O ministro das Finanças de Espanha, Luis de Guindos, teve o apoio de Portugal para substituir Vítor Constâncio na vice-presidência do Banco Central Europeu. Apesar de
Guindos ser de um partido e de um governo de direita, enquanto o governo português é de esquerda.
Antes, Guindos havia apoiado a candidatura de Centeno a presidente do Eurogrupo. O bom relacionamento entre Lisboa e Madrid não é recente, acontece há décadas, mesmo quando envolve governos de diferentes famílias políticas. E as reuniões cimeiras luso-espanholas decorrem geralmente num clima de convergência.
Mas nem por isso as relações de Portugal com Espanha estão isentas de problemas. Agora temos a questão de uma mina de urânio a céu aberto, perto de Salamanca e a 40 quilómetros da fronteira com Portugal.
Essa mina, a única da Europa a céu aberto, ameaça contaminar a água do rio Douro e a atmosfera, mesmo em território português. Os autarcas portugueses da zona ameaçada há muito que se preocupam com esta mina. Há cerca de um ano e meio, o presidente da Câmara de Miranda do Douro queixou-se deste problema aos microfones da Renascença.
Os autarcas portugueses têm contactado os seus colegas do outro lado da fronteira, onde existem também fortes oposições à concretização da mina de urânio. Um grupo de deputados portugueses visitou na semana passada as obras da mina.
A nível governamental, porém, não parece ter havido qualquer diálogo útil sobre a mina de urânio a céu aberto. O Governo português não podia ignorá-la, pois a movimentação dos autarcas contra o projeto era pública.
Ou seja, como tem sido notado, a história da central nuclear de Almaraz, junto ao Tejo, repete-se: os espanhóis avançam sem nada comunicarem oficialmente às autoridades portuguesas, que ficam colocadas perante factos consumados, ou quase – em Almaraz, a construção de um depósito de resíduos nucleares.
A passividade do Governo português nestes dois casos é lamentável. Insere-se num tipo de governação que não é pró-ativa e se limita a reagir aos acontecimentos, em vez de os prevenir. Viu-se, dramaticamente, nos trágicos incêndios do ano passado.
No caso da mina de urânio a céu aberto, o Governo português aparentemente contentou-se com uma resposta espanhola, segundo a qual está ainda longe o licenciamento da mina. Não terá ocorrido ao executivo de Lisboa exigir, por exemplo, um estudo de impacte ambiental dos dois lados da fronteira.
Felizmente, Portugal e Espanha pertencem à União Europeia. Se a mina de urânio espanhola violar diretivas comunitárias, como alguns defendem, a Comissão Europeia poderá ajudar os portugueses.
É mais um exemplo de como a integração do nosso país na UE aumenta, e não diminui, a soberania portuguesa real, não a teórica. Sem a UE, num confronto bilateral entre os dois países peninsulares, ficaríamos certamente submetidos ao muito maior poderio espanhol.