Os advogados de defesa dos cinco arguidos do segundo processo-crime relativo à morte do ucraniano Ihor Homeniuk alegaram esta sexta-feira não existir prova para levar os seus constituintes a julgamento e teceram críticas à acusação.
No final do debate instrutório, a juíza de instrução criminal Carina Santos marcou para 22 de setembro próximo a sua decisão sobre quem vai ou não a julgamento.
Nas alegações do debate instrutório, Filipa Pinto, advogada do arguido e ex-diretor de Fronteiras de Lisboa do SEF António Sérgio Henriques, defendeu que não há motivos para a juíza Carina Santos levar a julgamento o arguido, que está acusado do crime de denegação de justiça, um ilícito penal que, disse, exige o preenchimento de requisitos processuais específicos.
Nas suas alegações, Filipa Pinto realçou que o seu cliente "não é acusado de participar direta ou indiretamente na morte de Ihor Homeniuk, ao contrário do que acontece com todos restantes arguidos", vincando, por outro lado, que o que está em causa não é saber se o ex-diretor de Fronteiras cumpriu com zelo e competência as suas funções, porque isso é assunto de natureza "disciplinar e funcional".
A advogada de António Sérgio Henriques contestou ainda a tese da acusação de que o ex-diretor de Fronteiras "falseou o relatório interno feito pelos vigilantes", contrapondo que foi o então responsável do SEF que constatou que o relatório estava incompleto, tendo mencionado que três inspetores do SEF (já acusados noutro processo) interagiram com Ihor Homeniuk no interior da sala onde esteve retido.
Filipa Pinto reconheceu que a morte de Ihor Homeniuk "envergonha o Estado português e o SEF de Lisboa", lamentando que os altos responsáveis do SEF tenham ficado de fora do processo-crime, tendo-se optado por descer na hierarquia e acusar António Sérgio Henriques, quando este só soube "a posteriori" que Ihor tinha sido algemado atrás das costas e assim permanecido durante cerca de oito horas.
Por seu lado, Amândio Madaleno, advogado do segurança Manuel Correia, criticou o facto de o Ministério Público (MP) ter utilizado o seu constituinte como testemunha no primeiro processo para o acusar dois anos depois.
Amândio Madaleno considerou mesmo que o atraso do MP em deduzir acusação contra Manuel Correia ultrapassou os prazos legais, pelo que, ao fim de 18 meses, prescreveu o procedimento criminal contra o seu constituinte. Caso a juíza decida levar o seu cliente a julgamento, o advogado adiantou à Lusa que irá recorrer para os tribunais superiores.
MP defendeu a ida a julgamento de os todos arguidos
Depois de Manuel Correia ter negado na instrução ter atado os pés ou mãos de Ihor Hoeniuuk com fita adesiva, uma versão que contraria a acusação, o seu advogado alegou que os seguranças/vigilantes foram os únicos que tentaram ajudar o passageiro ucraniano, ao libertarem-no das ligaduras que o amarravam a um colchão na sala dos médicos no Centro de Instalação Temporária do SEF no aeroporto de Lisboa.
O advogado da arguida e inspetora do SEF Maria Cecília Vieira (já reformada) considerou que a acusação contra a sua cliente por omissão de auxílio é "muito frágil", observando que não se pode exigir que os inferiores hierárquicos zelem pelo comportamento dos superiores hierárquicos.
Também o advogado do segurança/vigilante Paulo Marcelo pediu a não pronúncia deste arguido, contestando a acusação, o mesmo sucedendo com a advogada do arguido e inspetor João Agostinho que sustentou que não resulta dos factos que tenha sido este arguido a dar instruções para algemar o cidadão ucraniano.
Antes, o MP defendeu a ida a julgamento de todos os arguidos deste segundo processo sobre a morte de Ihor Homeniuk, após considerar que "as diligências de instrução reforçam a tese da acusação".
O advogado José Gaspar Schwalbach, que representa a família de Ihor Homeniuk, considerou que, cumprida a fase de instrução, "toda a prova vem consolidar ainda mais o que foi apurado em sede de inquérito".
António Sérgio Henriques - afastado do cargo pelo Ministério da Administração Interna em março de 2020, após a morte de Ihor Homeniuk - responde por denegação de justiça e prevaricação. Os inspetores João Agostinho e Maria Cecília Vieira são acusados de homicídio negligente por omissão de auxílio, enquanto aos vigilantes Manuel Correia e Paulo Marcelo são imputados os crimes de sequestro e exercício ilícito de atividade de segurança privada.
O primeiro processo sobre a morte de Ihor Homeniuk resultou na condenação a nove anos de prisão dos inspetores do SEF Duarte Laja, Luís Silva e Bruno Sousa por ofensa à integridade física grave qualificada, agravada por ter resultado na morte da vítima. .
Segundo a acusação do MP no primeiro processo, Ihor Homeniuk morreu por asfixia lenta, após agressões a pontapé e com bastão perpetradas pelos inspetores Luís Silva, Duarte Laja e Bruno Sousa, que causaram ao cidadão ucraniano a fratura de oito costelas.
Além disso, tê-lo-ão deixado algemado com as mãos atrás das costas e de barriga para baixo, com dificuldade em respirar durante largo tempo, o que terá causado paragem cardiorrespiratória.