocar o coração”, refere Vânia Sousa. A autenticidade, a genuidade, a cultura, a gastronomia, os vinhos, as pessoas, a natureza, a história do local, ajudam o turista a viver algo diferente. “Uma primeira experiência pode impactá-lo positivamente e isso é muito importante porque não só pode gerar o desejo de regresso como boas referências para outros turistas”.
É por isso que a autora de Turismo, Competitividade e Destino Portugal – fatores de sucesso e imagem internacional recomenda às entidades que gerem os destinos (seja a nível nacional, regional, cidades ou locais) que mantenham a sua autenticidade. Aos que ainda não a encontraram, diz que devem ver quais são as suas mais-valias locais para atrair os turistas e permitir que eles vivam essas experiências.
“Há um enorme fenómeno de “disneyficação” das cidades, especialmente nos centros das grandes cidades. Vemos isso, por exemplo (aqui) no Porto, onde vivo. Algumas lojas não são típicas do Porto. Mas felizmente ainda temos muitas lojas antigas, das rolhas, de loiças, dos botões que são encantadoras, as mercearias, mesmo no Bolhão, onde se fez uma junção interessante entre o antigo e o novo. E os turistas procuram essa autenticidade, é importante que a preservemos”.
As pessoas estão sedentas de histórias
“Há destinos em Portugal que já estão a trabalhar o seu storytelling, as suas narrativas, porque as histórias vendem e as pessoas estão sedentas de boas histórias sobre os locais que visitam”.
Vânia Sousa frisa que não adianta construir mais e mais hotéis, mais espaços, se não houver conteúdos que atraiam as pessoas. “Os turistas não vêm visitar o país só por causa da praia ou por causa do hotel. Vêm atrás do conteúdo, das experiências, da cultura. É capital desenvolvermos mais o storytelling que gera maior interesse e valor económico. Há estudos que o provam, podemos cobrar mais por produtos com uma boa história associada”.
A especialista refere a experiência feita pelo New York Times: comprou alguns produtos no e-bay, convidou copywriters e escritores para criar uma história em torno de cada um desses produtos. Depois voltou a pô-los à venda na plataforma e as pessoas mostraram-se disponíveis para os comprar a preços 200% ou 300% mais caros.
“Há processos químicos que ocorrem no nosso cérebro através das histórias e nós conseguimos agarrar mais o consumidor através de uma narrativa. É importante que as trabalhemos, é mesmo um fator crítico de sucesso. Temos que ser criativos, ver o que temos em cada cidade, em cada região e que produtos turísticos é que podemos criar para atrair os turistas, mantendo sempre a autenticidade”.
Segurança vale ouro
A segurança é outro fator de sucesso para o turismo português identificado por Vânia Sousa no seu trabalho. A guerra na Ucrânia está suficientmente longe para que Portugal possa beneficiar com o desvio de turistas de outras zonas mais próximas da zona de conflito, como a Eslováquia, a Croácia ou a Estónia.
“Portugal é considerado um dos países mais seguros do mundo e esse é um fator (de sucesso) que temos que comunicar. É uma mais-valia porque o sentimento de segurança que os turistas aqui vivem é grande comparativamente ao da generalidade dos países, mesmo na Europa. Quando as pessoas escolhem um destino querem ter a certeza que têm segurança. É basico, depois é que vem a experiência e o resto”.
Para Vânia Sousa é claro que o turismo português ainda está na fase de crescimento e não há turistas a mais. “É preciso é distribuí-los: temos o Interior, outras cidades mais pequenas adjacentes às centrais e portanto, ainda temos muito potencial de crescimento. Mas é preciso apostar também na maior conectividade aérea, na melhoria da ferrovia e trabalhar bem as natrrativas”.
Sem esquecer os profissionais do turismo, que merecem maior reconhecimento, através de uma política de captação e retenção de talentos. “Provavelmente não temos tanta mão-de-obra porque começa a não ser atrativo trabalhar no turismo e a pandemia ajudou a prová-lo. As pessoas não se sentem reconhecidas e os horários também não ajudam a ter uma vida familiar. Acredito que trabalhando melhor a sazonalidade consigamos ter empregos dignos para todos os trabalhadores durante todo o ano. Isso é algo que recomendo que as políticas públicas trabalhem em conjunto com os empresários e os profissionais do setor. Os trabalhadores representam a marca, conforme forem tratados e respeitados, assim vão passar uma boa ou uma má imagem”.