A tauromaquia é sempre um tema que anima as reuniões do grupo parlamentar socialista e esta quinta-feira não foi exceção e mostrou, mais uma vez um PS profundamente dividido sobre esta matéria.
Em causa estão os projetos de lei do Bloco de Esquerda, PAN, PEV, da deputada não inscrita Cristina Rodrigues e de um grupo de cidadãos que esta sexta-feira vão ser votados e que prevêem o fim dos apoios públicos a qualquer actividade que diga respeito às touradas.
Na habitual reunião dos deputados do PS a questão partiu a bancada em três, porque é esse o número de tendências sobre esta matéria: os que por princípio são frontalmente contra a tauromaquia, os que são a favor desta actividade (e muitos deles eleitos por círculos eleitorais onde esta prática está enraízada) e uma tendência mais moderada e não proibicionista.
Nesta tendência mais moderada está, por exemplo, a própria líder parlamentar, Ana Catarina Mendes, que segundo relatos de quem esteve na reunião, defende que não está no coração do PS assinar projetos de lei "proibicionistas" ou que proíbam o gosto dos portugueses.
Ana Catarina Mendes terá mesmo defendido que esta trata-se de uma questão mais cultural e de tradição do que de consciência, não estando em causa direitos humanos, não se justificando por isso que o partido crie fricções por causa desta matéria.
Não havendo posição oficial do PS sobre tauromaquia, a direção da bancada deu indicação de voto contra para todos os projetos em causa e dá liberdade de voto aos deputados - como é, aliás, hábito - apenas sendo pedido que cada um dos deputados informe sobre o sentido de voto, para criar uma aritmética interna e evitar eventuais embaraços na altura da votação.
Esta tendência mais moderada é ainda apoiada pelo ex-secretário de estado da Defesa Marcos Perestrello ou ainda Ascenso Simões, eleito pelo círculo eleitoral de Vila Real e que, segundo disseram fontes parlamentares à Renascença, terá salientado essa ideia de que o PS não tem na sua tradição proibir, optando pela liberdade de cada um.
Na mesma linha está o deputado Sérgio Sousa Pinto, que também na reunião dos deputados salientou que o que está em causa é a "liberdade" de cada um, reforçando que esse é um valor caro ao PS.
Foi ainda referido que aqueles projetos de lei, de facto, não ilegalizam a tauromaquia, mas colocam em causa a autonomia do poder local. Ou seja, tirando os apoios públicos a esta atividade serão as câmaras municipais a serem prejudicadas, tendo sido mesmo discutida a eventual inconstitucionalidade das iniciativas em causa por essa mesma razão.
Foi, de resto, lembrado pelo deputado Hugo Pires, que é também Secretário Nacional para a Organização do PS, que o partido está a um ano das eleições autárquicas e que estes projetos constituem "uma ratoeira política" e um isco para os socialistas morderem, prejudicando, no caso de serem aprovados, dezenas de autarcas do partido pelo país fora.
Uma segunda tendência revelada na reunião dos deputados do PS é a dos que são verdadeiramente aficionados da tauromaquia e contra o fim desta prática em Portugal dê por onde der.
São sobretudo parlamentares eleitos por círculos onde as touradas são muito populares, casos da ex-presidente da câmara de Vila Franca de Xira, Maria da Luz Rosinha, Luís Testa, de Portalegre, ou Lara Martinho, eleita pelos Açores.
Esta deputada salientou na reunião o prejuízo económico que os projetos em causa podem representar para as ilhas - nomeadamente na ilha Terceira, onde é popular a tourada à corda - se forem aprovados, referindo que, neste momento, o próprio governo regional açoriano estará a apoiar atividades ligadas à tauromaquia, ajudando a alimentar animais.
Numa reunião descrita à Renascença como tendo sido "viva, animada e num tom de argumento com nível", surgiram os designados "radicais", que defendem o fim das touradas e que vão, de certeza, votar a favor dos projetos.
É o caso, por exemplo, do deputado Porfírio Silva, que terá mesmo criticado recentes intervenções dos que defendem a tauromaquia, nomeadamente a da deputada Maria da Luz Rosinha em plenário, argumentando que esta dividiu a bancada quebrando uma tradição de consenso no grupo parlamentar.
Também contra as touradas e a favor do fim desta atividade estiveram o constitucionalista Bacelar de Vasconcelos, a vice-presidente da Assembleia da República Edite Estrela e ainda o vice-presidente da bancada do PS, Pedro Delgado Alves.
Fontes parlamentares dizem à Renascença que um dos principais problemas é que o PS não tem até hoje uma posição oficial sobre a tauromaquia e que o congresso previsto agora para o próximo ano devia definir uma linha orientadora.